Por que sistemas de drenagem de águas pluviais exigem projeto cuidadoso?
Profissionais devem se atentar para o atual regime de chuvas – intensas e rápidas –, que já não corresponde mais ao estabelecido pelas antigas tabelas de cálculos. Veja outras dicas
Texto: Redação AECweb/e-Construmarket
Calhas são parte essencial do sistema de drenagem de águas pluviais (Foto: Roman Okunev/ shutterstock)
As mudanças climáticas que impactam o planeta vêm alterando o regime de chuvas. “No Brasil, as chuvas se tornaram mais frequentes, porém com fortes picos de intensidade em curto espaço de tempo”, diz o arquiteto e urbanista Lúcio Gomes Machado, professor doutor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP).
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Segundo ele, o fenômeno causa transbordamento das calhas nas residências, principalmente nas mais antigas. “Afinal, cai muita água de repente, em poucos minutos”, diz, lembrando a importância de o arquiteto desenvolver um bom projeto de telhado e do sistema de drenagem para águas pluviais. E jamais deixar os cálculos necessários e a execução do sistema nas mãos de profissionais não habilitados.
Israel Carvalho, sócio-diretor da IDK Telhados, frisa que as falhas no projeto ou a inobservância de alguns detalhes podem ocasionar infiltrações, goteiras e transbordamento.
Calhas, condutores, rufos, grelhas, caixas de areia e de passagem são os principais elementos que constituem o sistema de drenagem pluvial. As seções das calhas podem ter formato retangular, quadrado, semicircular, em V ou U. “Os formatos mais usados são as calhas tipo molduradas, quando aplicadas externas ou perimetrais no beiral. Ou, ainda, dobradas de acordo com a necessidade quando instaladas atrás de platibanda”, afirma Carvalho.
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MATERIAIS
De acordo com Carvalho, os materiais mais utilizados para calhas e rufos são as chapas de aço galvanizadas, de alumínio e de cobre. “Para evitar que a chapa galvanizada enferruje, basta pintar com tinta ou manta asfáltica, que impermeabilizam o material”, aconselha Machado.
O melhor material em resistência e durabilidade é o cobre. “Sua vida útil compensa o preço, que chega a ser três vezes maior do que o do alumínio – o mais utilizado, principalmente no litoral, onde os demais metais sofrem corrosão por influência da maresia”, comenta o diretor, acrescentando que o cobre também se faz presente nos projetos em estilo francês, para calhas molduradas e condutores externos, cumprindo ainda o papel de elemento decorativo.
O correto é que o condutor leve a água a uma caixa enterrada de coleta de água pluvial que, através de condutores, despeja o líquido na sarjeta ou na rede públicaLúcio Gomes Machado
Para tubos e condutores, o mais comum é o PVC, com diâmetro de acordo com o projeto. Segundo o arquiteto, normalmente, o material é utilizado na cor branca, porém o ideal para coletores é a tonalidade cinza (série R), por ser mais resistente. O sócio da IDK comenta que a escolha do material é prevista no projeto de arquitetura, que detalha também as dobras das chapas e os ajustes, de acordo com a secção.
“Até porque as bobinas de cobre têm somente 600 mm de largura. Por essa razão e por questões estéticas, os arquitetos optam por condutores tubulares com 100 mm de diâmetro” diz Carvalho. Quando o material é o alumínio, a forma predominante é a retangular, que torna o elemento mais discreto, podendo ser pintado in loco ou na indústria com pintura eletrostática a pó.
O arquiteto observa que, quando o condutor vertical é mal feito, a água coletada é despejada no jardim da casa ou na calçada. “O correto é que o condutor leve a água a uma caixa enterrada de coleta de água pluvial que, através de condutores, despeja o líquido na sarjeta ou na rede pública”, ensina, recomendando o uso de ferro fundido para a tubulação enterrada sob a calçada.
PROJETO E MUITOS CUIDADOS
O sistema de drenagem pluvial será mais ou menos complexo de acordo com a arquitetura. “Alguns são muito simples. Outros, em estilo francês, que têm telhado com declividade e inclinação de 100% ou mais, com mansardas e janelas, apresentam vários encontros de águas, que devem ser resolvidos no projeto do sistema de drenagem”, diz Carvalho.
Assim, a atenção deve ser redobrada nos encontros das águas furtadas (encontro de dois panos de telhado, formando ângulo interno de 90°), no colarinho de chaminés quando encontra com águas furtadas e nas junções de mansardas.
“O projeto deve prever os detalhes de vedação no entorno de janelas de teto, mansardas e chaminés de lareira, entre outros elementos. O encaixe é normalmente feito em chapa ou em fiberglass e faz parte do sistema de rufos”, ensina o arquiteto.
Segundo ele, é essencial estabelecer cálculos precisos entre panos do telhado, secção da calha e secção do condutor. “A calha deve ter uma posição suficientemente bem projetada para que a água se dirija para ela. Ou seja, quando a velocidade da chuva correndo pelo telhado é grande e a calha não está bem posicionada, a água vai saltar esse elemento e extravasar”, explica Machado.
