Geração de ruído é um dos entraves na implantação de helipontos
Para reduzir o impacto na comunidade do entorno a solução é reduzir as operações permitidas por dia em cada região e determinar um tempo mínimo entre as manobras de pouso e decolagem
Texto: Redação AECweb/e-Construmarket
A frota brasileira de helicópteros urbanos lidera o ranking mundial desse tipo de transporte. Dados da Associação Brasileira de Aviação Geral (ABAG) demonstram que a frota atual de aviação executiva no Brasil é de 1.650 aeronaves, sendo 650 helicópteros, 350 jatos e 650 turboélices. Com 577 aeronaves, a capital paulista concentra 35% do total, incluindo 452 helicópteros e cerca de 260 helipontos, dos 427 disponíveis no país. Esse fenômeno se reflete na arquitetura dos empreendimentos corporativos, cujos projetos já preveem a instalação de plataformas para pousos e decolagens.
Nos grandes centros urbanos, os helipontos são instalados na última laje dos edifícios corporativos, sobre os pilares que vêm do solo.
“Em edificações antigas é preciso primeiro avaliar a estrutura e depois verificar o que é possível fazer em cada situação”, afirma o engenheiro Carlos Freire, especialista em engenharia de helipontos. Em alguns casos, é possível compor o projeto arquitetônico com o desenho das formas e revestimentos da fachada. Entretanto, diz Freire, na maioria das vezes o ideal é esquecer o design externo e projetar o heliponto como se fosse uma escultura do prédio.
O engenheiro cita como exemplo a solução para o edifício do Citibank na Avenida Paulista. A escultura é independente e, nesse caso, tem o formato de um mata-borrão. “O arquiteto criou um equipamento escultural em cima do edifício, cuja estrutura se apóia nas caixas de concreto do elevador”. Freire explica, ainda, que um dos maiores desafios de projeto é encontrar soluções para chegar ao heliponto, como rampas de acesso, escadas e elevadores que não podem causar obstáculos ao movimento do helicóptero.
Até a década de 60, segundo informa, os pilares da última laje eram menores, o que exigia reforço no caso de se criar um heliponto. “De lá para cá, por uma questão de economia na utilização das fôrmas de madeira, a tendência dos pilares é não ter mais variação, mantendo a maior resistência considerando a armadura mínima da norma NB 11976, o que facilita o projeto”, diz. Ele adverte que antes de instalar este equipamento em prédios antigos é preciso analisar minuciosamente a estrutura da edificação devido à sobrecarga que irá provocar na estrutura.
TendÊncia
Desde a década de 1990, as construtoras anunciam a construção de edifícios corporativos com esta alternativa, visando agregar valor aos empreendimentos. Os novos prédios são projetados e construídos com helipontos e 70% deles estão localizados nas avenidas Paulista, Luis Carlos Berrini, Faria Lima e em várias vias da Vila Olímpia.
Freire comenta que existe um exagero em relação à quantidade de helipontos em São Paulo, provocado pela especulação imobiliária. “Nem todos são utilizados”, afirma.
O projeto e os materiais a serem utilizados dependem da concepção do edifício e de sua fachada. Geralmente, em prédios existentes, a estrutura mais indicada é a metálica galvanizada a fogo, que é mais leve. Já nos empreendimentos em construção, a melhor opção é utilizar o concreto armado, por ser uma solução mais econômica.
O engenheiro destaca que o projeto arquitetônico deve considerar um determinado tipo de aeronave, que servirá de base para calcular o tamanho da plataforma. “As dimensões mínimas de um heliponto, aos olhos da nova legislação da Organização da Aviação Civil Internacional (OACI) foram reduzidas, passando de 18m x 18m para 12m x 12m. O projeto deve considerar a rampa por onde a aeronave passa para pousar e decolar. Sua inclinação inicial deve ser de um metro na vertical a cada 12,5 metros na horizontal (12,5:1) e ficar acima de obstáculos como torres de alta tensão, prédios, árvores e antenas”, informa.
LicenÇas
A aprovação para instalação de um heliponto passa por três órgãos: Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), Serviço Regional de Proteção ao Voo da Aeronáutica e Prefeitura Municipal. A ANAC aprova a documentação. Na Aeronáutica é feito o pedido de estudo de viabilidade para seu funcionamento e a autorização da prefeitura abrange o atendimento às exigências da legislação, que se atém às questões urbanas e ambientais.
A Portaria 256 do Comando Geral da Aeronáutica, editada em maio de 2011, dispõe sobre as restrições relativas às implantações que possam afetar adversamente a segurança e a regularidade das operações aéreas.
O poder público municipal avalia o projeto conforme as exigências da NBR 10151-2000, norma que fixa as condições aceitáveis de ruído em comunidades, independente das reclamações.
