Disputa por profissionais perde força
Para muitas empresas, a crise da escassez de mão de obra dá claros indícios de arrefecimento
08 de julho de 2011 - A euforia da contratação de mão de obra na construção civil começa a dar os primeiros sinais de trégua - depois de 18 meses de falta contínua de profissionais em todos os níveis. Embora ainda não haja nenhum indicador oficial que confirme ou aponte queda nas contratações, para muitas empresas, a crise da escassez de mão de obra dá claros indícios de arrefecimento. Uma resposta à desaceleração do setor imobiliário no segundo trimestre de 2011.
É consenso que, sobretudo nos níveis mais elevados, a dança das cadeiras que tomou conta do mercado durante 2010 está no fim. O que é considerado positivo porque havia exageros e distorções salariais consideradas absurdas - um verdadeiro surto, para muitos. "Engenheiros com poucos anos de formado estavam sendo chamados para ocupar diretorias com salários três a quatro vezes mais altos que o padrão", afirma um executivo do setor. "A euforia acabou e, inclusive, alguns desses profissionais contratados a peso de ouro já estão sendo liberados", completa.
Seja qual for a obra - de uma simples casa a uma fábrica ou shopping - o mercado imobiliário compete pelos mesmos recursos humanos. As empresas especializadas em obras privadas de maior porte, como shoppings, hospitais e condomínios industriais, já sentem menor pressão, principalmente vinda das construções residenciais. Marcos Santoro, vice-presidente da Racional Engenharia, empresa especializada em construções de shoppings, hospitais e prédios corporativos, afirma que o mercado esteve muito "nervoso" entre o segundo semestre do ano passado e abril deste ano. "Havia um assédio muito agressivo em relação a engenheiros de todos os níveis, gerente de obras e mestre de obras", afirma. "Não há retração, mas uma desaceleração, sem dúvida, a disputa atenuou."
Juan Quirós, presidente da Serpal, outra companhia especializada na construção de fábricas, acredita que haja uma reorganização das empresas que atuam no setor imobiliário. "Há uma diminuição do ritmo que já começa a se refletir na mão de obra", afirma. Adalberto Bueno Netto, sócio da Bueno Netto, empresa que incorpora e constrói obras próprias e para terceiros, tem a mesma percepção. "A grande crise de mão de obra começa a passar", diz. "O quadro está revertendo e, em algumas obras, os funcionários estão sendo dispensados, o que não acontecia antes."
Para os trabalhadores, a demanda exagerada e falta de oferta proporcional foi muito positiva. Em vários sentidos. Os salários aumentaram consideravelmente - e chegaram a causar inflação no setor - e o número de contratações também. O INCC subiu 13,81% nos últimos 18 meses. Em 2005, havia 1,7 milhão de trabalhadores na construção com carteira assinada. Atualmente, são 3 milhões. Dados do Sinduscon mostram que no primeiro quadrimestre, houve aumento de 4,43% nas contratações ou 125 mil profissionais. Para Haruo Ishikawa, vice-presidente de Relações Capital-Trabalho do Sinduscon-SP, o que faltam são profissionais qualificados.
"Hoje os canteiros são repletos de carros e motos, o mercado mudou completamente nos últimos anos", afirma Rubens Menin, presidente da MRV, empresa especializada em construção popular. "O aumento de salário do pessoal de obra nos últimos 12 meses foi da ordem de 150%", diz. Menin defende que o mercado continua aquecido e a procura por mão de obra, também.
A Direcional Engenharia, que tambem atua na construção popular e tem 11 mil funcionários contratados, também diz que a procura por mão de obra de canteiro se mantém elevada. "Continua muito difícil, especialmente em regiões mais distantes", diz Roberto Senna, diretor-superintendente da Direcional. A companhia já divulgou prévia de vendas no segundo trimestre e registrou alta de 28% em relação ao mesmo período de 2010 e queda de 2% na comparação com o primeiro trimestre deste ano. "Mas no nível estratégico, acabou aquela euforia e o roubo de profissionais."
Na avaliação de um diretor de uma companhia aberta, a situação já foi mais crítica. "As contratações voltaram à normalidade", diz. "A velocidade de vendas no segundo trimestre caiu sim, está mais difícil vender imóveis caros em regiões nobres", admite.
O fato de as obras de infraestrutura ainda não terem começado, de verdade, contribui para esse cenário. No entanto, as empresas acreditam que a situação pode piorar novamente quando os projetos saírem do papel. E já existem casos concretos nesse sentido. Em Porto Velho, por exemplo, onde estão sendo erguidas as hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, o dissídio da construção civil foi de 37% em 2009, 34% em 2010 e 10% em 2011. A Direcional tem sete projetos em Porto Velho. "Temos 300 funcionários alojados, porque não encontramos mão de obra local", diz Senna.
Fonte: Valor Econômico - SP