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Você sabe quando um edifício é realmente sustentável?

Nem todo prédio é “verde”, mas o mercado imobiliário explora o conceito de sustentabilidade de forma inadequada. Falta de conhecimento do consumidor pesa contra

Publicado em: 06/07/2010Atualizado em: 21/08/2019

Texto: Redação AECweb



A banalização da sustentabilidade

Comprometido pelo marketing excessivo e vazio de conteúdo usado pelo mercado imobiliário, o conceito de sustentabilidade se banalizou e deixou os consumidores desnorteados. “Edifício sustentável é um tema que está muito mal tratado. É marketing gratuito, com gente dizendo que está fazendo muita coisa e, na verdade, não está fazendo nada, é só cosmético. Isso está desorientando o cliente e prejudicando a credibilidade”, alerta o engenheiro Luiz Henrique Ceotto, diretor de Planejamento e Construção da Tishman Speyer. Na outra ponta, empresas que desejam alugar ou comprar um imóvel comercial têm mais clareza sobre as vantagens e como identificar um empreendimento ‘verde’ de fato.

“O edifício comercial é administrado por empresas de grande porte, situação que permite demonstrar mais facilmente ao cliente os benefícios do prédio ‘verde’. Já a gestão do residencial é ainda determinada pelas idiossincrasias do síndico e do conselho, o que torna complexa a tarefa”, comenta, acrescentando que o consumidor só estará disposto a pagar mais caro se, comprovadamente, o edifício apresentar tais vantagens. “Na área imobiliária, o marketing é tão desprendido da realidade que não há confiabilidade: pintou o prédio de verde e plantou uma árvore, então é green building. O cliente é bombardeado com slogans que nada significam e as pessoas acabam não acreditando. É o mesmo da propaganda de apartamentinho de péssima qualidade que ganha o slogan ‘alto padrão’. É um jogo de palavras”, desabafa.

Por outro lado, o brasileiro não tem conhecimento e critério para identificar o que é sustentável. E tudo isso pode ser agravado se o residencial se sofisticar muito para fazer economias importantes durante o uso, pois não terá profissionais para gerenciar a operação. “Na melhor das hipóteses, há o risco de comprometer o ganho energético e de água para o qual foi projetado e executado”, observa.

‘VERDE’ NA ESSÊNCIA

“O consumidor, na hora da escolha, busca um conjunto de características que o agradem. A sustentabilidade é um desses fatores. Ela é uma parte do todo que abrange a localização, a qualidade do projeto, o custo do imóvel, o preço de condomínio, entre outros itens”, assegura o engenheiro Sérgio Vieira, diretor de Novos Negócios da Espírito Santo Property Brasil, empresa que recentemente se associou ao empreendimento Pedra Branca, bairro sustentável que nasce na região metropolitana de Florianópolis. Ele lembra que o conceito da sustentabilidade ainda é muito novo e está começando a ganhar o mercado brasileiro agora. “Muitos consumidores ainda não sabem dessa possibilidade de escolha”, diz.

Vieira ressalta que os prédios corporativos já vêm buscando, há algum tempo, incorporar os conceitos de sustentabilidade, como o da redução do uso dos recursos naturais e do gasto energético em suas estruturas. “Mas, no segmento residencial, o Pedra Branca é pioneiro. É o único empreendimento dessa escala que consegue reunir, em profundidade, todos os princípios da sustentabilidade, aliando a isso o conceito do novo urbanismo. A ousadia desse empreendimento chama atenção das pessoas”, afirma.

E chamou a atenção dos que fecharam negócio: superando todas as expectativas, 70% dos apartamentos da primeira quadra do bairro Pedra Branca, lançada em 15 de maio último, foram vendidos em menos de um mês. “O fato de o bairro ser sustentável não repercute nos preços dos imóveis, o que contribuiu, sobremaneira, para o sucesso nas vendas. Por outro lado, os custos do condomínio também serão de 20% a 30% mais baixos, se comparados aos dos edifícios de construção convencional. A longo prazo, essa economia é extraordinária. Sem contar economias paralelas, com combustível e tempo, por exemplo, que a infraestrutura do bairro oferece. Aos poucos, o público vai reconhecendo que a sustentabilidade é o caminho. Isso nos motiva a continuar trabalhando com esse tipo de empreendimento, e nosso sucesso estimula outros a fazerem a mesma coisa”, complementa o engenheiro.

COMMODITIES CARAS

Segundo Luiz Henrique Ceotto, o sucesso dos empreendimentos operados pela Tishmann – o Rochaverá, em São Paulo, que já vai para a sua quarta torre, e o Ventura, no Rio de Janeiro -, se deve à cultura das corporações multinacionais ou grandes empresas brasileiras. “Elas têm uma política interna de sustentabilidade, e suas opções são guiadas pela imagem de estarem sediadas num prédio certificado e, depois, pela economia que terão no condomínio. São dois conceitos aliados: o ético e o empresarial”, ensina. Ele descarta, porém, a hipótese de que o selo ‘verde’ seja uma garantia de comercialização rápida: “É um atrativo, uma chancela da economia que será feita na operação do prédio. Mas, principalmente, se alia à imagem que a empresa quer projetar no mercado”.

A tendência, na opinião do diretor da Tishmann, é que a sustentabilidade migre, gradativamente, da ética para a economia, porque as commodities – energia e água - estão muito caras e ficarão ainda mais. Ele prevê que dentro de cinco a dez anos, os edifícios no Brasil passarão a ter cotas anuais de fornecimento: cotas máximas que os prédios poderão consumir por ano de energia e de água. E isto vai viabilizar os prédios mais econômicos. “Porque o risco de ter que parar um prédio ou que a operação fique astronomicamente cara, levará as empresas a optarem por edifícios de baixo risco operacional”, antecipa. A economia de cerca de 30% em energia e água, comum aos edifícios ‘verdes’, pode fazer pouca diferença hoje, mas fará a diferença entre ficar no escuro ou estar de acordo com um consumo ideal.

“No momento em que a sustentabilidade abranger, além do campo puramente ético, também o econômico, vai automaticamente disciplinar o mercado imobiliário. O mercado terá então especialistas para testar a eficiência energética de edifícios e, se alguém vender que o edifício é eficiente e não for, terá problema legal. A jurisprudência vai começar a se aprimorar, de tal forma que o marketing deixe de ser inconseqüente como é hoje. Muita coisa vai mudar em até dez anos, as empresas éticas do mercado imobiliário vão chegar primeiro, e as outras, ou vão quebrar ou passar por um ajuste doloroso”, preconiza Ceotto.

COLABORARAM PARA ESTA MATÉRIA

A banalização da sustentabilidade Luiz Henrique Ceotto - Graduado em Engenharia Civil pela Universidade de Brasília, com Mestrado em Engenharia de Estruturas pela Escola de Engenharia de São Carlos – USP. É diretor de Planejamento e Construção da Tishman Speyer Properties. Membro do Comitê de Tecnologia e Qualidade do Sinduscon-SP e do Conselho Deliberativo do CBCS. Professor convidado do curso de Mestrado Profissional em Engenharia de Edificações da Escola Politécnica da USP.

A banalização da sustentabilidade Sergio Luiz dos Santos Vieira - Diretor de Novos Negócios da Espírito Santo Property Brasil, é engenheiro de produção. Atua na área de desenvolvimento imobiliário desde 1974, principalmente nos segmentos de padrão alto e médio-alto. Atua ou atuou nas principais entidades de classe do setor, Secovi-SP,  Fiabci/Brasil e CIC/FIESP – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.