Borges vai recriar o CB-02
Carlos Alberto de Moraes Borges, diretor da Tarjab e conselheiro do SindusCon-SP, é o novo superintendente do CB-02 – Comitê Brasileiro da Construção Civil da ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. Eleito com o apoio de entidades do setor ao seu projeto inédito de reestruturação do comitê, Borges quer criar um mutirão para analisar a necessidade de atualização das mais 900 normas técnicas vigentes. Falando ao AECweb, ele conta seus planos e aborda o atual momento.
AECweb - O seu projeto é renovar o comitê?
Borges - Mais do renovar, pretendo criar o comitê. A ABNT regula a elaboração de normas em todo o país, mas não fornece recursos para seus comitês. Como a construção civil é uma atividade bastante complexa e o escopo de atuação do CB-02 é muito amplo, acredito na importância da criação de um conselho gestor que estabeleça prioridades em conjunto para as futuras normas a serem produzidas.
AECweb - O CB-02 dispõe de uma estrutura interna?
Borges - Hoje, conta apenas com uma secretária e um assessor. Ou seja, não existe uma estrutura suficiente para atender a demanda. Precisaremos criar uma estrutura administrativa e processual. O que vai exigir recursos que virão das entidades do setor, como Anfacer (cerâmica), Instituto Brasileiro de Siderurgia (aço), Abrafati (tintas), Asfamas (materiais de saneamento) e ABCP (cimento) que já manifestaram apoio ao projeto.
AECweb - Quais são as etapas dessa estruturação?
Borges - Faremos um projeto de curto, médio e longo prazos; criaremos um conselho para o estabelecimento das prioridades; implantaremos um modelo de gestão diferente do atual; e, aí, sim conseguiremos os recursos para a estrutura. O objetivo é aumentar a produção de novas normas e, ainda, fazer um mutirão para atualizar as existentes.
AECweb - Quais as tarefas desse mutirão?
Borges - A idéia é que os próprios sub-setores se organizem para atualizar e eliminar discrepâncias nas normas atuais. O setor da construção civil tem, hoje, mais de 900 normas técnicas, sendo que 85% delas estão há mais de cinco anos sem revisão. A evolução dos conhecimentos e tecnologias obriga a revisão freqüente das normas. Aquelas que dispensarem atualização, precisam, pelo menos, serem revalidadas. Há outras que são contraditórias entre si – ou do mesmo sub-setor ou de sub-setores que interagem. Essas discrepâncias são utilizadas como argumentos daqueles que não querem cumprir norma.
AECweb - A expectativa é de forte envolvimento de todos?
Borges - É claro que a idéia é simples, mas difícil de ser aplicada, porque temos entidades com mais cultura de normatização e estão com suas normas atualizadas, e há outras que não valorizam isso. Não existe forma de melhorar a qualidade sem um arcabouço normativo forte. A chave do êxito é se fazer um projeto razoavelmente consensual, que tenha credibilidade e estimule as empresas, através das entidades, a aplicarem recursos. É um grande desafio!
AECweb – Essa é, portanto, uma guinada política no CB-02?
Borges - Semm dúvida, e para a qual conto, também, com o apoio da própria ABNT. O caminho futuro do comitê é ser profissionalizado e atuar no estímulo da normatização do setor. Isto já foi feito em outros setores, como o CB-03, de elétrica, que melhorou significativamente o nível de normatização com a contratação de um secretário-executivo. Com uma estrutura pequena é possível fazer muito. Diferentemente de setores industriais, a construção civil não tem uma cultura de cumprimento de normas. Ao contrário, temos uma informalidade muito grande e, mesmo nas faculdades de engenharia não há formação nesse sentido. Temos que gerar esse conhecimento, afinal, norma não é um problema, mas uma oportunidade que protege o setor formal, e é indutor de qualidade. E toda a empresa séria e formal deveria defender normas.
AECweb – Sua eleição surgiu do trabalho que realizou na coordenação do grupo da Norma de Desempenho das Edificações?
