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Aproveitamento do lixo na geração de energia ajuda a reduzir impactos ambientais

Com potência similar à das plantas eólicas atuais, solução ajuda a diversificar matriz energética do país. Conheça os processos capazes de transformar o resíduo urbano

Publicado em: 03/11/2015Atualizado em: 28/03/2023

Texto: Redação AECweb/e-Construmarket

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A utilização do lixo para geração de energia é algo que vem ganhado força no Brasil e no mundo. A solução apresenta uma série de vantagens, passando pela diversificação da matriz energética do país, cada vez mais necessária, e pela diminuição dos impactos causados pela decomposição do lixo, como a emissão de gases nos aterros sanitários.

Também conhecida como recuperação energética dos resíduos, a solução de geração de energia a partir do lixo pode ser empregada por meio de processos termoquímicos, como a combustão, a gaseificação ou a pirólise. Outra opção são os processos biológicos, pela biodigestão anaeróbia da fração orgânica dos resíduos.

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De acordo com o professor doutor Gilberto Martins, coordenador do programa de pós-graduação em energia da Universidade Federal do ABC (UFABC), um processo de combustão bastante desenvolvido em vários países, conhecido como Waste to Energy (resíduos para energia), utiliza o lixo como ele vem, ou seja, misturado (mass burning). "É comum se ter grandes plantas de geração de energia, que processam entre 150 a 1000 toneladas por dia de lixo”, relata.

Na gaseificação e pirólise, o resíduo é transformado em combustíveis gasosos e líquidos (líquidos apenas no caso da pirólise), o que ocorre em um reator pela ação do calor
Gilberto Martins

Há também plantas de geração de energia a partir do lixo que utilizam Combustível Derivado de Resíduo (CDR), em que se faz a separação das frações passíveis de reciclagem e retirada dos inertes, produzindo um combustível de maior poder calorífico. A planta é uma central termoelétrica que utiliza o resíduo como combustível, assim como as usinas de açúcar e álcool utilizam o bagaço da cana de açúcar. O lixo é queimado em uma caldeira, que produz vapor a alta pressão e temperatura, e expandido depois em uma turbina a vapor, que, por sua vez, aciona um gerador elétrico.

“Na gaseificação e pirólise, o resíduo é transformado em combustíveis gasosos e líquidos (líquidos apenas no caso da pirólise), o que ocorre em um reator pela ação do calor. Estes combustíveis são então utilizados em caldeiras, motores de combustão interna ou turbinas a gás para acionar os geradores elétricos”, explica Martins.

Já o processo de biodigestão anaeróbia pode ser feito em reatores (biodigestores) especificamente projetados e construídos, nos quais o processo ocorre em condições otimizadas. Necessitam, assim, de todo um sistema para segregação dos resíduos orgânicos utilizados como matéria-prima. Este processo, entretanto, ocorre naturalmente em um aterro sanitário que recebe resíduos orgânicos.

A UTILIZAÇÃO DO BIOGÁS

Esses aterros sanitários geram biogás – mistura de metano e gás carbônico, principalmente –, que deve ser retirado da massa de resíduos aterrada, e queimado. "É possível aproveitar este gás para acionar motores de combustão interna e geradores elétricos, embora também seja necessário implantar todo um sistema de captação e purificação do biogás, antes de encaminhá-lo para os motores”, destaca Martins.

UM PROCESSO PARA CADA TIPO DE LIXO

Quando não há separação na origem entre os resíduos úmidos ou orgânicos, dos resíduos secos e materiais recicláveis, a tecnologia mais utilizada é a de queima. Quando os resíduos secos são separados dos orgânicos, é mais indicado biodigerir os orgânicos e tratar os secos por processos termoquímicos.

CUSTOS

Os processos termoquímicos são, em geral, mais caros se comparados a similares que utilizam combustíveis mais homogêneos. Isto porque, ao utilizar o lixo, há necessidade de se trabalhar com pressões e temperaturas mais baixas, o que reduz a eficiência, além de se ter um sistema mais complexo e caro para a limpeza dos gases. Os biodigestores também são caros e, normalmente, apresentam maiores problemas operacionais comparados com os que utilizam substratos mais homogêneos, como dejetos de suínos, esgoto doméstico ou outros efluentes de indústrias alimentícias.

A produção de energia a partir do lixo é importante do ponto de vista de aproveitamento dos recursos, além de ser uma forma de diversificar a nossa matriz energética, incluindo essa fonte considerada renovável, ou pelo menos parte dela, a orgânica
Gilberto Martins

POTENCIAL ENERGÉTICO

A capacidade de geração de energia por meio do lixo vai depender da tecnologia empregada. Na digestão anaeróbia, é possível obter entre 50 e 150 kWh por tonelada de lixo, dependendo da fração orgânica nela contida. Já em processos termoquímicos, os valores variam entre 450 a 700 kWh por tonelada de lixo.

Considerando a geração de cerca de 210 mil toneladas por dia de resíduos sólidos urbanos, significa uma potência média da ordem de 4 a 5 GW de eletricidade – mais ou menos a potência eólica instalada hoje no Brasil. Como se observa, o potencial não é muito grande, sobretudo se for levado em conta que é preciso tentar reduzir a geração de lixo, portanto, o seu potencial de geração de energia. "Ainda assim, a produção de energia a partir do lixo é importante do ponto de vista de aproveitamento dos recursos, além de ser uma forma de diversificar a nossa matriz energética, incluindo essa fonte considerada renovável, ou pelo menos parte dela, a orgânica”, ressalta Martins.

OBSTÁCULOS

Os principais obstáculos que impedem a geração de energia por meio do lixo são, segundo o engenheiro, a falta de recursos para investimento e de incentivos que permitam reduzir o custo da energia gerada a partir dos resíduos. “Paralelamente, é preciso que o país tenha um abrangente sistema de gestão dos resíduos sólidos urbanos, prevendo desde campanhas educativas de redução do consumo e conscientização sobre a separação na origem, até sistemas de reciclagem e sua reincorporação no mercado, passando por sistema de recuperação energética adequada aos resíduos gerados, além de correta destinação final para os rejeitos”, sugere Martins.

Colaborou para esta matéria

Gilberto Martins – Engenheiro mecânico formado pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) em 1985, com mestrado e doutorado pela mesma Universidade, nas áreas de uso racional da energia de biomassa e refrigeração por absorção, em 1989 e 1996, respectivamente. Especialista em economia da energia pela Scuola Superiore Enrico Mattei (Milão, 1990). Foi professor da Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep) de 1987 a 2006 e dirigiu a Faculdade de Engenharia, Arquitetura e Urbanismo da mesma Universidade entre 2003 e 2006. Ingressou na Universidade Federal do ABC (UFABC) em agosto de 2006 como professor adjunto. É coordenador do programa de pós-graduação em energia nesta instituição. Recebeu Menção Honrosa no XVIII Concurso Nacional do Invento Brasileiro de 1990 patrocinado pela Secretaria da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo.