Instalações elétricas de equipamentos públicos devem ser fiscalizadas
Execução malfeita e circuitos velhos com baixa isolação dos fios podem ser a causa de acidentes fatais envolvendo transeuntes. Veja algumas medidas básicas a seguir
Texto: Redação AECweb/e-Construmarket
Tensões a partir de 50 V também podem ser fatais (pratan/shutterstock)
Somente nos três primeiros meses de 2018 foram registradas, no Brasil, duas mortes provocadas por choques elétricos causados por instalações públicas. A primeira ocorreu no pré-carnaval paulistano, quando um folião de 22 anos foi eletrocutado após tocar um poste no centro da cidade. O segundo óbito aconteceu no centro do Rio de Janeiro, em março, com um poste novamente sendo a fonte da descarga que vitimou um músico de 37 anos.
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“A origem do problema está na baixa isolação dos fios, que permite fuga de corrente para o elemento metálico do poste. Isso é falha de instalação”, alerta o engenheiro José Rinaldo Maniezzo, titular da Seenow Consultoria e Engenharia. Ao entrar em contato com a estrutura problemática e colocar os pés no chão, a vítima transforma seu corpo em condutor de eletricidade. O choque seria evitado se a pessoa, por exemplo, vestisse sapato emborrachado.
Por outro lado, se alguém tocar no poste e colocar os pés sobre outro elemento metálico em contato com o solo — como cercas e grades —, a descarga é potencializada. “É preciso ter em mente que, na tensão comercial mínima de 110 V, o choque, ao atravessar o coração, demora menos de um segundo para matar”, afirma o especialista.
A origem do problema está na baixa isolação dos fios, que permite fuga de corrente para o elemento metálico do poste. Isso é falha de instalaçãoJosé Rinaldo Maniezzo
OS RISCOS DA ELETRICIDADE
O resultado do choque elétrico sofrido por duas pessoas no mesmo equipamento pode ser completamente diferente. A corrente sempre procura o caminho de menor resistência e, por isso, nem sempre atravessa o coração. “Antigamente, como não havia equipamentos, alguns eletricistas testavam se havia ou não energia colocando dois dedos sobre a fiação. O argumento era que a corrente entraria por um e sairia pelo outro”, lembra o engenheiro
Contudo, o conceito se mostrou falho quando um profissional morreu: a corrente entrou pelo dedo, percorreu todo o braço, atingiu o peito e saiu pelo outro dedo. “O choque só mata quando passa pelo coração, pois a eletricidade causa fibrilação que é a responsável pelo óbito”, explica, lembrando que acidentes com tensões mais elevadas podem resultar em mortes por queimaduras.
Uma crença popular que é totalmente equivocada é a de que somente acidentes com tensões acima de 220 V são fatais. A eletricidade começa a ser perigosa a partir dos 50 V, valor inferior a menos da metade do que existe nas tomadas comuns. “Com essa tensão, o corpo conduz corrente de cerca de 30 mA”, comenta Maniezzo.
O gráfico presente na norma IEC 479-1, da International Electrotechnical Commission, mostra a relação entre a tensão e o tempo necessário para o choque se tornar fatal. Segundo a imagem, com 110 V, a morte acontece entre 0,5 e 1 segundo. Já para 50 V, a pessoa demora cerca de 10 segundos para perder as funções vitais. “A massagem cardíaca é indispensável para salvar a vítima. Quando feita até um minuto depois do choque, em quase 100% das vezes a pessoa consegue sobreviver”, ressalta o engenheiro.
ORIGEM DOS PROBLEMAS
Como os choques elétricos são um perigo real para a vida, a instalação de equipamentos públicos no Brasil precisa ser mais criteriosa para evitar acidentes. “O que falta no país é responsabilidade técnica dos engenheiros que projetam e instalam esses circuitos”, opina o consultor.
O que falta no país é responsabilidade técnica dos engenheiros que projetam e instalam esses circuitosJosé Rinaldo Maniezzo
Atualmente, a norma de segurança exige que o profissional responsável assine o projeto e que, depois de pronto, realize a vistoria para emissão da Anotação de Responsabilidade Técnica (ART). “São precisos equipamentos para testar se os fios estão com baixa isolação. Mas, no Brasil, é comum a busca por preços mais baixos. Com isso, o investimento nos aparelhos acaba sendo deixado de lado. Priorizar o custo é desprezar a qualidade”, afirma o engenheiro.
Segundo Maniezzo, os problemas com os postes têm origem na instalação. “Falhas no projeto causam outros riscos”, explica. Geralmente, os choques são decorrentes de execução malfeita, circuitos velhos ou reparos errados. “As emendas precisam realizadas com maestria, porém o instalador descasca o fio e o deixa sem isolação ou, então, usa uma fita isolante de péssima qualidade”, complementa.
MELHORIAS
Dedicar atenção à instalação e investir o necessário são os primeiros passos para garantir que acidentes não voltem a ocorrer. A emenda da fiação, por exemplo, precisa ser realizada com os materiais adequados, como os termorretráteis. A solução, quando utilizada, se fecha sobre o fio, garantindo a isolação adequada e evitando fuga de corrente para o poste metálico.
O ideal é proteger a fiação com o uso de eletrodutos de PVC, que isolam o material elétrico e evitam acidentes. “Mas em obra pública não são utilizados porque aumentam o custo”, diz o consultor. Alternativa ainda mais cara, porém com potencial de resolver a situação, é a substituição dos postes metálicos pelos de fibra de vidro, não condutores e imunes à corrosão.
Já o uso do disjuntor Diferencial Residual (DR) é obrigatório, no Brasil, apenas para edificações, de acordo com a ABNT NBR 5410 – Instalações elétrica da baixa tensão. “No exterior, alcança também os equipamentos públicos, pois tem como principal vantagem desligar o circuito quando ocorre qualquer fuga de corrente”, afirma.
Medida essencial, porém nem sempre adotada, é a responsabilização dos profissionais envolvidos no projeto e execução da instalação elétrica. Além do engenheiro da prefeitura ou empresa pública contratante, também deve fiscalizar a obra o fornecedor do serviço de instalação. “O ideal é que depois de o trabalho concluído, seja solicitado ensaio e laudo, para garantir a segurança da instalação”, fala o engenheiro.
ROEDORES
Os ratos são problemas comuns das grandes cidades. O Metrô de São Paulo, por exemplo, tem uma divisão de tratamento de roedores. Eles mastigam o PVC usado na isolação dos fios, deixando os fios expostos, o que coloca em risco o sistema e acaba com a segurança.
“A melhor solução é colocar a fiação dentro de tubos, apesar de muitos profissionais argumentarem que o rato pode também roer o eletroduto. Mas, fora isso, não há muito mais o que ser feito. Nessa situação, a fiscalização frequente seria de grande ajuda”, analisa o consultor.
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Colaboração técnica
- José Rinaldo Maniezzo – Formado em Engenharia Eletrônica e Telecomunicações pelo Instituto Nacional de Telecomunicações (Inatel), tem pós-graduação em Eletrônica e Engenharia de Segurança no Trabalho pela FEI. É instrutor no Senai de Osasco e titular da Seenow Consultoria e Engenharia.