Iluminação de museus deve evitar que acervo sofra com radiação
Ao escolher as lâmpadas, projeto luminotécnico de museus deve priorizar fontes de luz que não emitam radiação ultravioleta ou luminárias que permitam uso de filtros UV
Texto: Redação AECweb/e-Construmarket
Em um museu as luzes interferem de maneira direta na correta percepção dos objetos, nas sombras, na dramaticidade do espaço e no bem-estar e satisfação dos visitantes. Da mesma maneira que a iluminação museológica colabora com a exposição – caso não seja bem projetada pode prejudicar os materiais da mostra. “A principal diferença entre a iluminação de objetos de arte e de coleção expostas em museus, centros culturais, galerias e acervos particulares, em relação a outros ambientes, está no cuidado com a preservação dos itens. Deve-se evitar a degradação provocada pela radiação luminosa”, explica o arquiteto e professor Luís Antônio Greno Barbosa, especialista em iluminação.
Ele comenta que a radiação infravermelha das lâmpadas, invisível ao olho humano, transmite calor que pode queimar os objetos expostos. “Já a radiação ultravioleta, também não visível, provoca a degradação do material causando o desbotamento irreversível em elementos sensíveis a luz. As lâmpadas com temperaturas de cor abaixo de 550 nanômetros devem ser evitadas na iluminação de materiais sensíveis, pois estudos demonstram que essa radiação visível causa degradação”, diz.
Até 3.000 Kelvin
A radiação ultravioleta, não visível, provoca a degradação do material causando o desbotamento irreversível em elementos sensíveis a luz. As lâmpadas com temperaturas de cor abaixo de 550 nanômetros devem ser evitadas
A aparência de cor mais indicada para um museu é a quente, já o uso de fontes de luz branco azuladas em exposições que contenham matérias muito sensíveis a luz não é recomendada.
Apesar das particularidades, o sistema de iluminação não necessita de fiação especial. Os fios devem obedecer às normas de segurança contra incêndio e as conexões elétricas precisam permitir possíveis modificações nos equipamentos sem grandes transtornos. Não é aconselhável o uso de fita isolante, podendo ser substituída por conectores. “No momento da escolha das lâmpadas, deverão ser priorizadas fontes de luz que não emitam radiação ultravioleta ou luminárias que permitam o uso de filtros UV. Para materiais muito sensíveis à luz, como papel, celulose, tecidos antigos, entre outros, a opção deverá ser por lâmpadas com aparência de cor morna com temperatura abaixo de 3.000 Kelvin”, detalha Greno.
Transitórias X Permanentes
O projeto deve ser elaborado por uma equipe multidisciplinar, que conte com um projetista da iluminação. “Este profissional deverá, com a ajuda do curador ou de técnicos do museu, classificar os objetos que serão iluminados, para identificar o nível de degradação luminosa em que se enquadram”, diz o arquiteto.
O tipo da exposição é outro fator determinante. “As mostras transitórias geralmente têm um projeto expográfico e cenográfico bastante elaborado e que não permanece montado por um longo período – seus equipamentos de iluminação são normalmente alugados. Já as permanentes devem ser estudadas com mais cuidado, já que o tempo de exposição do objeto à luz tem influência direta na degradação. Seus equipamentos de iluminação são comprados pelo próprio museu, que fica responsável pela manutenção”.
Sem ofuscamentoDeve-se prever ainda que o sistema de iluminação possua flexibilidade, evitando o ofuscamento dos observadores e calor no ambiente. O profissional também indica que o sistema não tem nenhuma necessidade de manutenção especial, exceto se forem utilizadas luminárias com enquadramento da luz sobre a tela, pois estas costumam sair de posição com o passar do tempo.
Níveis de iluminância
No momento da escolha das lâmpadas, deverão ser priorizadas fontes de luz que não emitam radiação ultravioleta ou luminárias que permitam o uso de filtros UV
O professor lembra que existem divergências sobre os níveis de iluminância mais indicados para um museu. A NBR ISSO/CIE 8995-1 cita apenas a iluminância média de 300 lux, sem determinar as iluminâncias máximas para os diferentes materiais dos objetos expostos. Em contrapartida, órgãos internacionais, como o International Council of Museums (ICOM), e a Illuminating Engineering Society (IES), da Inglaterra, identificam classes de materiais com diferentes iluminâncias e tempos limites de exposição à luz (conforme detalha a tabela a seguir).
