Concessão do Maracanã devolverá menos de 30% do que foi investido na reforma
Texto: Redação AECweb/e-Construmarket
A minuta do edital foi divulgada nesta segunda-feira. Parque Aquático Júlio Delamare e o Estádio Célio de Barros serão demolidos
23 de outubro de 2012 - Reformado por R$ 10 milhões (valores da época) para receber as provas de polo aquático do Pan de 2007, o Parque Aquático Júlio Delamare será demolido, juntamente com o Estádio de Atletismo Célio de Barros. Os dois equipamentos esportivos, que hoje integram o complexo esportivo do Maracanã, serão reconstruídos num terreno em São Cristóvão, segundo a minuta do edital de concessão divulgado nesta segunda-feira. O bota-abaixo faz parte da engenharia financeira encontrada pelo governo do estado para transformar o Maracanã e o Maracanãzinho num negócio mais atraente para investidores privados, que vão explorar a área por 35 anos.
Apesar de o estado já estar investindo R$ 859,9 milhões no Maracanã, o vencedor da concorrência ainda terá que gastar mais R$ 469,4 milhões para tornar o espaço uma opção de lazer mais atraente, sem depender tanto das receitas do futebol. Na conta, estão ainda a demolição e o reassentamento do Célio de Barros e do Júlio Delamare em São Cristóvão, com a construção, no espaço que ficará vago no Maracanã, de bares, restaurante, dois estacionamentos com duas mil vagas e heliponto, que vão gerar rendimentos para a concessionária.
Ginásio terá menos lugares
A empresa ainda terá que fazer melhorias na drenagem interna do Maracanã, para evitar enchentes, e fazer reformas no Maracanãzinho, que já passou por uma recuperação de R$ 92 milhões para o Pan. Para receber o vôlei nas Olimpíadas de 2016, o ginásio terá novamente as arquibancadas, que passarão a ser retráteis, reformadas. Com isso, a capacidade do ginásio vai encolher de 11.424 para 9.914 lugares. Como o projeto olímpico prevê a construção de duas quadras de aquecimento, a Escola Municipal Friedenreich, que funciona no complexo, será transferida para um local ainda não escolhido.
Apesar das despesas, em 35 anos, o concessionário deve chegar a uma receita de mais de R$ 2 bilhões, descontados os investimentos. Mas o estado verá só uma pequena parcela desse dinheiro, que nem pagará as obras em andamento. O valor da outorga anual previsto no edital é de R$ 7 milhões, a serem quitados em 33 parcelas anuais, com dois anos de carência. Ou seja: o governo estadual receberá apenas R$ 231 milhões passados os 35 anos, ou 26,86% do total investido, caso a concessão ocorra pelo valor mínimo.
— Quando nós começamos a estudar a concessão do Maracanã, em 2008, pensávamos em transferir à iniciativa privada os custos de fazer a reforma completa. Mas a conta não fechava, devido ao elevado nível de gastos para prepará-lo para os megaeventos. E mais investimentos privados serão necessários nos próximos dois anos no complexo — disse o secretário-chefe da Casa Civil, Regis Fichtner.
Ele confirmou que o antigo prédio do Museu do Índio será demolido. A tarefa também caberá à concessionária. Segundo Fichtner, o objetivo é atender à exigência da Fifa de fazer melhorias na circulação no entorno do Maracanã, para garantir que o estádio seja esvaziado em oito minutos no caso de emergências.
Clubes ficarão de fora
De acordo com a minuta do edital, nenhum clube de futebol terá exclusividade pelo uso do espaço. Para atender a esse item, não poderão participar da concorrência clubes ou grupos que tenham vínculos com eles. Além disso, para manter o estádio com a vocação de “templo mundial do futebol”, não poderá haver símbolos de qualquer clube no Maracanã.
Segundo o secretário, as atuais instalações do Parque Aquático Júlio Delamare e o Estádio Célio de Barros só serão demolidas quando as novas ficarem prontas. O edital, no entanto, não deixa isso claro: informa que caberá aos concorrentes elaborar um plano de trabalho com prazos para a execução de todos os projetos.
O parque aquático e o estádio de atletismo eram tombados desde 2002 por decreto do ex-prefeito Cesar Maia. Para viabilizar a concessão, o ato foi revogado na segunda pelo prefeito Eduardo Paes. O terreno onde os dois serão reconstruídos fica próximo às chamadas cocheiras do Imperador, que recentemente foram motivo de polêmica, já que a prefeitura planejava sua demolição para obras de reurbanização visando às Olimpíadas. Nesta segunda-feira, o município informou que o projeto foi revisto e as cocheiras — marco histórico da história do Império no Brasil — serão mantidas.
Um dos grupos que devem participar da concorrência é o IMX, do empresário Eike Batista. A empresa foi responsável por contratar os estudos de viabilidade, ao custo de R$ 2,3 milhões, que serviram de base para elaborar o edital. A audiência pública para a apresentação oficial do edital será no dia 8 de novembro, às 18h, na sede do Galpão da Cidadania, na Rua Barão de Teffé, na Gamboa. Com base nos resultados da audiência, o edital ainda poderá sofrer alterações. A data da licitação ainda não está marcada.
Maracanãzinho pode mudar de nome
A minuta prevê ainda que o concessionário será obrigado a manter o nome do estádio. Já o Maracanãzinho poderá ter o nome alterado, para a geração de receitas.
A ideia é que o novo operador assuma o complexo do Maracanã antes da Copa das Confederações, prevista para junho de 2013. A concorrência abre a possibilidade de participação de empresas estrangeiras. O edital leva em conta não apenas o preço da outorga, mas também a experiência na gestão e na operação de complexos de entretenimento.
Confederações são apanhadas de surpresa
As confederações brasileiras de Desportos Aquáticos (CBDA) e de Atletismo (CBAt) desconheciam os detalhes sobre a demolição do Parque Aquático Júlio Delamare e do Estádio Célio de Barros, na minuta do edital de concessão do Maracanã à iniciativa privada.
Presidente da CBAt, Roberto Gesta de Melo soube da demolição do estádio pelos jornais. Segundo ele, não basta prometer que um outro espaço será construído antes da demolição do antigo. É preciso que isso esteja escrito no contrato e com data para concluir a obra.
Na minuta do edital, é transferida à empresa privada que ganhar a concorrência a responsabilidade de construção do novo estádio. O documento, no entanto, não estipula um prazo para que tudo fique pronto.
Como responsável maior pelo atletismo no país, Gesta acredita que deveria ter sido ao menos consultado sobre a demolição do estádio. Em 2007, ano do Pan, a CBAt também não foi consultada sobre a concessão do Engenhão — que também é um estádio de atletismo e foi construído com dinheiro público — ao Botafogo.
Com duas medalhas olímpicas no currículo e dono da melhor marca já feita nos 100m rasos no Célio de Barros, Robson Caetano faz coro com o presidente da CBAt.
— É uma atrocidade destruir o Célio de Barros sem antes construir um outro estádio melhor. Pior ainda é não consultar os atletas sobre essa possibilidade — disse Robson.
A CBDA disse que vai analisar melhor a minuta do edital, no que diz respeito à demolição do parque Júlio Delamare, antes de divulgar uma nota oficial. (Victor Costa)
Fonte: O Globo