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Inércia térmica passa pelo uso adequado de isolantes

Em regiões de climas secos, inércia térmica do edifício deve ser alta; em áreas quentes ou úmidas, deve ser baixa. Materiais isolantes definem o desempenho

Publicado em: 08/07/2009Atualizado em: 14/11/2022

Texto: Redação AECweb


Inércia térmica, a chave do conforto

Redação AECweb

É correto afirmar que o bom desempenho térmico de uma edificação corresponde ao isolamento térmico? Não. O conceito é mais amplo e complexo, respondendo pelo nome de inércia térmica. “Esse conceito está relacionado à atenuação das variações de temperatura, enquanto a isolação é simplesmente impedir a passagem de calor de um lado para outro”, alerta a física Maria Akutsu, mestre em engenharia e doutora em arquitetura, responsável técnica pelo Laboratório de Conforto Ambiental e Sustentabilidade dos Edifícios – Centro Tecnológico do Ambiente Construído do IPT.

Segundo Maria, a quantidade de massa é que confere a uma edificação maior inércia térmica, ou seja, paredes de maior espessura, de concreto ou alvenaria convencional – providências que coincidem com as exigências do isolamento acústico”, ensina. Dependendo de como o isolante térmico é utilizado, a inércia térmica pode aumentar ou diminuir.

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O uso de isolantes térmicos tem que ser feito com certo cuidado, devendo ser considerado o clima da região em que está a obra e as características do edifício, como a definição quanto a ser climatizado ou não. “Um exemplo clássico é a casa sem ar condicionado e com alta inércia térmica – ideal para o clima de São Paulo -, feita com alvenaria de tijolo maciço e argamassa revestindo os dois lados, laje e telhado de barro. “Ao forrar a parede interna com um isolante térmico de 5 cm , que pode ser poliuretano expandido, lã de vidro ou lã de rocha, a inércia térmica da parede será anulada. Porque o calor produzido dentro da casa ou a radiação solar que entrou pela janela não serão absorvidos pela parede. Mas, com o emprego do isolante térmico do lado externo da parede, tem-se o aumento do isolamento térmico e a manutenção da inércia térmica”, explica a pesquisadora.

Segundo ela, em regiões de clima seco, o ideal é buscar uma alta inércia térmica para o edifício, pois as variações da temperatura ao longo do dia são maiores. Já no litoral, onde predomina o clima úmido e quente, as variações são menores, portanto, se deve trabalhar com baixa inércia térmica. “A alta inércia térmica de uma habitação será favorável tanto no inverno quanto no verão. Lá fora, a temperatura no verão pode variar de 20 ºC a 32 ºC – num dia bem típico de São Paulo. Como fazer para que a temperatura no interior da casa fique abaixo dos 32 ºC? Não será enchendo a casa de isolante térmico, mas, usando materiais que confiram alta inércia térmica à edificação”, diz.


Cobertura
Já para a cobertura a regra é outra, podendo-se utilizar os isolantes térmicos à vontade. “Se a obra tem uma laje maciça, é melhor instalar o isolante sobre ela, pois vai aumentar a isolação e ganhar um pouco mais de inércia”, ensina, informando que a solução promove conforto térmico, tanto no inverno quanto no verão. Ilustrando: dependendo da inércia obtida, num dia frio em que os termômetros marcam 6 ºC, a temperatura dentro da edificação poderá ficar até 7 ºC acima da externa.


A busca pela sustentabilidade na construção, tornou comum o uso de telhas brancas ou pintadas de branco, o que, de acordo com a pesquisadora, tem resultados térmicos comprovados e de baixo custo. “Numa telha de cimento amianto, muito usada e escurecida, a absorção chega a 99% da radiação incidente. Ao pintá-la de branco, com qualquer tinta, passa a absorver 20% ou menos. E, se for mais brilhante, reflete mais ainda. Hoje existem tintas com esferas cerâmicas na sua composição, que podem aumentar ainda mais essa reflexão. Como a poeira acumula, escurecendo a superfície, o efeito é o mesmo se passar uma mão de cal”, sugere. Outra ressalva: o recurso não é adequado para telhas cerâmicas, pois seus poros absorvem água que, quando evaporada, rouba calor. O ideal é utilizar telha cerâmica de cores mais claras para não perder suas demais propriedades e benefícios.


