Tratamento de água conquista empreendimentos em todo o país
Pluvial ou cinza, a água submetida a tratamento para utilização não potável oferece segurança e economia
Texto: Redação AECweb/e-Construmarket
De histórico relativamente recente no Brasil, os tratamentos de água pluvial e de água cinza para uso não potável comprovaram sua eficiência e segurança, e conquistaram o mercado. Mas nem sempre foi assim: há cerca de dez anos, era tema polêmico entre os especialistas, pois muitos temiam que os tratamentos existentes pudessem produzir água sem controle e contaminar a rede de água potável, além de ser considerado à época caro e inviável.
Hoje, o sistema está presente em todos os segmentos imobiliários, desde empreendimentos de grande porte que conquistaram selos de impacto ambiental até aqueles que desejam economizar água e ter custo menor na conta mensal.
“A obra do edifício Eldorado Business Tower concluída em 2007 em São Paulo foi um importante marco. Desenvolvemos sistemas para uso no canteiro e, depois, para o empreendimento pronto, coletada do lençol freático e da chuva para reaproveitamento nos vasos sanitários do térreo e subsolos, lavagem de pisos das garagens, e para o espelho d’ água”, explica Sibylle Muller, engenheira, mestre, especialista em gestão e tecnologia ambientais e diretora da AcquaBrasilis.
Segundo ela, nos últimos anos, o único avanço efetivo em termos de regulamentação, foi a publicação, em 2007, da ABNT NBR 15527 – Água de chuva – Aproveitamento de coberturas em áreas urbanas para fins não potáveis. O documento estabelece procedimentos para filtração de materiais grosseiros; descarte das águas de escoamento inicial; filtração de materiais particulados finos; e desinfecção. “Os alemães não falam em desinfecção, enquanto nossa norma sim. A razão é simples: em um país tropical, o calor propicia a disseminação de bactérias depositadas nos telhados por aves, por exemplo, e que são carregadas pela água da chuva”, diz a engenheira.
A segurança de que a água pluvial ou cinza tratada alcança os parâmetros normativos para uso é medida por análises químicas. “Recomendamos que o edifício, onde instalamos tratamento de água, faça os exames semanais de teor de pH e cloro, além da exigência de análises periódicas mais abrangentes e apuradas, pelo menos a cada três meses”, diz Sibylle Muller, acrescentando que a norma técnica sugere medição dos seguintes parâmetros da água de chuva tratada:
- coliformes totais – 1 medição semestral – ausência em 100 mL
- coliformes termotolerantes – 1 medição semestral – ausência em 100 mL
- cloro residual livre – 1 medição mensal – 0,5 a 3,0 mg/L
- turbidez – 1 medição mensal – inferior a 2,0 a 5,0 uT, conforme uso
- cor aparente – 1 medição mensal – menor que 15 uH (unidades Hazen)
- pH entre 6 e 8 – 1 medição mensal – para usos em tubulações de aço galvanizado ou aço carbono
Sistemas
De acordo com a engenheira estão disponíveis no país vários sistemas manuais ou automáticos de tratamento, utilizando filtragens distintas:
- filtros de peneira, com furos milimétricos, de acordo com a norma técnica;
- filtros do tipo vórtice, em que a água é impelida por força centrífuga, para as paredes do tubo e os sedimentos são descartados pela parte central da tubulação;
- filtros de areia somado a material filtrante especial;
- filtros de cartucho com materiais de fibra sintética
Recomendamos que o edifício, onde instalamos tratamento de água, faça os exames semanais de teor de pH e cloro, além da exigência de análises periódicas mais abrangentes e apuradas, pelo menos a cada três meses
“Não é possível dizer que existe o sistema ideal, porque isso vai depender do grau de automação e do tratamento desejado, da aplicação a ser dada e da manutenção. Numa residência, o sistema pode ser mais simples, enquanto que nos empreendimentos de grande porte, como shopping center ou edifício corporativo, será um sistema automatizado com retrolavagem, ou seja, um filtro de areia envia a água já limpa para o reservatório de água tratada e o filtro, periodicamente, inverte o fluxo da água e envia os sedimentos que ficam presos no filtro para a galeria de águas pluviais”, ensina. O sistema automático permite uma eficiência melhor porque está permanentemente se autolimpando, independente da manutenção manual.
“O ideal é que o projeto de tratamento seja considerado na fase inicial do empreendimento, principalmente para reuso porque é preciso aproveitar para tratar e reutilizar, separando os resíduos da água que será jogada fora. Essa água tem que circular numa tubulação separada para uma central de tratamento e, depois, se conduzir por uma tubulação específica para aproveitamento”, observa.
O retorno do investimento ocorre num período que varia de um a dois anos, o que vai depender do consumo, do índice pluviométrico e da área de telhado. “Esses fatores são considerados no estudo de viabilidade que fazemos, produzindo simulações antes mesmo de iniciar o projeto. Muitas vezes, esse estudo pode mostrar que o sistema não será viável diante de um telhado pequeno e consumo de água médio ou alto, em relação ao volume que poderia ser captado”, explica Sibylle Muller.
Águas cinzas
Não é possível dizer que existe o sistema ideal, porque isso vai depender do grau de automação e do tratamento desejado, da aplicação a ser dada e da manutenção
As águas cinzas – oriundas do lavatório, chuveiro, máquina e tanque de lavar roupa – apresentam, depois de tratadas, condições similares ao da água pluvial. O sistema é mais utilizado em edifícios residenciais que, pelo volume de água gerada para reuso, o torna viável. “Se compararmos o nível de adesão dos empreendimentos ao tratamento de águas cinzas com o de pluviais, a proporção é de 3 para 10. Isto porque esse é um processo mais caro e, também, porque o mercado desconhece sua eficiência e segurança, e teme que o tratamento resulte numa água mais contaminada – o que não é verdade, desde que se adote uma boa tecnologia”, garante a engenheira.
Para o tratamento de águas cinzas, há duas tecnologias distintas: os processos biológico e físico-químico. No biológico são utilizadas bactérias, normalmente, do próprio efluente para promover a degradação da matéria orgânica, gerando um pequeno lodo que pode ser descartado na rede pública de esgoto. Já o tratamento físico-químico utiliza substância que vai gerar um lodo químico. O resultado é uma água clara, porém sem remover toda a matéria orgânica, o que pode gerar cheiro desagradável e o lodo não deve ser enviado para a rede de esgoto. Seu custo inicial é menor do que o do biológico. “Muitos empreendimentos que optam por essa solução mais econômica, no entanto, acabam tendo problemas e se vêm obrigados a refazer o sistema, substituindo pelo processo biológico”, conclui Sibylle Muller.
Colaborou para esta matéria
- Sibylle Muller – Engenheira civil pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP). Mestre em Engenharia Civil pela Área de Engenharia de Construção Civil e Urbana da Poli-USP. Especialista em “Gestão e tecnologias Ambientais” pelo “Programa de Educação Continuada”, da Poli-USP. Consultora do DGNB (sistema alemão de certificação ambiental) para edifícios administrativos novos, versão 2010 (2013).