Caminhões, tratores e conhecimento na bagagem
O superintendente de aquisição de equipamentos da Odebrecht revela que as necessidades da empresa são supridas por equipamentos alugados ou subempreitados
Engenheiro por profissão, homem de equipamento por devoção. Este é Paulo Oscar Auler Neto, um dos executivos mais tradicionais do ramo de equipamentos e que está entre os grandes incentivadores da atividade de locação. Atualmente é superintendente de aquisição de equipamentos da Odebrecht, onde desde 1998 está na estrutura corporativa responsável pela gestão dos equipamentos em âmbito mundial. Para ele, o mercado de locação se alterna e evolui nos moldes internacionais nos últimos anos.
Hoje já é possível no Brasil executar uma obra fazendo uso exclusivamente de equipamentos alugados a preços competitivos. Confira nesta entrevista algumas tendências e perspectivas na visão globalizada de Paulo Oscar, além de fatos curiosos de sua experiência profissional, como trabalhar na construção da Hidroelétrica de Pichi Picun Leufu, na Patagônia, região desértica com temperatura abaixo dos 20ºC negativos, onde até os equipamentos necessitavam de atenção para evitar o congelamento dos fluidos, e na Malásia, na construção da Hidroelétrica de Bakun, na inóspita ilha do Borneo, onde inicialmente o acesso à obra era por meio de helicópteros.
Portal – Há quanto tempo você atua no setor de equipamentos e quais funções que já exerceu?
Paulo Oscar – Atuo neste setor desde 1979, ou seja, já se vão 32 anos. Comecei minha carreira como estagiário na Construtora Mendes Junior, onde trabalhei por cerca de nove anos, passando por várias obras no Brasil, na sua maioria projetos hidroelétricos. Na sequência fui contratado pela Odebrecht, onde já trabalho há 23 anos atuando em várias obras, sendo que estive por 10 anos no exterior, passando pela Argentina, Chile e Malásia.
Portal – Paulo, quais as situações mais difíceis e operacionalmente inusitadas você já enfrentou com sua equipe, sejam em obras no Brasil ou no exterior?
PO – Já trabalhei em situações extremas, como na construção da Hidroelétrica de Pichi Picun Leufu, localizada na região Patagônica, no sul da Argentina, região desértica onde chegamos a atingir temperaturas abaixo dos -20°C e ventos superiores a 80 Km/h. O ritmo de trabalho da obra era de 24 horas e tivemos que montar toda uma estrutura para possibilitar os serviços de concretagem nestas condições extremas, como por exemplo utilizar água aquecida a 60°C na mistura do concreto e fazer a limpeza dos blocos com jatos de vapor para evitar o congelamento. Após a concretagem toda a região era coberta por um sistema de capas térmicas onde era criado um micro-clima adequado para a correta cura do concreto. As questões de segurança eram críticas para todos os operários em função da neve e do gelo. Os equipamentos também necessitavam de uma atenção especial para evitar o congelamento dos fluidos. Na Malásia, onde atuei na construção da Hidroelétrica de Bakun, na ilha do Borneo, a situação era o oposto. Trabalhávamos numa zona de selva tropical, com altas temperaturas e chuvas torrenciais. A área era totalmente inóspita onde inicialmente o acesso à obra era somente por meio de helicópteros. O relacionamento com os nossos operários era complicado em função das grandes diferenças culturais, idioma e falta de experiência neste tipo de obra. Todo o processo de logística para atendimento ao projeto era complexo e demorado.
Portal – Qual foi o aprendizado extraído dessas experiências?
PO – Apesar das particularidades de cada um dos projetos, sempre é possível alcançarmos o êxito, bastando dispor de equipe qualificada e comprometida, além da correta seleção dos recursos necessários, como equipamentos e serviços. O trabalho no ambiente das obras é muito dinâmico e passamos por várias situações onde é requerido discernimento e atitude. Acredito que a maior falha de qualquer profissional neste ramo é a demora na tomada de decisão. No dia a dia das obras necessitamos utilizar da experiência adquirida para fazermos uma rápida avaliação de todo o contexto e adotar medidas rápidas e precisas.
Portal – Você acha que o perfil tecnológico das obras, hoje, exige mudança de perfil das empresas de locação? Devido à atual realidade, como deve se estruturar um locador no que se refere a produtos (equipamentos e serviços)?