Em projetos que utilizam poucos condutores, é preciso aumentar a secção da calha, de maneira a manter a água dentro dela antes de sua chegada no condutor. “Há casos, também, em que o projeto opta por inclinar a calha para que a água se conduza para o condutor com boa velocidade. Esse caimento deve ser bem projetado para não comprometer a estética da casa”, frisa o arquiteto.
Os formatos mais usados são as calhas tipo molduradas, quando aplicadas externas ou perimetrais no beiral. Ou, ainda, dobradas de acordo com a necessidade quando instaladas atrás de platibandaIsrael Carvalho
Para o dimensionamento dos coletores, há números padronizados. Um telhado com projeção de 75 m² pede condutor de 3 polegadas e o de 100 m² deverá ter 4 polegadas. Machado diz ainda que os cálculos do sistema de drenagem já não podem se basear nas antigas tabelas, em decorrência da atual alteração do regime de chuvas no país.
Segundo ele, o tipo de telha utilizado vai interferir diretamente no sistema de drenagem. “Cada tipologia, como a romana, a colonial, a paulistinha e outras, exige inclinações específicas e há tabelas padronizadas que as definem. A inclinação assegura que a água não volte, por capilaridade, de uma telha para outra, pingando no forro”, destaca o arquiteto.
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DIMENSIONAMENTO
Para dimensionar calhas e coletores, os projetistas dispõem de fórmulas padronizadas. “De acordo com a declividade, área do telhado e contribuição de águas existe um diâmetro apropriado de condutor. Os cálculos vão determinar, ainda, se será utilizado um número maior ou menor de condutores”, afirma Carvalho. A ideia é evitar que, em caso de chuva intensa, a calha funcione como reservatório, mas que ocorra o escoamento rápido através dos condutores.
Os condutores podem ser aparentes ou embutidos. Quando se tem a calha externa, o condutor geralmente acompanha, ficando aparente. Já, no caso da calha embutida, o condutor é projetado para ser instalado internamente na parede que, em seguida, recebe o reboco e acabamentos.
“Existem técnicas para instalação do condutor, de maneira que diante de um possível entupimento e transbordamento, a água não verterá para o interior ou exterior da residência, mas poderá ser represada na subcobertura. Esses condutores são visíveis através da prumada de bocal, por onde desce uma água e, portanto, é possível controlar eventos como esse”, ensina Carvalho, lembrando que o proprietário terá em mãos a cópia do projeto, o que facilita eventual manutenção.
GÁRGULAS E SISTEMA SIFÔNICO
Há casos em que a arquitetura dispensa o uso de coletores. São usadas gárgulas, denominação que se origina nas catedrais medievais, onde a água saía da boca de rostos humanos ou animais esculturados. Hoje, correntes grossas saem diretamente da calha, no telhado ou beiral, a certa distância da parede, conduzindo e reduzindo o impacto da água da chuva até o piso ou para uma caixa de recolhimento.
“Porém, muitos arquitetos descartam essa opção, por considerarem que compromete a estética da construção, especialmente quando se trata de residências de alto padrão”, diz. Machado, porém, ressalta que as gárgulas – muito utilizadas nos projetos de Le Corbusier – representam solução perfeitamente aceitável na arquitetura contemporânea.
Os sistemas de drenagem nos telhados se tornam mais complexos em grandes superfícies, como as dos galpões logísticos e industriais, em decorrência do grande volume de água. É como se água ‘dobrasse’ da calha que é horizontal para o condutor vertical.
“Para que a água não extravase em virtude da circunferência limitadora do condutor, a primeira solução é instalar um funil para aumentar o comprimento da borda do condutor na interface com a calha. A outra, mais complicada, é o sistema de drenagem por sifonação, que funciona como pistão no interior do coletor, sugando a água que está acima, por gravidade”, expõe Lúcio Gomes Machado.
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Colaboração técnica
- Israel Carvalho – Sócio-diretor da IDK Telhados.
- Lúcio Gomes Machado – Possui graduação em Arquitetura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (1969); mestrado (1881) e doutorado (1992) em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (USP). Foi professor doutor do Departamento de História da Arquitetura e Estética do Projeto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP. É sócio-diretor de GMAA – Gomes Machado Arquitetos Associados Ltda e Linha d´Água Difusão Cultural Ltda. No Instituto de Arquitetos do Brasil, foi membro de seu Conselho Nacional; diretor do Departamento de São Paulo, no qual atuou como vice-presidente. Foi coordenador Geral e diretor da seção brasileira do International Working Party For Documentation And Conservation of Buildings. Foi conselheiro do CONPRESP e do CONDEPHAAT. Foi curador da III e da IV Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo. Tem experiência nas áreas de Arquitetura e Urbanismo e de Desenho Industrial, com ênfase em História da Arquitetura e História do Design. Atua profissionalmente nas áreas de Arquitetura e Urbanismo, Desenho Industrial, Programação Visual e Construção Civil, além de Editoração e Preservação do Patrimônio Cultural e Arquitetônico.