Para obter a licença de instalação de um heliponto é preciso identificar o ruído já existente na região, chamado ruído de fundo. “Na Avenida Paulista, por exemplo, o ruído de fundo é da ordem de 72 dB, dependendo do horário. Esse volume constante impede que as pessoas que estão no solo tenham tanta percepção do barulho provocado pelo pouso dos helicópteros”, explica Freire.
No entanto, a prefeitura exige que os helipontos sejam instalados a uma distância de 300 metros de hospitais. “Essa lei é pouco inteligente. Não considera as leis da acústica. O Hospital Santa Catarina, na região da Paulista, convive com um ruído de fundo de 72 dB. O fato de pousar um helicóptero a menos de 300 metros não vai impactar o paciente; ele não sentirá a diferença de ruído”, afirma.
Para Freire a legislação precisa ser melhorada. “Os próprios técnicos da prefeitura entendem que a lei está equivocada, mas a pressão das Organizações Não- Governamentais (ONGs) que não têm informações sobre os efeitos acústicos, não permitem. A prefeitura é suscetível, mas as entidades entendem que uma reforma pode piorar a lei, que precisa ser mais técnica, observando os conceitos normativos de acústica”, defende. Além da questão sonora, a prefeitura paulistana exige que os helipontos tenham recuo de 10 metros do terreno. “Os já existentes, que invadem esse recuo, não podem mais funcionar”, alerta.
RuÍdo
Freire explica que a geração de ruído é o desafio a ser enfrentado na implantação de helipontos e o desenvolvimento do projeto deve ser baseado nos conceitos de acústica para propor sua localização. O estudo acústico leva em consideração a média diária e a legislação separa ruídos permissíveis diurnos e noturnos previstos na NBR 10.151. Nos casos em que helipontos estejam instalados próximos a residências, a operação noturna não é permitida.
Para chegar à média diária, Freire pega como exemplo um heliponto com dez operações por dia. E explica que a somatória de todos os ruídos resulta no Sound Equivalent Level (SEL), que é o nível de equivalência sonora. O SEL deve ser igual ao ruído já existente. O pico máximo de ruído gerado por um helicóptero, a uma distância de 10 metros, é sempre considerado 95 dBA (máximo possível), e cada operação de pouso e decolagem de um helicóptero dura um minuto e meio. “O volume de ruído é calculado pela média encontrada com a somatória do ruído das operações, dividida por 12 horas. Essa média não pode ser maior que o ruído de fundo já existente. No caso da Avenida Paulista, a somatória das operações pode gerar ruído de até 72 dB. Uma zona de muito ruído de fundo permite um número maior de operações”, diz.
SoluÇÃo
Para causar menos ruído, reduzindo o impacto na comunidade do entorno de um heliponto, Freire diz que a solução é reduzir as operações permitidas por dia em cada região e determinar um tempo mínimo entre as manobras de pouso e decolagem. “Em zona residencial, do Morumbi, por exemplo, onde o ruído de fundo é de 55 dB, o helicóptero causará um impacto proibitivo, pois em uma única operação gera um pico máximo de 95 dB a uma distância de 10 metros”, comenta.
Medo
No entanto, existe um problema em relação aos helipontos que, segundo Freire é subjetivo: o medo das pessoas em relação à segurança, ao fato de estarem expostas a um risco não por vontade própria. “Quando ando de moto o dia todo, estou me expondo ao risco espontaneamente, enquanto que um heliponto no prédio vizinho de onde moro representa um risco involuntário. Isso não tem solução”, afirma.
Ele conta que em reuniões com a comunidade, percebe que as pessoas começam se contrapondo à instalação do equipamento com argumentos em relação ao ruído. Entretanto, quando se convencem dos conceitos de acústica, de que o impacto sonoro praticamente não será sentido, entram com a questão da segurança e perguntam: “e se houver um acidente?”. “Nesse caso, recorremos às estatísticas que mostram que o número de mortes em acidentes com helicópteros é bem menor do que nos acidentes de trânsito. Ainda assim não conseguimos eliminar o medo das pessoas”, afirma.
COLABOROU PARA ESTA MATÉRIA
Carlos Freire de Andrade Lopes – Engenheiro civil formado pela Escola de Engenharia Mauá, especialista em Engenharia Estrutural, com vários cursos de especialização em estrutura metálica e estrutura aeroportuária. Perito e auditor especializado em ruído e radiação eletromagnética não ionizante pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares da Universidade de São Paulo (IPEN-USP). Responsável por obras de projetos aeroportuários de mais de 30 helipontos, entre eles o da Câmara Municipal de São Paulo, do edifício do Citibank na Avenida Paulista, da Polícia Federal em Brasília, e de vários hospitais.