PO – O perfil das obras mudou muito nos últimos anos, motivado principalmente pelos avanços tecnológicos dos métodos executivos e dos equipamentos. Obras que no passado levavam até 10 anos para serem executadas, hoje são concluídas na metade deste tempo. A forma de aporte de equipamentos também mudou bastante. No passado as construtoras operavam quase que exclusivamente com frota própria, e hoje temos a presença massiva de equipamentos terceirizados procedentes de locadores de diversos portes. As locadoras devem se preparar para esta demanda e oferecer uma gama de equipamentos o mais ampla possível com possibilidade de atendimento em todo território nacional.
Portal – As questões ambientais estão entre os principais impasses nos atrasos para a liberação de contratos, embora os projetos contemplem uma série de cuidados e compensações ambientais, procurando um grau de impacto cada vez menor. As obras do Rodoanel, das quais a Odebrecht também participou, foi um dos exemplos disso. Mas, os órgãos ambientais entendem esses avanços? Na sua experiência, essas instituições deveriam ser mais coerentes?
PO – Nos dias atuais as questões ambientais e de sustentabilidade estão cada vez mais presentes no nosso cotidiano e o ramo da construção é um dos mais críticos, pois praticamente todos os projetos envolvem algum tipo de impacto ambiental que deve ser devidamente tratado. Acredito que tanto as empresas como os órgãos públicos estão mais conscientes e praticando a cidadania de forma responsável, porém alguns excessos ainda são observados, o que acredito que ao longo do tempo serão devidamente realinhados. Esta fase de transição para um tipo de gestão mais “verde” certamente ainda sofrerá ajustes tanto no âmbito legal como no operacional.
Portal – A Odebrecht normalmente contrata empresas locadoras para trabalhar nos projetos. Vocês têm alguma obra no estado de São Paulo prestes a acontecer, para o qual precisará das locadoras?
PO – A Odebrecht tem como uma das suas características a utilização de grande parte dos equipamentos necessários para os seus projetos proveniente do mercado da locação ou terceirização dos serviços. Aproximadamente, de 65% a 70% das nossas necessidades são supridas por este mercado, portanto somos um grande incentivador do crescimento da atividade dos locadores. Existem vários projetos dos quais estamos participando do processo de licitação onde caso sejamos vencedores iremos necessitar dos nossos parceiros locadores, como por exemplo a extensão das linhas do metrô e o trem de alta velocidade. Outras obras já em curso no segmento habitacional e portuário também necessitarão de mais recursos a curto e médio prazo.
Portal – Enquanto contratante, o que sugerir para as empresas de locação estarem bem adaptadas e gerencialmente bem estruturadas de modo a manterem a disponibilidade dos equipamentos em diferentes regiões?
PO – O que o cliente sempre busca é o bom atendimento. Quando a opção de se utilizar uma frota de locação é tomada se espera equipamentos novos, bem mantidos e que possam garantir a máxima performance durante as obras. O locador deve estar atento em substituir equipamentos problemáticos e os contratantes devem ser atendidos rapidamente em caso de necessidade de peças ou serviços. Neste sentido os locadores devem estar bem relacionados com os fabricantes de equipamentos e ter uma equipe própria que lhes possibilite uma rápida mobilização. Em resumo, o que o cliente deseja é terceirizar os seus problemas e delegar ao locador todas as atividades operacionais, e com isto garantir o cumprimento das metas de produção. Os locadores que se habilitam a oferecer seus serviços em todo o território nacional devem estar preparados para esta exigência.
Portal – Hoje, qual o perfil dos equipamentos indispensáveis para uma frota de locação?
PO – Desejamos ter o mínimo possível de empresas locadoras em cada projeto, portanto a empresa que possa suprir maior gama de equipamentos certamente terá a preferência, passando pelos equipamentos de produção e apoio, incluindo caminhões, equipamentos para concreto e desmonte de rocha. Estamos trabalhando com escavadeiras de produção entre 45 e 70 ton, e caminhões basculantes 8x4 de 22m³.
Portal – Como fazer o cálculo médio de depreciação dos equipamentos? O que orientar aos locadores sobre esse aspecto?
PO – Esta é uma questão muito ligada à estratégia de cada empresa e da forma como está planejado o retorno sobre o investimento. Nos livros especializados podem ser observadas várias formas de depreciar o equipamento, passando pela forma linear, exponencial, contábil, soma dos dígitos, etc. A orientação que posso passar é que ao se adotar qualquer um dos sistemas de depreciação o empresário deve estar atendo à vida útil em termos de horas trabalhadas e período de utilização de forma a estar compatível com o valor residual de venda considerado em cada mercado. O segredo é buscar valores residuais mais próximos da realidade. Adotar valores residuais acima do mercado torna a operação negativa e valores muito conservadores elevam os custos e consequentemente perde-se competitividade.