Especialistas reafirmam importância da norma de desempenho e debatem dúvidas
Elogiada por fomentar a formalidade no setor e democratizar a segurança e conforto nas edificações, a NBR 15.575 também apresenta subjetividades que devem ser revisadas
Texto: Redação AECweb/e-Construmarket
Em vigor há quase quatro anos, a norma de desempenho (NBR 15.575/2013) ainda desperta questionamentos no segmento da construção civil. O assunto foi debatido em um dos painéis do 3º ConstruBR – Congresso Brasileiro da Construção, realizado pelo Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (SindusCon-SP) em parceria com a Feicon Batimat, na São Paulo Expo, no dia 06 de abril de 2017.
Os palestrantes falaram sobre os desafios da implantação da norma de desempenho nos empreendimentos imobiliários sob a ótica jurídica, das construtoras, dos arquitetos e dos projetistas. Elogiada, a NBR 15.575 é interpretada pelos especialistas como fomentadora da formalidade no setor.
"Na indústria automobilística, um carro não tinha exigibilidade por airbag na década de 1980. E hoje são obrigatórios dois airbags frontais. Então, a regulamentação é uma coisa que acontece naturalmente com o passar do tempo, e é o que está acontecendo na indústria da construção", compara Sergio Fernando Domingues, membro do Comitê de Tecnologia e Qualidade do SindusCon-SP e diretor técnico da Tarjab Incorporadora.

Mesa redonda de debate sobre a norma de desempenho no ConstruBR (Divulgação/ Feicon Batimat)
No âmbito jurídico, a norma elimina margens para subjetividade na análise de edificações. Era comum, antes da existência do documento, que o laudo pericial criticasse a má qualidade de uma obra por não ter utilizado uma solução usual. "Não havia decisão com base em parâmetros técnicos, mas sim com base no que era usual na opinião do perito", ressalta Ricardo Campelo, conselheiro jurídico do SindusCon-SP.
DESAFIOS PARA A ARQUITETURA
Com a NBR 15.575 em vigor, o ideal seria que os projetos já tivessem, em sua concepção, o desempenho como premissa para a edificação. No entanto, Miriam Addor, presidente da AsBEA e diretora da Addor & Associados, enfatiza que a situação no Brasil é inversa, o que requer reflexão e mudança por parte do setor. “Ainda temos uma situação onde se pensa o produto, passa para a seleção das tecnologias, análise de custos e, por último, se verifica se as normas de desempenho atendem ou não ao projeto”, descreve Addor.
A regulamentação é uma coisa que acontece naturalmente com o passar do tempo, e é o que está acontecendo na indústria da construçãoSergio Fernando Domingues
Outro problema apontado por Addor é a falta de estrutura de escritórios de arquitetura brasileiros em geral. Seja pela baixa quantidade de colaboradores ou por outros motivos, o fato é que muitos deles não dão conta de compreender a norma e aplicá-la na especificação do projeto. "Esse suporte técnico às vezes é difícil e muitos ainda têm resistência ao novo", afirma a presidente.
A falta de estrutura dos escritórios pode, ainda, dificultar o cumprimento de premissas do projeto, que requerem laudos técnicos capazes de respaldar ou não a viabilidade de pré-requisitos solicitados por clientes ou incorporadoras, como uma edificação que gere 75% de energia própria, no mesmo exemplo citado por Addor.
DESAFIOS PARA A ACÚSTICA
Do ponto de vista da acústica, Davi Akkerman, vice-presidente de atividades técnicas da Proacústica e sócio-diretor da Harmonia Acústica, enfatiza que é difícil prever o desempenho dos produtos, uma vez que os cálculos teóricos são passíveis de variações.
“Em acústica, não tem receita de bolo. Se o revestimento, por exemplo, atende a norma em uma parede de bloco de concreto num determinado volume de ambiente, seu desempenho pode não atender em outras estruturas e ambientes com volumes diferentes", aponta Akkerman.
Outra questão se refere à diferença entre um produto ensaiado em laboratório para sua versão fabricada em série. "Quando um sistema é ensaiado, os índices atingidos são bons. No entanto, quando esse sistema vai ser fabricado em série para ser fornecido em diversas unidades, a tipologia de ensaio muda, sem ter o mesmo preciosismo daquele ensaiado em laboratório", alerta o vice-presidente.
Em acústica, não tem receita de boloDavi Akkerman
Akkerman considera que, com a norma de desempenho, a acústica na arquitetura se torna mais democrática — pois, segundo ele, antes do documento ela só era aplicada em projetos de alto padrão. No entanto, o especialista diz que é necessário ajustar subjetividades.
Um dos pontos é a definição do desempenho acústico da fachada, que se dá em função da classe de ruído do local onde o projeto será construído. “A classe de ruído 1 se refere a habitações localizadas distantes de fontes de ruído intenso de quaisquer naturezas, mas não quantifica. Na classe 3, são habitações sujeitas a ruído intenso, e também não quantifica. Quando não é classe 1 e nem classe 3, é classe 2. Isso é uma coisa muito abstrata”, repara Akkerman.
VIDA ÚTIL X GARANTIA
Na abordagem de uso e operação da edificação, a norma de desempenho traz uma tabela com prazos de garantia mínimos para cada sistema construtivo e, também, prazos de vida útil. Correlatos, os dois termos acabam gerando dúvidas para determinar quem é responsável por eventuais patologias — arquiteto, projetista, construtor, entre outros.
"O fornecedor é obrigado a colocar um produto no mercado que não tenha defeito em tempo determinado pela garantia. Uma falha que venha durante a vida útil [que excede a garantia] requer análise quanto a defeito de fabricação ou de mau uso", esclarece Carlos Del Mar, conselheiro Jurídico do SindusCon-SP.
Outra questão delicada da norma refere-se aos longos prazos de vida útil — 13 anos para pisos, 20 anos para sistemas hidrossanitários, 40 anos para fechamentos verticais externos e internos e 50 anos para fundações. Esse tempo, muitas vezes, supera o período de existência de construtoras e incorporadoras, criando uma insegurança jurídica no setor.
"Se surgir um problema na edificação depois de 13 anos, caso a empresa responsável não exista mais, vai acabar sobrando para um responsável técnico responder pelo defeito. Essa é uma questão que o setor precisa adequar", observa Del Mar.
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Colaboração técnica
- Carlos Del Mar – conselheiro Jurídico do SindusCon-SP.
- Davi Akkerman – vice-presidente de atividades técnicas da Proacústica e sócio-diretor da Harmonia Acústica.
- Miriam Addor –presidente da AsBEA e diretora da Addor & Associados.
- Ricardo Campelo – conselheiro jurídico do SindusCon-SP.
- Sergio Fernando Domingues – membro do Comitê de Tecnologia e Qualidade do SindusCon-SP e diretor técnico da Tarjab Incorporadora.