Certificação WELL traz saúde e bem-estar a ocupantes de edificações
Criada em 2014 e recém-chegada ao Brasil, ferramenta estabelece requisitos de desempenho em sete categorias, entre elas ar, água e iluminação
Texto: Redação AECweb/e-Construmarket
O escritório da empresa Setri é o primeiro case em fase de certificação Well (foto/divulgação Setri)
Resultado de sete anos de pesquisas desenvolvidas por profissionais da medicina, ciências e construção civil, a certificação WELL Building Standard é a primeira no mundo a se concentrar exclusivamente na saúde e bem-estar dos ocupantes das edificações. “Considerando que as pessoas passam cerca de 90% do seu tempo em ambientes construídos, é fundamental avaliar o impacto desses locais em seus usuários”, destaca a arquiteta Maíra Macedo, coordenadora de Relações Institucionais e Governamentais no Green Building Council Brasil (GBC Brasil).
Lançada em 2014 pelo International WELL Building Institute (IWBI) e administrada em parceria com o órgão certificador Green Building Certification Institute (GBCI), a certificação WELL estabelece requisitos de desempenho em sete categorias: ar, água, alimentação, iluminação, fitness, conforto e mente.
O primeiro case, em fase de certificação, é do escritório da empresa Setri, em São Paulo, que conta com a consultoria da StraubJunqueira. Para Macedo, o case será referência no país. A obtenção da certificação começa com a equipe responsável registrando o empreendimento na plataforma digital WELL Online e enviando toda a documentação necessária. Para tanto, a edificação precisa estar com, pelo menos, 50% de sua ocupação durante período mínimo de um mês.
Espaços certificados podem ajudar a criar um ambiente construído que melhore a alimentação, a condição física, o humor, os padrões de sono e o desempenho de seus ocupantesMaíra Macedo
Depois que a documentação é aprovada, tem início a etapa de verificação de desempenho, quando diversas medições são feitas no empreendimento. “Espaços certificados podem ajudar a criar um ambiente construído que melhore a alimentação, a condição física, o humor, os padrões de sono e o desempenho de seus ocupantes”, fala Macedo. É o caso, por exemplo, da categoria ar, que avalia aspectos como a existência de micróbios e mofos que podem surgir nas serpentinas dos sistemas de HVAC e desencadear dores de cabeça, alergias ou outras doenças do sistema respiratório.
Para satisfazer os requisitos da categoria alimentação, as refeições e bebidas vendidas ou distribuídas no local devem cumprir determinadas condições de rotulagem, contendo informações nutricionais. “O objetivo é desestimular o consumo de alimentos com ingredientes processados, que contêm índices elevados de açúcar, calorias e gorduras”, completa.
SISTEMAS E SOLUÇÕES
A certificação WELL abrange 102 características do empreendimento, divididas em pré-condições e otimizações, sendo que cada uma delas é desmembrada em partes a serem atendidas através de projeto, medições ou protocolo (relatórios, cartas, documentações).
“São inúmeras as soluções e sistemas possíveis que podem contribuir para obtenção da certificação”, informa a arquiteta. Voltando ao exemplo da categoria ar, o controle de mofos e micróbios pode ser feito com o uso de lâmpada ultravioleta sobre as serpentinas de resfriamento e drenagem nos sistemas mecânicos.
A certificação tem, ainda, exigências mais simples, como a adoção de política de viagens de negócios, com preferência para voos que não ocorram na madrugada, ou, se for indispensável, que o funcionário possa trabalhar remotamente no dia da chegada.
A certificação WELL também leva em consideração a correta especificação de mobiliário ativo, o desenvolvimento de espaços para atividades físicas (tanto externos como internos), a instalação de equipamentos de ginástica, o planejamento acústico e a incorporação da natureza no ambiente. “A certificação foi concebida para complementar outros selos de green building, incluindo o Leadership in Energy and Environmental Design (LEED), com uma nova abordagem para melhor atender à saúde humana e à sustentabilidade ambiental dentro dos edifícios”, destaca Macedo.
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LEED E WELL JUNTOS
O GBCI e o IWBI estudam como o LEED e o WELL podem trabalhar em conjunto, tornando mais fácil para os projetos obterem as duas certificações. São três as categorias do selo WELL: Silver, Gold e Platinum, porém não há o Certified como no LEED, e a avaliação é feita através de percentual e não por pontuação. “Para conquistar qualquer uma das categorias, é necessário o atendimento de todas as pré-condições estabelecidas e uma percentagem das otimizações”, explica a arquiteta.
A primeira versão da certificação abrange as tipologias de edifícios (novos ou já existentes) de escritórios comerciais e institucionais, bem como projetos de interiores até a categoria Core & Shell, que contempla a envoltória do empreendimento, incluindo janelas e vidros na fachada, sistema de aquecimento, refrigeração e ventilação, entre outros.