Borges - Exatamente. Concluímos o trabalho da norma em maio de 2008 e ela estará em vigor a partir de maio de 2010, portanto, temos dois anos de carência. No ano passado, o SindusCon me convidou e eu não aceitei disputar o cargo de superintendente do CB-02, por estar ainda coordenando o grupo de trabalho e terminando o mestrado em Gestão e Tecnologia na POLI/USP. Ao mesmo tempo, por questões internas da ABNT o mandato dos superintendentes foi prorrogado por um ano. Fui indicado novamente, como candidato do SindusCon, acabei aceitando e fui candidato único.
AECweb – Como está a aceitação da Norma de Desempenho das Edificações?
Borges - Ainda tem quem questione a existência da norma. Alguns construtores não têm interesse, pois acreditam que norma aumenta custo e controle. Mas está mudando. Temos um terreno fértil para evoluir, mas de maneira ainda incipiente. Há empresas se preparando para cumprir a norma, enquanto outras nem sabem que ela existe. Fizemos um seminário em dezembro, com 300 pessoa, e acho que foi bom.
AECweb – Qual a sua percepção do mercado hoje?
Borges - Todas as pessoas do Planeta foram afetadas pela crise. A situação particular do Brasil é mais favorável do que a dos demais países. E a da construção civil em relação a outras atividades econômicas é boa, pois é considerada chave pelo governo no combate a crise, como geradora de empregos.
AECweb – E a situação da Tarjab?
Borges - A Tarjab completou 25 anos em 2008. É uma empresa de médio porte, produz apartamentos de médio e alto padrão, e não abriu capital na Bolsa. Tem uma característica de não crescer muito em época de euforia, e nem baixar em época de crise. É um crescimento linear, constante e estável. Não adquirimos nenhum terreno de maneira especulativa, pagando mais do que o valor real; nem fizemos uma contratação enorme para crescer, de forma que não demitimos agora. Estamos vendendo normalmente: o melhor ano de 2008 para nós foi dezembro, quando vendemos 60 apartamentos.
AECweb – Então não há crise?
Borges - Isso não significa que não haja crise no setor. Ela aparece na questão do crédito em que os bancos estão sendo muito mais rigorosos com as construtoras, exigindo maiores percentuais de vendas e de obra executada para liberação de financiamento. Exemplos: antes liberavam o dinheiro quando a construtora tinha vendido 20% do empreendimento, hoje só quando atinge 45%; o percentual, antes, era de 15% de obra executada contra os 30% atuais. Com isso, diminui a capacidade de as empresas atuarem no mercado com a mesma ênfase de 2008/2007.
AECweb – E como fica a concorrência?
Borges - A partir de 2007, houve um descolamento do custo real da obra em relação aos índices de inflação, o que tende a se reverter agora. Estamos percebendo que muitas empresas, principalmente as grandes, estão ‘queimando’ seus estoques, que estão altos. O que se traduz em concorrência predatória. Para enfrentar, estamos racionalizando custos, agindo com a cautela de lançar prédio com financiamento garantido, e sempre honrando os compromissos assumidos com os clientes. Por outro lado, constatamos que já se normalizou o fornecimento e, mesmo, a falta de mão-de-obra. Hoje, só tenho dificuldade de encontrar carpinteiro, porque ainda há muitas obras em fase de execução.
AECweb – O segmento de imóveis populares é um bom negócio hoje?
Borges - É um bom negócio, mas prescinde de juros mais baixos, de elevado volume de produção, de uma linha industrial de construção, e de grande controle de custos, já que a margem é pequena. É viável, mas exige uma visão de longo prazo. Se eu quiser entrar no segmento, terei que abrir uma outra empresa, pois a Tarjab não está preparada. Muitas empresas que, no passado, tentaram o segmento se deram mal. Tem poucas construtoras no mercado capacitadas para atingir essa demanda.
Redação AECweb