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Controle de inundações passa pelo planejamento de uso do solo urbano

Para serem eficientes, obras de infraestrutura e intervenções de monitoramento e fiscalização devem ser norteadas por um Plano Diretor de Drenagem Urbana

Publicado em: 07/04/2017

Texto: Redação AECweb/e-Construmarket

Problema recorrente em metrópoles brasileiras, as inundações de rios e córregos causam danos ao patrimônio e colocam vidas em risco. A solução em meios urbanos consolidados e já impermeabilizados não é simples e envolve intervenções localizadas – com obras de infraestrutura de pequeno, médio e grande porte – coordenadas por macrodiretrizes ligadas ao Plano Diretor do município.

De acordo com a arquiteta Daniela Rizzi, pesquisadora na área de infraestrutura verde, minimizar os riscos de inundação depende de um planejamento criterioso do uso do solo, que priorize a gestão sustentável da água. Para ela, o Plano Diretor de Drenagem Urbana é o instrumento mais eficaz para regular a relação entre uso e ocupação do solo urbano com a drenagem. Integrado ao Plano Diretor, ele deve prever a distribuição da água no tempo e espaço de forma compatível com o desenvolvimento dos demais elementos que compõem a infraestrutura urbana.

O documento orienta o Poder Público com diretrizes para medidas estruturais — como diques, canalizações e piscinões — e não estruturais — como o zoneamento de áreas de inundação, a restrição do uso e ocupação do solo e a implantação de sistemas de alerta. Versões mais recentes de planos municipais de drenagem urbana no Brasil também incorporam soluções compensatórias, como a previsão de pavimento poroso, valas e trincheiras de infiltração e cisternas.

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Chuva em janeiro de 2017 deixa ruas alagadas no centro da cidade do Rio de Janeiro (Tomaz Silva/ Agência Brasil)

A arquiteta acredita, porém, que redução dos riscos de inundações também depende de uma mudança na abordagem desses documentos. “Nos manuais, deve-se ler menos sobre canalizar e mais sobre reter, armazenar, retardar, infiltrar, tratar, revitalizar, renaturalizar”, explica. “[É necessário substituir] uma visão dos cursos d’água como meros condutos por uma visão desses elementos como corredores verdes multifuncionais, que servem ao lazer, à contemplação, além de prestarem serviços ecossistêmicos de atenuação de temperaturas exacerbadas, melhoria da qualidade do ar, conectividade da fauna e da flora”, afirma.

Locais sujeitos a inundações e deslizamentos são classificados como áreas de risco pelo Poder Público municipal. Caso esses terrenos ainda não estejam ocupados, a prefeitura deve fiscalizar e monitorar o local com base no Plano Diretor, na legislação local e em mapas geotécnicos.

Nos manuais, deve-se ler menos sobre canalizar e mais sobre reter, armazenar, retardar, infiltrar, tratar, revitalizar, renaturalizar
Daniela Rizzi

Porém, se os terrenos estiverem ocupados, o poder público deve intervir com medidas estruturais que resolvam total ou parcialmente a situação. “Essas ações passam por obras de contenção, drenagem, urbanização e, às vezes, a retirada de famílias com a construção de habitações em outro lugar”, explica o geólogo Eduardo Soares de Macedo, pesquisador da Seção de Investigações, Riscos e Desastres Naturais do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT).

SOLUÇÕES TÉCNICAS

Adotados desde a década de 1990 no Brasil para reduzir inundações, os piscinões são construções de infraestrutura que funcionam da seguinte forma: enchem de água quando chove para reter certa quantidade de água, liberando-a gradualmente às galerias, canais, entre outros. Dessa forma, é uma solução de alívio que evita sobrecarregar o sistema de drenagem.

De acordo com Rizzi, piscinões são construções indesejáveis quando apresentam riscos de acúmulo de lixo, o que pode originar problemas de saúde pública. Outro aspecto questionável é a instalação urbana, pelo fato de o piscinão apresentar funcionalidade temporária em períodos de chuva, tornando-se espaço ocioso na maior parte do tempo.

“Urbanisticamente, isso é inaceitável. Uma infraestrutura com tal tamanho e de tal custo, não deveria ser monofuncional, mas agregar outros benefícios para as populações vizinhas, como o uso como espaço público de encontro e lazer”, considera a arquiteta

Como solução, Pizzi aponta piscinões de caráter multifuncional, que além de servir como reservatórios de detenção, também agregam áreas verdes e de lazer à cidade, valorizando a presença da água na paisagem urbana. “Estes são viáveis e desejáveis, principalmente em bacias hidrográficas urbanas onde a ampliação dos canais e galerias de drenagem existentes são inviáveis”, comenta.