Visando a melhoria contínua e o avanço da certificação, foram desenvolvidos pelo IWBI programas pilotos para o setor de varejo, residências, educação, restaurantes, cozinhas comerciais, instalações de saúde, instalações esportivas e setor público. Após receber o WELL, a edificação precisa passar, a cada três anos, por novo processo de certificação com o objetivo de verificar se continua cumprindo o desempenho aferido inicialmente. Nesse período, devem ser apresentados dados anuais, de acordo com a necessidade específica de cada categoria.
“Na recertificação, o nível eventualmente sofrerá variação, devido à implantação de melhorias relacionadas às categorias avaliadas, ou mesmo à falta de manutenção adequada que poderá interferir nos resultados de desempenho. A qualquer momento, a equipe de projeto pode enviar documentação evidenciando o atingimento de outras categorias para melhorar o nível da certificação”, ressalta a arquiteta Maíra Macedo.
Um dos grandes diferenciais do case da Setri é que a empresa se antecipou e encaminhou para os laboratórios credenciados do selo a avaliação da qualidade da água e do ar, o que normalmente seria feito pelo agente comissionadorMaíra Macedo
DESAFIOS NACIONAIS
Uma das principais barreiras para a viabilização da certificação WELL no Brasil são os altos custos das taxas de registro, certificação e comissionamento pagas ao IWBI. Até junho de 2016, as tarifas estarão com valores reduzidos para incentivar que novos projetos busquem o selo. Essas taxas são proporcionalmente mais atrativas de acordo com a metragem construída, ou seja, quanto maior o projeto, mais barato fica por metro quadrado.
Além da questão financeira, ainda existem particularidades na certificação que não são habituais à realidade nacional, tais como a necessidade de monitorar os níveis de ozônio no ar externo e oferecer produtos de alimentação de origem animal que apresentem certificação classificada como Human Certified. “Existem somente dois fornecedores deste tipo no Brasil e para produtos diferentes”, informa o engenheiro Eduardo Straub, da consultoria StraubJunqueira, destacando que nenhuma dessas barreiras é um real impeditivo para a viabilização da certificação WELL no país.
Como qualquer nova certificação, o WELL ainda está em fase da maturação, porém deve evoluir rapidamente para minimizar as dificuldades e abranger melhor as diversidades de cada projeto e região.
Saiba mais sobre o case Setri:O escritório da Setri tem 50 m² de área total construída e está localizado em um edifício entregue no início da década passada. Por isso, a tipologia para a certificação foi de interiores existentes. “O projeto tem algumas particularidades e, para atendimento da certificação, foi necessário realizar uma série de adaptações, mas sem envolver reformas e obras”, afirma o engenheiro Eduardo Straub.
A empresa tem três ocupantes, todos sócios, e sua área de atuação está voltada para serviços ligados à saúde e qualidade de vida das pessoas dentro das edificações, o que facilitou a implantação de vários procedimentos e políticas exigidos pela certificação WELL.
O nível da certificação pretendida pelo projeto é o Ouro, o que exigiu mudanças físicas e comportamentais, com a alteração de velhos hábitos. Entre as soluções empregadas está a instalação de filtros mais eficientes no sistema de ar-condicionado, associado a equipamentos que monitoram a umidade relativa do ar e acionam dispositivos que garantem a correção para níveis adequados de conforto, ora umidificando, ora fazendo a desumidificação.
Outra solução foi a substituição de todas as lâmpadas para oferecer uma coloração mais confortável para o desenvolvimento das tarefas dentro do escritório e favorecer o relógio biológico dos ocupantes, sincronizando as funções fisiológicas no ciclo de 24 horas. “Um dos grandes diferenciais do case da Setri é que a empresa se antecipou e encaminhou para os laboratórios credenciados do selo a avaliação da qualidade da água e do ar, o que normalmente seria feito pelo agente comissionador”, fala Straub.
Colaboração técnica
- Eduardo Straub – É LEED AP BD+C, sócio da StraubJunqueira - Consultoria em Construção Sustentável. Engenheiro Civil, formado pela Escola de Engenharia Mauá, pós-graduado em Gestão Ambiental pelo SENAC, curso de especialização em Construções Sustentáveis pelo GBC Brasil; máster em Gestão de Sustentabilidade pela FGV, LEED AP BD+C; membro e participante dos comitês do Conselho Brasileiro de Construção Sustentável (CBCS); participante dos comitês do referencial técnico para residências - GBC Casa.
- Maíra Macedo – Arquiteta e Urbanista LEED GA, Coordenadora de Relações Institucionais e Governamentais no Green Building Council Brasil, Mestre em Arquitetura Sustentável pela Universidad Politècnica de Catalunya e MBA em Gestão em Negócios Imobiliários pela ESPM.