Mesmo que não for construído, trem-bala custará R$ 1 bi até 2014
Texto: Redação AECweb/e-Construmarket
Adiado por um ano, esses custos se referem ao projeto executivo da obra
14 de agosto de 2013 - Com o adiamento do leilão por pelo menos um ano, o Trem de Alta Velocidade (TAV) deixou de ser prioridade do governo, mas mesmo que não saia do papel vai custar até o fim do mandato da presidente Dilma Rousseff pelo menos R$ 1 bilhão aos cofres públicos. O cálculo considera o que já foi gasto até o momento com os estudos de viabilidade econômica do empreendimento, contratação de consultoria, entre outras despesas, e a estimativa de gasto da Empresa de Planejamento e Logística (EPL) com o projeto executivo do trem-bala, que tem prazo até dezembro de 2014 para ser concluído. O empreendimento liga Rio a São Paulo e Campinas. O presidente da EPL, Bernardo Figueiredo, informou ao GLOBO que o custo total do projeto executivo é de R$ 900 milhões.
— O impacto do adiamento (do leilão) nos nossos planos de trabalho é residual. O maior trabalho que a gente tem é a realização do projeto executivo do TAV, que vai continuar normal. O custo total do projeto é de R$ 900 milhões — disse Figueiredo.
A EPL acabou de habilitar o consórcio Geodata Italferr para gerenciar os projetos do TAV. Pelo trabalho, a empresa receberá R$ 77 milhões, dos quais R$ 25 milhões este ano. Caberá ao consórcio contratar empresas para elaborar o projeto executivo, que conterá todos os detalhes da parte de engenharia, como o número de túneis, pontes e estações, por exemplo. Além disso, já foram gastos R$ 28,9 milhões com a realização, em 2007, dos estudos que balizaram o edital do leilão.
‘Só quero saber do que pode dar certo’
Anunciado na segunda-feira pelo ministro dos Transportes, César Borges, o adiamento do leilão do trem-bala por um ano, no mínimo, indica que o projeto não sairá do papel até o fim do mandato da presidente Dilma Rousseff. O empreendimento, segundo um interlocutor da presidente, deixou de ser prioridade. Ele resumiu em uma frase a posição do governo, citando música dos Titãs:
— Só quero saber do que pode dar certo. (...) O foco agora é nos leilões de rodovias, portos, Libra (blocos do pré-sal) e aeroportos.
Nesta terça-feira, em entrevista à rádio CBN, a chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, disse que “o governo não desistiu”, mas apenas adiou para 2014 a licitação do trem-bala, atendendo pedido de empresas interessadas na execução do projeto.
— Alguns interessados queriam mais tempo e, se fizéssemos (o leilão) agora, poderíamos ter apenas um concorrente, o que seria ruim para o processo licitatório — declarou à rádio.
Segundo Gleisi, o atraso “faz parte de um processo de aprendizado nosso e também dos investidores brasileiros”.
Na visão de Bernardo Figueiredo, a EPL, criada com a missão máxima de tirar o trem-bala do papel, não será esvaziada com adiamento do leilão. Ele disse que o TAV é apenas uma parte do trabalho da EPL, que também será responsável pela elaboração de um planejamento a longo prazo para o setor de infraestrutura, visando a implementar no país um sistema de logística integrada.
Essa visão não é compartilhada por outros integrantes do governo da área de infraestrutura. Eles destacam que o TAV foi totalmente delegado à EPL pelos órgãos que cuidam do setor, como a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), responsável pelo edital, consumindo a maior parte das atribuições da empresa.
Apesar do adiamento do leilão, a EPL manteve o cronograma de obras do trem-bala. As obras estão previstas para começar no primeiro semestre de 2015, de modo que o trem comece a rodar em 2020.
— Não tem plano B para esse negócio. Vamos ter que fazer, e quanto mais cedo melhor. Temos que parar de fazer as coisas só no limite do suportável — disse Figueiredo, lembrando o saturamento de rodovias (com a Dutra) e dos aeroportos, além da existência de vários municípios no eixo Rio-São Paulo que poderão ser alavancados com o trem-bala.
As despesas do governo com o TAV vêm desde 2005, quando a Valec Engenharia Construção e Ferrovias S.A era a responsável pelo projeto e contratou a empresa italiana Italplan Engineering para elaborar o projeto básico da obra. O negócio resultou numa disputa judicial, em que a Ítalplan cobra da Valec € 270 milhões, alegando que o serviço não foi pago. Para defender a estatal, a Advocacia-Geral da União (AGU) contratou um escritório internacional por R$ 1,26 milhão, por dois anos. O caso começou na justiça italiana e está no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Em 2007, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) assumiu o projeto do TAV e contratou o consórcio Halorow Sinergia e Prime Engenharia, via BNDES, por R$ 28,9 milhões para realizar os estudos, que serviram de base para a elaboração do edital do primeiro leilão, realizado em maio de 2011, que fracassou por falta de interessados. Na última versão do edital, o governo reformulou o modelo, dividindo o projeto em duas fases (construção e operação), além de assumir todo o risco do empreendimento, via EPL.
‘Governo não sabia o que queria’
Pensada inicialmente apenas para ser um acionista do trem, a EPL acabou virando sócia do negócio, com participação de 45%. Em 2012, o governo injetou R$ 5 milhões para constituir a empresa. Os gastos com custeio da estatal somaram R$ 28,2 milhões em 2012 e neste ano, dos R$ 152,7 milhões orçados, foram empenhados R$ 60 milhões. A EPL conta com três diretores, 151 empregados e paga aluguel de R$ 137 mil por mês (R$ 1,64 milhão por ano) no novo prédio onde foi instalada, segundo dados da própria empresa.
Para o economista Paulo Rabello de Castro, os constantes adiamentos mostram que o projeto do governo tem falhas:
— Dão a entender que o governo não sabia o queria e foi adaptando o projeto ao interesse do investidor. Um projeto dessa magnitude tem que ser cercado de cuidados especiais de comunicação com o público — disse Castro, lembrando que o governo deveria regulamentar o artigo 67 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que manda criar um conselho fiscal com representantes do governo e da sociedade, para analisar a natureza e necessidade dos gastos.
Fonte: O Globo