Fórum ConstruBR discute criação de políticas para o mercado da construção civil
Regulamentações e investimentos em sustentabilidade, industrialização, habitação e infraestrutura podem elevar a competitividade e produtividade no setor
Texto: Redação AECweb/e-Construmarket
O fórum fez parte da programação paralela da 22ª edição da FEICON BATIMAT (Créditos: Mário Águas Fotografia)
A segunda edição do ConstruBR, evento realizado pelo SindusCon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo), discutiu a competitividade e produtividade do setor, com foco na criação de políticas de longo prazo para o desenvolvimento do mercado.
O fórum, que fez parte da programação paralela da 22ª edição da FEICON BATIMAT, foi dividido em sete painéis que trataram sobre gestão, habitação, inovação, construção sustentável, industrialização da construção, transparência, entre outros temas.
Na palestra de abertura, foram levantados os desafios para elevar a produtividade da construção, com base em um estudo que o SindusCon-SP elaborou junto à FGV (Fundação Getúlio Vargas). A pesquisa indica que há um gap duplo na produtividade da construção brasileira.
CONSTRUÇÃO SUSTENTÁVEL
Os desafios da sustentabilidade foram o tema central do segundo painel realizado no primeiro dia do ConstruBR 2016. De acordo com os palestrantes, investir na construção sustentável é uma das melhores alternativas que o setor tem para elevar a competitividade na construção.
“Se um material gera um determinado resíduo e não é possível dar uma destinação correta a ele, o construtor vai usar outro material. É uma questão de competitividade”, assimila Francisco Vasconcellos, vice-presidente do SindusCon-SP e diretor da Dox Planejamento e Gestão.
Vasconcellos também considera que a construção sustentável avança como demanda entre clientes e investidores do setor, mas que o “imediatismo dos órgãos legislativos” ameaça as regulamentações. “Este tem sido um grande fator de preocupação por parte do setor, pois muitas vezes as respostas não são baseadas em dados, não têm pragmatismo e acabam indo contra aquilo que elas se propõem a resolver”, critica.
Do ponto de vista acadêmico, Dr. José Goldemberg, presidente da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), contextualizou que o impasse da sustentabilidade está na queima de combustíveis fósseis. “Quanto mais C02 se joga na atmosfera, mais a radiação solar se converte em calor e fica na Terra. Portanto, o planeta está aquecendo e é inútil discutir isso”, pontua.
Segundo ele, o setor da construção é responsável pelo consumo de 40% da energia produzida quando se considera o que é gasto para o uso das edificações. “É importante incorporar na constituição fatores que reduzam o consumo de energia em todo o ciclo de vida da construção”, frisa.
URBANISMO E SUSTENTABILIDADE
Para o ambientalista e empresário Ricardo Young, vereador da cidade de São Paulo (PPS), a urbanização sem planejamento é um dos principais entraves à construção sustentável, pois ela “destrói sistematicamente os serviços ambientais” em uma frequência que os tornam escassos.
“A crise hídrica demonstrou isso. A incapacidade de São Paulo de produzir e armazenar água proporcionou a busca num raio de mais de 200 km da cidade, levando outras cidades a um estresse hídrico, num efeito dominó que podia ser altamente comprometedor”, menciona. Young entende que um dos desafios da construção sustentável está em reproduzir serviços ambientais que as cidades destruíram, além da criação de novos serviços.
Fábio Villa Bôas, diretor da Tecnisa e coordenador do Comasp (Comitê de Meio Ambiente do Estado de São Paulo), apresentou detalhadamente o projeto do bairro planejado Jardim das Perdizes, destacando os benefícios ambientais incorporados em todo seu escopo. Segundo ele, esse tipo de empreendimento, feito com base no novo PDE (Plano Diretor Estratégico) de São Paulo, só pôde ser viabilizado devido à inexistência de infraestrutura urbana no local.
“Certamente fazer um sistema daqueles de coleta de águas pluviais na Rua Augusta ou na Avenida Paulista, com o número de tubos que estão ali, iria gerar um estrago gigantesco”, examina.
