Obra bem-sucedida passa por bom projeto de impermeabilização
Nelma Christina Alves, vice-presidente da área técnica do IBI, também fala sobre tecnologias, métodos de aplicação, especificação de impermeabilizantes e mais
Entrevista: Nelma Christina Alves
Redação AECweb
Ponto crítico e muitas vezes negligenciado nas obras, quando bem executada a impermeabilização traz benefícios, mas ‘dor de cabeça’ para aqueles que não lhe deram a devida atenção. Em entrevista ao AECweb, a engenheira Nelma Christina Alves, vice-presidente da área técnica do IBI - Instituto Brasileiro de Impermeabilização, fala sobre sustentabilidade, retrofit, a importância do projeto na área e as patologias mais comuns em obras.
AECweb – Quais as principais tecnologias disponíveis no mercado hoje?
Alves - Existem vários sistemas e produtos, que vão desde as impermeabilizações tradicionais, como a manta asfáltica, até materiais de base acrílica, epoxi e poliuretano, que são inovações no mercado. Além disso, há uma grande preocupação dos fabricantes em produzir materiais menos agressivos que atendam aos princípios da sustentabilidade.
AECweb – Já existem materiais menos agressivos?
Alves - Sim. Hoje, estão desenvolvidos materiais dentro da linha tradicional com a finalidade de reduzir os componentes agressivos dos impermeabilizantes. Uma das alternativas adotadas é substituir os materiais a base de solução por aqueles a base de emulsão.
AECweb – Qual o papel do projeto de impermeabilização?
Alves - É extremamente importante. E, mais: o ideal é que o projeto de impermeabilização seja feito na mesma fase em que os outros - arquitetônico, estrutural e de instalações – estão sendo pensados. Isto porque os projetos devem ‘conversar’ entre si para que a solução de um, não interfira na eficiência do outro, evitando problemas futuros.
AECweb – Cite alguns exemplos.
Alves - A interferência causada pelas instalações hidráulicas é um bom exemplo. Para melhorar o desempenho da impermeabilização, o projeto recomenda maior número de captação em laje para diminuir da espessura da argamassa e resultar em uma vazão mais rápida. Na parte elétrica, a indicação é fazer a instalação de iluminação em um rodapé acima do nível da impermeabilização, evitando possíveis infiltrações. Para evitar intercorrências com o sistema de ar condicionado em prédios comerciais, a sugestão é executar bases com grande altura para acomodar as centrais de resfriamento. Assim, numa impermeabilização futura, os aplicadores têm acesso por baixo do equipamento.
AECweb - E nas obras já executadas?
Alves - O projeto também é importante, na medida em que orienta quanto ao desempenho dos sistemas escolhidos para impermeabilização, além de mostrar detalhes de execução. É um instrumento importante, tanto para o aplicador, quanto para o construtor, que nem sempre é especializado ou tem conhecimento para avaliar algumas informações. Além disso, possibilita que o construtor cobre da empresa aplicadora a execução do projeto conforme está no papel, onde estão avaliadas todas as interferências.
AECweb - A especificação feita pela própria indústria é suficiente?
Alves - Muitas construtoras de pequeno porte não têm condições ou mesmo desconhecem que existem empresas no mercado especializadas em fazer projetos de impermeabilização. Nesses casos, as construtoras procuram se cercar de especificações mínimas para ter sucesso. Feita muitas vezes de forma indiscriminada e por pessoas não capacitadas, a impermeabilização se transformou no item que exige maior manutenção pós entrega da obra. Essa dificuldade na contratação da empresa, o desconhecimento dos materiais que devem ser usados - e como devem ser usados - causam uma série de problemas minimizados pelas especificações. O pouco conhecimento técnico que trazem, ajuda o construtor a avaliar o que está sendo proposto na hora da contratação.
AECweb – O retrofit exige algum cuidado especial?
Alves - Com retrofit muda tudo. Todo material, independente de ser impermeabilizante ou não, tem uma vida útil que, quando se extingue, há necessidade do trabalho ser refeito. No caso da impermeabilização de uma laje de térreo, por exemplo, além de refazer, é necessário remover o revestimento existente. Essa necessidade abre a possibilidade do retrofit, uma vez que a obra obrigatoriamente terá que ser feita. O mesmo vale para o contrário: ao remodelar o térreo, deve-se aproveitar para refazer a impermeabilização. Dessa forma, se evita o retrabalho e gastos extras com acabamento.
AECweb – Nas residências, a impermeabilização é bem utilizada?
Alves - Deixa muito a desejar. Casas com padrões mais altos, que contam com arquiteto e engenheiro que acompanham a obra, é mais fácil se encontrar um projeto de impermeabilização. Porém, nas construções de um modo geral, a impermeabilização é feita pelo próprio pedreiro ou empreiteiro. O problema é que nem sempre essa pessoa tem conhecimento suficiente e acaba se valendo da compra de material no varejo.
