Grandes construtoras perdem espaço para médias empresas
Novos modelos de licitação em voga nos governos têm sido vencidos principalmente pelas chamadas empresas "médias" ou "emergentes"
30 de março de 2012 - A disputa pela concessão de Viracopos entre o consórcio Novas Rotas, liderado por Odebrecht, e o Aeroportos Brasil — formado pelas empresas Triunfo, Egis e UTC Participações — não é uma batalha isolada do contexto atual de competição no setor da construção civil. Revela um embate crescente entre empreiteiras de grande porte — como a gigante Odebrecht — para se manter como líderes e outras emergentes, como a Triunfo, em um mercado com cada vez mais participantes competitivos.
A supremacia das quatro gigantes do setor — Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão, Odebrecht e Camargo Corrêa — está sob ameaça. Novos modelos de licitação em voga nos governos, como as concessões de serviços e Parcerias Público-Privadas (PPPs), têm sido vencidos principalmente pelas chamadas empresas "médias" ou "emergentes", que ganham participação cada vez maior no setor.
O bom momento da construção no Brasil faz com que todas cresçam, em termos de faturamento, mas um levantamento feito a partir de dados da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) e da revista especializada "O Empreiteiro" mostra que a participação das grandes, entre as 30 maiores, caiu de 50% em 2005 para 39% em 2010.
Grande parte do sucesso das médias empresas deve-se à criatividade perante às possibilidades que se abrem em uma concessão ou PPP, avaliam participantes do setor. Em grandes usinas hidrelétricas, por exemplo, não se licita mais a obra, mas a entrega de energia no futuro. Isso deixa os grupos livres para planejar a execução.
No caso do leilão dos aeroportos, ocorrido no mês passado, uma pessoa envolvida com os projetos diz que pode ousar mais o consórcio que melhor calculou retornos na exploração do espaço entre o check in e o embarque, de alta rentabilidade. Isso não tem a ver com economia na obra, o que grandes empresas sabem fazer, mas com retorno em serviços.
O presidente do conselho do grupo Galvão, Dario Galvão, explica como isso ocorre na prática. A empresa saltou da décima quinta colocação no ranking do setor em 2006 para a sétima em 2010 investindo fortemente em PPPs. A receita pulou de R$ 270 milhões em 2005 para R$ 2,4 bilhões em 2010.
Ele conta que o estádio do Castelão, em Fortaleza, é um exemplo de PPP em que novas estratégias reduziram custos e tempo de construção. Houve adaptação, por exemplo, no modo de instalação do anel inferior da arquibancada desde a concepção original, o que pode antecipar a data de entrega.
— Os modelos de concessão e de PPPs criam oportunidades para novos entrantes. Nas PPPs, aplicamos mais a inteligência do que a engenharia — diz Galvão.
Nos últimos leilões de concessões, entre os principais vencedores estavam essas empresas médias, que ganharam cacife por meio de parcerias com grupos estrangeiros e fundos de investimentos que investem no Brasil de olho nas oportunidades do país. O leilão dos aeroportos teve ágio de quase 700%, assim como a concessão da BR-153, que também teve ágio alto: 63,5%.
Para o próximo leilão da rodovia BR-040, já são esperados dez grupos na disputa. Surpresas também têm surgido nas PPPs. Poucos no setor esperavam, por exemplo, que no estado da Andrade Gutierrez as emergentes Egesa, HAP e Construcap levariam a PPP do Mineirão. O leilão do ano passado não teve sequer concorrente.
A competição já é a segunda maior fonte de preocupações dos empresários do setor de construção civil, segundo sondagem da FGV, perdendo apenas para problemas relacionados à falta de mão-de-obra no setor.
Não só as médias empresas no país crescem, mas também estrangeiras têm chegado ao país com frequência cada vez maior, sozinhas ou como sócias em grupos brasileiros. É o caso da espanhola Isolux.
João Nogueira, presidente do Conselho de Administração da Isolux Infrastructure, diz que a estabilização política e econômica no país atrai novos investidores:
— A infraestrutura no país está atrasada, daí a necessidade natural de aumentar o número de jogadores. Os antigos não têm capacidade de fazer tudo sozinhos.
Para não ficar atrás, as grandes têm utilizado a estratégia de entrar nos consórcios a posteriori, como aconteceu no caso da usina hidrelétrica de Belo Monte. Ou seja, não se arriscam nos lances mais agressivos, mas acabam entrando quando as contas já estão feitas e os riscos são menores.
Nos bastidores, se queixam das regras das licitações e dizem que o governo pode pagar caro lá na frente. Avaliam que as empresas menores podem não ter fôlego para entregar as obras ou experiência para operar as concessões.
Engana-se, porém, quem avalia que a ascensão das empreiteiras emergentes contraria o interesse do governo federal, acostumado a lidar com as grandes. A maioria dessas médias também mantêm diálogo constante com o Palácio do Planalto, que tem como meta clara estimular a concorrência no setor: para lucrar mais com outorgas ou conseguir tarifas menores aos consumidores.
Acostumado a lidar com empreiteiras em diferentes projetos de infraestrutura, Carlos Alberto Caser, presidente da Funcef, vê com bons olhos essa competição no setor. Para ele, há espaço para todos, dada à forte demanda por obras no país, mas ele faz ressalvas à competição:
— As grandes sempre vão permanecer e pegar obras de acordo com o porte delas. Você não pode pegar uma empresa muito pequena para tocar Belo Monte.
Para alguns observadores do setor, isso ocorreu no leilão dos aeroportos de Guarulhos, Viracopos e Brasília:
— É impossível que só esses grupos tenham notado possibilidade de ganhos tão alta, diferentemente de outros que estão entre os maiores do mundo e têm mais experência — diz um especialista.
Até mesmo uma das novatas no país, a Isolux, reconhece que o governo precisa estar atento e impor certas regras que evitem a ação de aventureiros.
— A Isolux mantém planos ambiciosos, mas não pretendemos fazer loucuras. A nossa perspectiva é agregar valor para o acionista e não perder valor — diz Nogueira.
Fonte: O Globo