Villa Bôas diz que é necessário um maior número de dados para viabilizar projetos de replanejamento urbano. “Tem que haver uma política de incentivo que, à medida que os prédios forem sendo remanejados, sejam feitos bons cadastros dessa infraestrutura que existe na cidade antiga para que se possa verificar a possibilidade de uma solução”, presume.
CONSTRUÇÃO INDUSTRIALIZADA
No terceiro painel do ConstruBR 2016, os palestrantes apresentaram os benefícios que a construção industrializada oferece e as barreiras que entravam seu avanço no país. “É necessário racionalizar os canteiros de obras, e a industrialização é o estágio mais elevado da racionalização”, assegura João Carlos Leonardi, diretor comercial da Leonardi.
Segundo Dr. Ubiraci Espinelli Lemes de Souza, professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP) e sócio-diretor da Produtime e Indicon, a construção industrializada baseia-se na junção de três conceitos da construção civil: pré-fabricação de materiais, mecanização de operações e organização do canteiro. “A falta de um desses itens leva a níveis mais baixos de industrialização”, observa.
De acordo com os palestrantes, o material pré-fabricado oferece mais qualidade à obra, uma vez que é feito em ambiente controlado, fora do canteiro. Por sua vez, a mecanização facilita e agiliza o manuseio das peças, principalmente das mais pesadas. “Não adianta encher a obra de pré-fabricado e colocar uma talha para montar essas peças. A falta de equipamento pode minimizar todo um ganho de potencial que a pré-fabricação traz”, explana Souza. “E a organização do trabalho é requisito básico para as duas equações”, completa o professor.
O arquiteto Roberto Candusso, do escritório Candusso Arquitetos, diz que é necessário maior investimento em pesquisa para o avanço da construção industrializada. “Pesquisa e desenvolvimento geram um ciclo contínuo e progressivo, em que a mão de obra ganha especialização e, portanto, valor, forçando a adoção de técnicas industrializadas”, aponta.
DESAFIOS DA INDUSTRIALIZAÇÃO
Candusso ressalta que o esforço para padronizar os elementos arquitetônicos e construtivos, da forma como ocorre hoje, é “antiprodutivo” e prejudicial para a liberdade criativa dos arquitetos. “Curva é um palavrão”, ironiza. Ele defende que deve haver maior integração entre execução e projeto, o que permitiria a criação de soluções arquitetônicas para casos específicos.
“Hoje, realmente, é o pré-fabricado que tem que se moldar e atender a arquitetura, e não a arquitetura que tem que ser engessada para utilizar a industrialização”, apoia Leonardi.
“É uma nova forma de se relacionar na cadeia entre construtora, fornecedora, serviço terceirizado e todo o tipo de prestador de serviço. Ou seja, a gente tem que reanalisar toda essa rede de relacionamento, que é diferente para a construção industrializada”, sinaliza Walter Cover, presidente da Abramat (Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção).
Leonardi diz que a construção industrializada é muito simples quando o canteiro dispõe de um espaço amplo para organização das peças e, sobretudo, quando não está numa área urbana. “Quando falamos em empreendimento dentro da região metropolitana de São Paulo, tem toda a burocracia da legislação para acesso com transporte pesado até o canteiro de obras”, contrapõe, destacando que o grande complicador da industrialização é a logística para chegar no canteiro e a viabilidade de montagem.
De acordo com estudos da Abramat, a falta de isonomia tributária também é uma barreira. “O que é feito dentro de uma indústria é tributado de uma forma pelo ICSM (Imposto Sobre Circulação de Mercadores e Serviços) e o que é feito em canteiro é tributado de outra forma”, revela Cover. “Obviamente, nós não queremos que a isonomia seja feita aumentando a carga nos canteiros, mas reduzindo a carga para as indústrias”, completa.
O presidente também argumenta que a construção industrializada não dispõe de oportunidade para ser incorporada em obras de habitação de interesse social. “Ainda se leva muito em conta a necessidade de experiência provada, e nós sabemos que a industrialização é relativamente recente aqui no Brasil. Tem restrição aos consórcios da contratação entre a indústria e as construtoras”, diz. Segundo ele, o orçamento das licitações é sempre com base em números da construção convencional, e tudo isso dificulta a contratação.