As telhas metálicas simples, normalmente utilizadas em galpões industriais, são consideradas por Maria Akutsu como ‘terrível’ do ponto de vista térmico. “O metal tem uma alta condutividade térmica e vai acabar conduzindo muito calor para baixo. Uma ressalva: se a superfície interna é de alumínio polido, que tem baixa emissividade, menos calor será irradiado para o ambiente”, diz. A isolação é indispensável para que a telha metálica alcance resistência térmica minimamente satisfatória, o que é obtido com, no mínimo, 5 cm de um isolante como, por exemplo,  poliuretano, lã de rocha ou lã de vidro. “Seria equivalente a ter um telhado com algum forro - por exemplo, um telhado de barro, com espaço e forro de madeira. Além disso, vai atenuar os ruídos de impacto das chuvas”, aconselha. Caso a indústria só possa adotar um recurso muito econômico, a solução é pintar a superfície externa de branco.


Inércia térmica, a chave do conforto


Isolantes térmicos
A composição ideal do isolamento térmico da cobertura vai depender do clima da região onde está a obra. “Em regiões onde a alta inércia térmica é benéfica, uma boa solução é a laje maciça com um isolante sobre ela. No clima quente-úmido, onde a inércia não é importante, podem ser usados forros leves, como madeira ou PVC, e colocar por cima o isolante térmico com pelo menos 5 cm de espessura”, expõe a pesquisadora, alertando, porém, que a espessura ideal é variável e deve ser determinada pelo consultor de isolamento térmico. Hoje, há softwares de simulação que prevêem, com precisão, as temperaturas internas que serão atingidas em função da condição climática e do projeto do edifício.


Maria Akutsu indica , ainda, as barreiras radiantes, isolamento térmico conhecido como subcobertura. E explica: “A grande propriedade desse material é sua baixa emissividade. Basicamente é uma folha de alumínio, estruturada com materiais variados. É aplicado entre o forro e a cobertura, pois ele atua como barreia à radiação térmica. Por ter baixa emissividade, emite menos calor por radiação e, ao mesmo tempo, tem alta refletância ao infravermelho (calor), obtendo resultados equivalentes a 5 cm de lã de vidro ou lã de rocha, se aplicados adequadamente. É um material leve, de fácil instalação e baixo custo. Única restrição é a baixa durabilidade decorrente das condições de uso”.


 No caso dos galpões industriais com telhado metálico, sem isolante, é interessante aliar o recurso da pintura branca na face externa, à folha de barreia radiante sob o telhado, com efeito de forro isolante – sempre deixando um espaço de ar de cerca de 3 cm antes e depois. Se a telha for trapeizodal ou ondulada, a folha pode ser colada diretamente.


Condicionamento do ar
O conforto térmico envolve parâmetros ambientais - temperatura do ar, umidade, velocidade e temperatura radiante média do ambiente – e, também, a roupa da pessoa e seu metabolismo. “Por que colocar terno e gravata e exigir 18 ºC?”, indaga. O governo japonês respondeu à questão com campanha de estímulo para que funcionários de empresas abram mão do terno e gravata nos escritórios. No Brasil, apesar de os estudos de conforto ambiental indicarem que 26 ºC ainda é uma temperatura agradável, a maioria dos escritórios opera com ar condicionado em temperaturas bem inferiores. Estudo do pesquisador dinamarquês, Fanger, base da norma ISO sobre o assunto, correlaciona todos os parâmetros climáticos com a sensação térmica de conforto absoluto. “Ele concluiu que, mesmo estando numa situação de total equilíbrio térmico, sempre haverá no ambiente pelo menos 5% de insatisfeitos”, diz ela. A norma ISO admite, no máximo, 20% de pessoas insatisfeitas com a temperatura de um ambiente. “Nesta condição, com 29ºC e usando pouca roupa, e com velocidade do ar de 0,8 m/seg, é possível satisfazer 80% das pessoas”.


