Mercado imobiliário precisa de novo modelo de financiamento
Se não tiver novas fontes de recursos, construção de imóveis corre o risco de perder sustentação até 2013
28 de fevereiro de 2011 - Impulsionado por bons ventos soprados pelo crescimento econômico e da renda e pela maior oferta de emprego, o mercado imobiliário corre o risco de perder sustentação até o final de 2013. Esse é o prazo estimado pelo presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (SindusCon -SP), Sérgio Watanabe, para que o modelo atual de financiamento - que utiliza 65% dos recursos da poupança - se esgote.
Embora um estudo da FGV projete a necessidade de construir 23 milhões de moradias nos próximos 12 anos, o alerta preocupa. "É necessário trabalhar agora em iniciativas que tragam alternativas ao modelo atual", adverte o diretor de crédito imobiliário do banco Santander, José Roberto Machado. "As empresas do setor deverão buscar também outras formas de financiamento, com recursos provenientes do mercado de capitais e da securitização de seus recebíveis", afirma.
Hoje, as principais fontes de recursos para o crédito imobiliário no Brasil são a poupança, através do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), e o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). De acordo com o presidente do SindusCon-SP, em 2010, a Caixa Econômica Federal (CEF) emprestou R$ 75,9 bilhões para a habitação, num crescimento de 61,4% em comparação com 2009. Somente os recursos da poupança destinados pela Caixa e pelas demais entidades de crédito imobiliário somaram R$ 56 bilhões, 65% a mais do que no período anterior.
As opções mais consistentes apontadas pelo mercado para enfrentar a escassez de recursos são as Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) - aplicações destinadas à pessoa jurídica oferecidas por instituições bancárias médias ou grandes para o financiamento de imóveis. "A tendência desses dois produtos é crescer", afirma Frederico de Souza Lima, sócio-gestor da Angá Asset Management.
Para Sergio Watanade, a securitização - isto é, a venda de carteiras para fundos - já começa a ser preparada pelo mercado financeiro de crédito imobiliário. Para ele, a forma de captação mais promissora e provável a médio prazo é a venda de uma carteira de recebíveis a um investidor institucional brasileiro ou do exterior, garantindo assim os recursos para construção do imóvel. A securitização nada mais é do que o processo de "empacotar" uma variedade de ativos financeiros ou não-financeiros na forma de títulos que podem ser vendidos em mercado secundário para investidores, via CRI - o principal título de securities imobiliários.
A própria CEF - que em nota oficial afirmou no ano passado "não estar enfrentando dificuldade de funding para dar vazão à atual demanda por crédito imobiliário" - se propôs a testar a venda de CRI em suas agências, num total entre R$ 300 a R$ 400 milhões para avaliação da aceitação do mercado. Aproximadamente R$ 20 milhões já estariam prontos para uma securitização, com nível de padrão de contratos semelhante e taxas de juros compatíveis com o mercado.
Segundo o Anuário Imobiliário 2010 da Uqbar Educação e Informação Financeira Avançada, empresa especializada em finanças estruturadas, os recursos provenientes do FGTS para o crédito imobiliário saltaram de R$ 16 bilhões, em 2009, para R$ 27,5 bilhões, em dezembro de 2010 - um crescimento de 72% e bem superior à expansão de 47% registrada no exercício anterior. O total de unidades financiadas aumentou de 424.519, em 2009, para 660.052 em 2010. O volume de recursos vinculados ao SBPE subiu de R$ 34 bilhões para R$ 56 bilhões, na comparação 2009/2010. Os repasses do governo, por sua vez, somaram R$ 48,5 bilhões no ano passado, ante R$ 33,5 bilhões em 2009.
Ainda segundo a Uqbar, em 2010 o crédito imobiliário securitizado via CRI registrou aumento significativo - de R$ 3,8 bilhões para R$ 8,53 bilhões numa elevação de mais de 50%. O crédito corporativo absorveu a maior parte dos recursos securitizados anuais disponíveis: R$ 7,24 bilhões, destinados ao financiamento de imóveis industriais ou comerciais para grandes empresas, ante R$ 1,28 bilhão dos fundos previstos para o crédito residencial.
A captação de recursos via Letra de Crédito Imobiliário (LCI) saltou de R$ 26,2 milhões, em 2009, para R$ 39 milhões em 2010. Paralelamente, o montante em estoque de LCI na CETIP praticamente dobrou entre 2009 e 2010, passando de R$ 15,5 bilhões para R$ 29,2 bilhões.
Para Machado, do Santander, por mais que a securitização de recebíveis imobiliários seja o caminho a ser seguido e incentivado, nem tudo parece resolvido para o setor financeiro. É preciso encontrar o equilíbrio entre indexadores e prazos ao longo de toda a cadeia. "Hoje existem descasamentos estruturais", afirma. O funding do setor, em sua maioria é indexado à TR, enquanto a demanda dos investidores, é por ativos indexados à inflação, o que torna mais complexa a operacionalização.
Fonte: Valor Econômico