A exposição do solo deve ser evitada principalmente em áreas de alta declividade, onde a criação de áreas verdes reflorestadas permanentes é recomendada
Gerson Salviano de Almeida Filho

Já os pavimentos permeáveis são indicados para regiões de grandes precipitações e acúmulo de água. “São constituídos de um sistema de camadas e drenos que recebe a água e encaminha-a para reservatórios ou sistemas de captação”, explica Rubens Vieira, pesquisador da Seção de Geotecnia do IPT.

Quando o pavimento permeável asfáltico é construído em vias de pouca declividade e de grande incidência de chuva, é necessário especificar a Camada Porosa de Atrito (CPA). Ela é responsável por reduzir o atrito pneu-pavimento, que devido à presença de lâmina d´água na superfície, origina o “efeito spray”, cuja nebulização da água reduz bastante a visibilidade do motorista. “A CPA é uma camada de concreto asfáltico com uma grande quantidade de vazios, que pode ser executada sobre o revestimento do pavimento permeável”, esclarece Vieira.

ASSOREAMENTO

Embora o assoreamento seja um processo natural, ações humanas como o desmatamento e a urbanização podem acelerar esse processo. Portanto, para evitar o carreamento de sedimentos que reduzem a profundidade dos corpos de água, é necessário combater os processos de erosão do solo e de deslizamento de terra. “A ocupação desordenada atua como importante agente desencadeador desses processos, devido à falta de instrumentos técnicos adequados, como Planos Diretores compatíveis com a realidade regional e a ausência de infraestrutura adequada, aliado ainda às características do meio físico, tais como solos arenosos muito suscetíveis à erosão”, aponta Gerson Salviano de Almeida Filho, pesquisador da Seção de Investigações, Riscos e Desastres Naturais do IPT.

Entre as ações preventivas, destacam-se a manutenção da cobertura vegetal do solo, principalmente em encostas, para torna-las estáveis. Também é importante que exista um plano de controle para evitar que o solo fique exposto durante obras de construção civil.

“Novos lançamentos devem ter seus lotes demarcados sem a retirada de vegetação e sem a exposição do solo superficial. A exposição do solo deve ser evitada principalmente em áreas de alta declividade, onde a criação de áreas verdes reflorestadas permanentes é recomendada. Se houver cortes de talude, ele deve ser protegido por pintura a cal. Grandes serviços de terraplanagem devem ser programados preferencialmente para ocorrer durante os meses mais secos”, exemplifica Rizzi.

Outra solução consiste no plantio de vegetação nas margens dos rios, priorizando as espécies nativas. “A vegetação nas margens tem um papel importante para reduzir o transporte de sedimentos para os corpos d’água, mas precisa ser integrada com a prevenção dos processos erosivos e deslizamentos”, observa Almeida.

Colaboração técnica

Daniela Rizzi – Graduada pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP), realizou seu doutorado na Technische Universität München, na Alemanha, pesquisando a revitalização de paisagens fluviais urbanas. Atualmente desenvolve pesquisa na área de infraestrutura verde, com foco em drenagem sustentável e tratamento de poluição difusa bacias hidrográficas urbanas.
Eduardo Soares de Macedo – Pesquisador da Seção de Investigações, Riscos e Desastres Naturais do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), possui graduação em Geologia e em História pela USP, doutorado em Geociências e Meio Ambiente pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp) e especialização em Ciências e Desastres Naturais pelo NIED-Japão. Ex-diretor do Centro de Tecnologias Ambientais e Energéticas. Foi delegado brasileiro na Rede Iberoamaricana de Habitat en Riesgo (CYTED).
Gerson Salviano de Almeida Filho – possui graduação em tecnologia civil pela Unesp e mestrado em engenharia civil pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Tem experiência na área de Geociências, com ênfase em riscos geológicos, atuando principalmente nos seguintes temas: erosão, risco, mapeamento, escorregamento e assoreamento. É pesquisador da Seção de Investigações, Riscos e Desastres Naturais do IPT.
Rubens Vieira – possui graduação em tecnologia civil pelo Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza. Tem experiência na área de engenharia de transportes, com ênfase em infraestrutura, atuando principalmente em pavimentação e revestimento poroso. É pesquisador da Seção de Geotecnia do IPT.