Queixas sobre atraso na entrega de imóveis crescem 23%
Alta foi apurada pela Associação de Mutuários de São Paulo de janeiro a maio desse ano
11 de julho de 2012 - As queixas por atraso na entrega de imóveis na cidade de São Paulo e região somaram 762 de janeiro a maio, um aumento de 23% perante igual período de 2011, segundo dados da Associação de Mutuários de São Paulo e Adjacências (Amspa). "Atendemos contratos de R$ 300 mil até mais de R$ 1 milhão", afirma o presidente da Amspa, Marco Aurélio Brito. Na cidade de São Paulo, ele conta, os problemas mais frequentes estão localizados nas regiões leste e sul.
Jackeline Adiodato e Renato Marins, moradores da zona leste da capital, aguardam a entrega de um apartamento de R$ 97 mil do empreendimento Único, em Guarulhos. O imóvel, comprado da construtora Cury, deveria ter sido entregue em maio, já considerada a tolerância de 180 dias além da data de conclusão prometida. Segundo eles, o imóvel já tem Habite-se, mas por enquanto não há sinalização da construtora de quando as chaves serão entregues.
Por enquanto, a solução é morar com a avó de Renato. Casados desde novembro do ano passado, eles tiveram de improvisar e guardam os presentes encaixotados enquanto o novo lar não fica pronto. "A empresa não dá nenhuma informação. Nós estamos morando de "favor", conta Jackeline.
O mesmo empreendimento, relatam compradores, teria impedido a formação de uma comissão de moradores para fiscalizar o andamento das obras - o procedimento é garantido por lei. "Todos os empreendimentos que tiveram a comissão fiscalizadora não apresentaram problema com o cronograma da obra ou com o tipos de materiais aplicados. É o material descritivo que foi prometido contra o está chegando na obra", diz Brito, da Amspa. "Isso é positivo para todo mundo, não há motivo para proibir", afirma Carlos Del Mar, advogado do conselho jurídico do Secovi-SP.
Procurada, a Cury disse que nenhuma comissão devidamente regulada foi apresentada à empresa. A construtora admite que o prazo de entrega de algumas unidades do empreendimento estourou seis meses. Diz ainda que já entregou 65% dos apartamentos das Fases I e II do empreendimento e que terminará o processo em 30 dias. A fase III, afirma, respeitará a folga estipulada de 180 dias. Sobre a última fase, disse que os moradores terão as chaves após a lavração do Habite-se. Ao todo, o Único Guarulhos tem 2.380 mil unidades, com preço médio de R$ 130 mil.
Prejuízo
O empresário Marcus Tadeu também vive o problema de atraso na entrega do imóvel. Ele comprou um apartamento da construtora PDG hoje avaliado em R$ 711,8 mil na Vila Leopoldina, que deveria ter sido entregue em maio do ano passado ou, se usada a tolerância de 180 dias, em novembro. Após sucessivos atrasos, o imóvel ainda não tem entrada para automóveis. "Passo todos os dias em frente, é o caminho para casa, e vejo que a obra não está andando", afirma.
Tadeu vendeu seu antigo apartamento esperando que a nova aquisição fosse entregue a tempo. Agora, ele precisa arcar com um aluguel de R$ 2,2 mil enquanto a moradia não fica pronta. Sua empresa de informática, localizada no mesmo bairro, virou uma espécie de depósito da mobília do novo apartamento. Lá, ele guarda itens como uma TV e um fogão.
O empresário ainda suspeita que teve seu telefone e e-mail vazados pela construtora. Desde que fechou o contrato, conta, foram inúmeras ofertas de produtos relacionados ao lar, como de empresas de móveis planejados. Há dois meses, uma dessas propagandas trazia todos os e-mails dos compradores visíveis no corpo da mensagem. A partir daí, ele entrou em contato com consumidores em situação semelhante à sua e, agora, organizam reuniões para tentar encontrar orientações comuns aos prejudicados.
O ponto em comum de reclamação dos consumidores é que falta diálogo das empresas sobre o estado das obras. Não raro, eles contam, os prazos não são informados "porque o engenheiro da obra não disse". "É preciso deixar os prazos mais claros na cabeça do comprador", afirma Del Mar.
A PDG informa, em nota, que entregará os apartamentos do Vila Leopoldina I a partir desse mês. A construtora ainda acrescenta que não fornece dados dos clientes para terceiros.
Tolerância para a entrega
Prever, em contrato, uma tolerância de 180 dias para a entrega dos imóveis é uma prática no mercado imobiliário. "É usada há séculos pelo setor, para se prevenir de imprevistos comuns num processo de produção de longo prazo", diz o advogado do conselho jurídico do Secovi -SP. O boom do setor nos últimos anos, contudo, fez que esse recurso virasse o padrão da indústria de construção civil. Del Mar reconhece que as construtoras alongaram seus prazos com o aumento da demanda, mas relativiza o problema. "Houve falta de mão de obra e de material. Todo bem de produção de longo prazo está sujeito a atrasos".
Marcelo Tapai, advogado especialista em direito imobiliário, explica que, durante a construção de um imóvel, a construtora recebe de 30% a 40% do valor total dos apartamentos. "De alguma forma ela tem de refinanciar os 70% restantes, ou elas vão fazer o financiamento do restante da obra no mercado financeiro. Se ela estiver com muita obra em andamento, vai precisar de mais dinheiro". Com o salto na demanda, a hipótese é que os atrasos possam ter travado o fluxo de caixa das empresas.
Fonte: O Estado de São Paulo