Tipos de Material | Iluminância | Exposição (Anual) |
---|---|---|
Pouco sensíveis: Metal, pedra, vidro, cerâmica, joias e peças esmaltadas. | Sem limite (geralmente 300 lux), mas sujeitos ao calor radiante. | --- |
Moderadamente sensíveis: Pinturas (óleo e têmpera), couros naturais, tecidos com tinturas estáveis, chifre, osso, marfim, madeiras finas e lacas. | 150 lux | 360.000 lux.hora.ano |
Moderadamente sensíveis: Pinturas (óleo e têmpera), couros naturais, tecidos com tinturas estáveis, chifre, osso, marfim, madeiras finas e lacas. | 150 lux | 360.000 lux.hora.ano |
Extremamente sensíveis: Pinturas (guache, aquarela e similares), desenhos, manuscritos e impressos, selos, papéis em geral, fibras naturais, algodão, seda, rendas, lã, tapeçarias, couro tingido e peles e peças da história natural. | 50 lux | 120.000 lux.hora.ano |
Restauração e exames técnicos. | Até 1000 lux (curto período) | --- |
Obs.: Exposição: 8 horas x 300 dias x iluminância. Considerando a filtragem de radiações abaixo de 400 nanômetros.
Já o IES norte-americano admite as seguintes iluminâncias máximas:
Tipos de Material | Iluminância | Exposição (Anual) |
---|---|---|
Pouco sensíveis | Limitados ao calor radiante | --- |
Moderadamente sensíveis | 200 lux | 480.000 lux.hora.ano |
Extremamente sensíveis | 50 lux | 50.000 lux.hora.ano |
Obs.: Com a filtragem de radiação UV abaixo de 400 nanômetros.
Exposição sujeita ao Princípio de Bunsen-Roscoe (lei da reciprocidade) – efeito cumulativo do tempo de exposição.
“Além destas indicações, existe um trabalho publicado pela pesquisadora Karen M. Colby, do Montreal Museum of Fine Arts, específico para materiais compostos por papel e similares que é bem mais restritivo. Foi feita uma classificação dos itens, comparando suas degradações com os ‘Blue Wool Card’, cartões com tecido tingido em diferentes saturações de corante e com o tipo de material utilizado”, fala Greno e relembra que a exposição à luz pode ser aumentada ou diminuída em função do tempo de exibição, ou seja: quanto menor o tempo de exibição maior poderá ser a iluminância sobre o objeto.
Apesar da grande preocupação com o uso da iluminação artificial em ambientes museográficos e similares, Greno adverte que os maiores danos são causados pela iluminação natural, que entra no ambiente sem controle tecnológico, como filtros e cortinas. “A luz natural tem um componente de radiações UV e IR muito acima das fontes artificiais, e geralmente não se dá muita atenção ao controle da entrada da luz no ambiente, o que causa enormes problemas”, finaliza.
Colaborou para esta matéria
- Luís Antônio Greno Barbosa – Mestre em arquitetura formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Atua no desenvolvimento de projetos e assessoria a construtoras, arquitetos e decoradores na área de lighting-design, venda e instalação de equipamentos de iluminação. Foi docente das disciplinas ‘Museus, Hotelaria e Restaurantes’ e ‘História e Conceitos de Iluminação’, do curso de pós-graduação em ‘Tecnologia e Projetos de Iluminação’ da Universidade Estácio de Sá (UNESA). Ocupou também o cargo de professor convidado do curso de pós-graduação em ‘Iluminação’ da Universidade Veiga De Almeida (UVA). Além de participar de diferentes seminários de atualização profissional, é palestrante convidado em diversos eventos sobre iluminação, como no seminário ‘Lighting Design – Conceitos e Tendências’, organizado pelo IAB/RJ, em 2002, onde abordou o tema ‘iluminação para Museus’.