AECweb - Em casas que contam com laje e telhado, há necessidade de impermeabilização?
Alves - O telhado por si só deveria ser estanque. Por precaução, pode-se fazer uma impermeabilização na laje, sob a cobertura. Posteriormente, com anos de uso e rearranjo de telhas, há também a possibilidade de se fazer uma impermeabilização sobre o telhado, já existe material no mercado que atende essa demanda.
AECweb – Como ocorre a impermeabilização sob telhado verde?
Alves - As coberturas verdes são a tendência do momento, exatamente porque levam a questão da sustentabilidade. Nelas, se aproveitam as áreas verdes da cobertura, tendo solo e jardim para a reabsorção da água das chuvas. A impermeabilização neste caso é fundamental para evitar infiltração no andar inferior. Hoje, o mercado oferece produtos que, incorporados, repelem as raízes que perfuraram a impermeabilização. O projeto para esse tipo de telhado também deve recomendar que plantas com raízes perfurantes, como o bambu, não sejam usadas, uma vez que elas quebram a proteção mecânica, rasgam a manta com uma velocidade e agressividade impressionantes.
AECweb - O que engenheiro de obras deve saber para fiscalizar a execução?
Alves - Se o engenheiro da obra tem o projeto na mão, fica fácil de fazer a fiscalização e a conferência de material adquirido pela empresa. Além disso, existem cursos de extensão que dão uma noção geral de como funciona o processo de impermeabilização, uma vez que, nas universidades, impermeabilização não é uma matéria da grade curricular do curso de engenharia civil. Com o projeto na mão e um pouco de informação, os engenheiros e arquitetos conseguem evitar uma série de desperdícios na obra. Quando se contrata uma empresa de impermeabilização sem um projeto e conhecimento do assunto, podem ocorrer erros que impactam na má utilização da mão de obra, desperdício de material e geração de entulho.
AECweb – Então pode haver erros tanto no substrato quanto na execução?
Alves - Sim, na fase de pós-execução da obra, é muito comum a fixação de antenas, brinquedos de playground, alambrados de quadra, equipamentos esportivos e de piscina sem a menor preocupação com a impermeabilização que se encontra a poucos centímetros abaixo e pode ser danificada. Outro fato, diz respeito a escolha do material impermeabilizador, que deve ser adequado ao substrato existente. Por isso, é muito importante se ter conhecimento prévio do substrato na hora de escolher o sistema impermeabilizante. Não dá para aplicar, por exemplo, um sistema de impermeabilização rígido em uma área em que carros vão transitar, como o estacionamento de shopping. Nesse caso, o mais indicado são os materiais flexíveis, que suportam e absorvem os esforços.
AECweb - A infiltração em garagens de edifícios tem uma única causa?
Alves - Não. A infiltração em garagem pode se dar pelo tempo de vida útil do sistema impermeabilizante adotado; falha na escolha do produto; falha de execução; danos provocados por terceiros; raízes de plantas; equipamentos elétricos instalados. Enfim, são várias as causas e cada caso tem que ser estudado isoladamente.
AECweb - Quais são as ações do IBI para melhorar o conhecimento e uso de impermeabilizantes?
Alves - Um dos objetivos do IBI é ser fonte de referência de conhecimento e difundir a importância da impermeabilização no segmento de construção civil. Para isso, a entidade participa de feiras dando palestras, promove seminários junto a outras instituições, desenvolve cartilhas instrutivas, tudo no sentindo de formar e informar a maior quantidade de profissionais possíveis. Além disso, o IBI hospeda o CB-22, o Comitê Brasileiro de Impermeabilização. Na área governamental, o IBI participou, junto ao Ministério Público, da elaboração do capítulo sobre impermeabilização da NR18, a norma que rege o canteiro de obra. Na questão de capacitação, a ABNT está desenvolvendo o perfil do impermeabilizador, com os conhecimentos que ele deve ter, para formação qualificada de mão de obra junto ao Senai.
Redação AECweb
Nelma Christina Scalet Alves é engenheira civil, com atuação no segmento de impermeabilização desde 1985. Atual vice-presidente Técnica do IBI – Instituto Brasileiro de Impermeabilização - e ex-presidente (gestão 2008/2010). Participa na ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) da elaboração de Normas Técnicas do CB 22 – Comitê Brasileiro de Impermeabilização. Atualmente coordena o grupo de trabalho de reestruturação CB 22. Atua, ainda, como consultora e palestrante. É sócia-diretora da empresa Abrigo Engenharia e Impermeabilizações Ltda.