Fachadas cortinas 


Nos edifícios, especialmente nos corporativos com ar condicionado, o ideal é adicionar isolantes à cobertura e às paredes. Mesmo que instalados na parte de baixo da laje, comprometendo um pouco a inércia, o recurso pode compensar pelo quanto que impede da entrada de calor solar. “Nas paredes, se for condicionar o ambiente o tempo todo, é indiferente a posição do isolante. Mas, para economizar energia e maximizar o desempenho do edifício, o isolante deve ser aplicado externamente. A solução implica desligar o ar condicionado um pouco antes e ligar um pouco mais tarde. A parede, neste caso, funciona como um amortecedor térmico e tem o isolante do lado de fora garantindo a regulação mínima”, explica.



O projeto em fachada cortina parte da decisão prévia por um edifício de baixa inércia térmica. “A alta inércia tem como função amortecer a variação de temperatura - por exemplo, externamente a temperatura tem uma amplitude de 10 ºC e 12 ºC, com alta inércia é possível fazer com que dentro do edifício a variação fique entre 4 ºC e 5 ºC. Com inércia zero, a amplitude no ambiente fica igual à externa. E, mais: o envidraçamento faz entrar a radiação solar, fazendo com que a temperatura máxima fique muito acima da externa. É o efeito estufa. Dependendo da área de vidro e do volume do ambiente que se tem, pode chegar a 10ºC ou 20ºC acima da externa”, ressalta a pesquisadora. Nessa condição, é preciso buscar o melhor vidro e as opções são várias, dos refletores aos duplos insulados, até as fachadas duplas com câmara de ar. “Um vidro simples incolor permite a entrada de 87% da radiação solar. Se colocar um filme refletor, pode diminuir pela metade a carga térmica. Já o vidro duplo apresenta maior resistência térmica e o ambiente perde menos frio, além de reduzir a entrada de calor vindo do sol”, sugere Maria Akutsu, indicando, ainda, os brises como solução que, sombreando ao máximo, evita a entrada da radiação.


Sustentabilidade
Para garantir alta inércia térmica, porém, com baixo consumo de materiais – conforme critérios da sustentabilidade – e rapidez de execução, a vanguarda acadêmica internacional pesquisa materiais de mudança de fase. A pesquisadora oferece como referência para o entendimento desse conceito, a mudança de estado de sólido para líquido, momento em que não varia a temperatura do material. “Todo calor é usado para a mudança de um estado para outro, portanto, é um material de alta inércia térmica. Por exemplo, na mudança do estado do gelo de sólido para líquido, enquanto estiver no estado fundente gelo-água, a temperatura se mantém a zero grau. Ele usa o calor para mudar a fase. As pesquisas procuram um material que faça essa mudança de fase entre 20ºC e 24ºC, seja viável economicamente e seguro”, revela.


Tendo alta inércia térmica com pouca massa, o ambiente poderia ter paredes menos espessas, utilizando material que faça a mudança de fase ao absorver calor, sem sofrer variação de temperatura. Segundo ela, os estudos no Brasil são ainda teóricos.


Redação AECweb




Colaborou para esta matéria:



Maria Akutsu – Física, pelo Instituto de Física da USP, em 1974; mestre em engenharia civil pela Escola Politécnica da USP, em 1983; engenheira da qualidade, CQE, pela ASQC em 1991; e doutora em arquitetura pela FAU /USP, em 1998.



É pesquisadora no IPT desde 1975, atuando na área de conforto ambiental e também a responsável técnica pelo Laboratório de Conforto Ambiental e Sustentabilidade dos Edifícios – Centro Tecnológico do Ambiente Construído do IPT, que realiza ensaios para a determinação de valores de propriedades térmicas, acústicas e lumínicas de elementos e materiais de construção, bem como simulações computacionais e medições ‘in loco’ para determinação de níveis de ruído e temperaturas em edificações.