Para IAB-RJ, obras das Olimpíadas 2016 deveriam ficar concentradas em uma região
O objetivo seria o desenvolvimento da área portuária, que atualmente se mostra pouco atrativa para o mercado imobiliário
Texto: Redação AECweb/e-Construmarket
Faltando menos de um ano para a tocha olímpica ser acesa no Rio de Janeiro, a cidade entra na reta final de preparação para receber atletas e turistas do mundo inteiro. Com algumas instalações já entregues e outras ainda em construção, o orçamento oficial da Olimpíada indica que a organização dos jogos custará cerca de R$ 38,7 bilhões, dos quais R$ 24,6 bilhões estão sendo investidos em obras que ficarão como legado para a população. De acordo com o arquiteto Pedro da Luz Moreira, presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil – Departamento Rio de Janeiro (IAB-RJ), apesar dos valores elevados, as obras pouco vão contribuir para o desenvolvimento da cidade. “As competições serão um sucesso, até pela capacidade do povo brasileiro de receber bem. O que me frustra é a oportunidade que estamos desperdiçando. Altos investimentos que não geram mudança na forma equivocada de construir a capital fluminense, algo que acontece também em outras metrópoles do país”, lamenta.
A organização do evento optou por concentrar as instalações olímpicas em três regiões da cidade: Barra da Tijuca, Deodoro e zona sul. A Barra, local onde estão sendo executadas as maiores intervenções, abrigará as Vilas Olímpica e Paraolímpica, além do Parque Olímpico, que sediará as disputas de basquete, ciclismo de pista, ginástica artística, ginástica de trampolim, ginástica rítmica, handebol, judô, luta greco-romana, luta livre, nado sincronizado, natação, polo aquático, saltos ornamentais, taekwondo, esgrima e tênis. Em Deodoro, estão em construção as arenas que receberão as competições de hipismo, ciclismo mountain bike, ciclismo BMX, pentatlo moderno, tiro esportivo, canoagem slalom, hóquei sobre grama, rúgbi e algumas partidas de basquete. As modalidades que acontecerão na zona sul serão divididas em duas áreas: em Copacabana, as provas de marcha atlética, ciclismo de estrada, maratonas aquáticas, triatlo, vela, vôlei de praia, remo e canoagem; já na região do Maracanã, os complexos abrigarão os jogos de futebol, vôlei, atletismo e tiro com arco.
Nossa posição era a de que tudo deveria ficar concentrado na região do portoPedro da Luz Moreira
A dispersão das obras por vários pontos do Rio de Janeiro é exatamente o oposto do que foi defendido pelo IAB-RJ desde o início do planejamento do evento. “Nossa posição era a de que tudo deveria ficar concentrado na região do porto”, afirma Moreira. A justificativa é que o centro da cidade, onde está a área portuária, não é atrativa para o mercado imobiliário, e os Jogos Olímpicos poderiam ser usados para alterar essa realidade. “Apesar de Deodoro também não ser uma região visada, a Barra da Tijuca recebe constantes investimentos”, explica. O IAB-RJ realizou o concurso público do Porto Maravilha, que contava com algumas quadras onde poderia ser construída a Vila dos Árbitros e que, posteriormente, seria transformada em empreendimento habitacional. “Esse projeto teria a importância de atrair a atenção do mercado imobiliário para investir em habitações na zona do porto”, fala.
Entretanto, a decisão de distribuir as competições por toda a Cidade Maravilhosa passou outro sinal para o mercado imobiliário. A avaliação do arquiteto é que, uma vez que a população carioca não cresce, a metrópole também não deve expandir sua mancha urbana. “Temos uma parcela da cidade já construída e que foi esvaziada devido à desindustrialização. O ideal seria a reutilização desses espaços a fim de proporcionar o desenvolvimento.” A expansão da mancha urbana dificulta, ainda, a universalização da infraestrutura. “Nem todo o Rio de Janeiro tem acesso à coleta de esgoto, à iluminação e ao calçamento. O crescimento da cidade torna ainda mais complicada a chegada desses serviços para toda a população”, destaca.
Se o investimento fosse feito nos trens da Central do Brasil, cerca de seis milhões de pessoas seriam favorecidas, mas a ampliação do metrô irá beneficiar somente a população que mora na Barra da Tijuca e no Recreio, em torno de 180 mil cariocasPedro da Luz Moreira
OBRAS DE MOBILIDADE
A prefeitura do Rio de Janeiro está investindo na mobilidade urbana, com a construção de quatro linhas de BRT – Transporte Rápido por Ônibus – e uma malha de VLT – Veículo Leve sobre Trilhos –, na região portuária. Já o governo do Estado destina recursos para ampliação do metrô e, em breve, uma nova linha que liga a Barra da Tijuca até Ipanema deverá ser inaugurada. Porém, a intervenção no metrô também é questionada pelo IAB-RJ. “Nós aplaudimos as obras de mobilidade na cidade, mas os valores poderiam ter sido destinados a um modal de maior capacidade. Se o investimento fosse feito nos trens da Central do Brasil, cerca de seis milhões de pessoas seriam favorecidas, mas a ampliação do metrô irá beneficiar somente a população que mora na Barra da Tijuca e no Recreio, em torno de 180 mil cariocas”, analisa o arquiteto.
PLANEJAMENTO
Muitas das obras para as Olímpiadas de 2016 têm preocupação ambiental e contarão com sistemas sustentáveis, como soluções para reúso da água. “Grande parte dos novos empreendimentos estão com essa demanda, mas de forma bem parcial e não holística”, fala o arquiteto. Parte dos empreendimentos terá suas arenas construídas com estruturas metálicas, que serão aproveitadas em escolas após as competições. “Devemos esperar para ver se essa experiência dará certo ou não. Temos dúvidas se os projetos foram desenvolvidos com critério e tempo necessários para que essa transformação aconteça da melhor maneira possível”, diz o arquiteto, comentando que, de maneira geral, há um baixo investimento nas fases de planejamento e projeto em todo o país. Há, sempre, uma grande ansiedade para iniciar as obras, prejudicando a fase de planejamento. Isso gera uma série de descontrole em relação a custos, prazos e qualidade. “O grau de eventualidade está presente em qualquer construção, mas aumenta muito quando não se dá a importância devida à fase de projeto”, finaliza.
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Colaborou para esta matéria
- Pedro da Luz Moreira – arquiteto e doutor em Urbanismo (UFRJ/FAU-Prourb). Sócio-gerente da Archi5 Arquitetos Associados, desenvolveu projetos para o Rio Cidade e o Favela-Bairro, bem como para o Jardim Botânico e o Parque do Vale dos Contos, em Ouro Preto. Foi professor adjunto da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e coordenador-geral do programa Morar Carioca. Atualmente, é professor adjunto da Escola de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense (EAU/UFF), diretor do IAB e presidente do IAB-RJ.