Como descartar entulho de obra?
Construtores e proprietários devem estar atentos à legislação local, às alternativas de destinação autorizadas e à Resolução 307 do Conselho Nacional do Meio Ambiente, que estabelece diretrizes e procedimentos para a gestão dos resíduos
Construtores devem priorizar a não geração de resíduos. E, de forma secundária, trabalhar na redução, reutilização, reciclagem e, em última instância, a destinação final com transportadores autorizados. Responsabilidade legal é sempre do gerador, ou seja, do proprietário da obra (Foto: Shutterstock)
A gestão de resíduos nos canteiros de obras começa na fase de concepção do empreendimento e na elaboração dos projetos. Passa pela escolha de materiais e sistemas construtivos, prossegue na execução – incluindo aí a limpeza inicial do terreno e eventuais demolições – e persiste até a fase pós-ocupação.
Todas essas etapas impactam a regra número 1 quanto se trata de entulho: deve-se evitar a sua geração. Se isso for impossível, é preciso pensar na reutilização do material, com outra finalidade, na própria obra. Não dá? Então, será que há indústrias ou cooperativas de reciclagem próximas interessadas? Por último, deve-se pensar no descarte adequado, com uma transportadora autorizada.
O tema possui hoje vasta legislação nas três esferas governamentais. Vários municípios, estados e o governo federal dispõem de plataformas digitais para controle do transporte dos resíduos. A dica é começar pela sua cidade, verificando as leis locais, e conhecer a fundo a Resolução 307 do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), que estabelece diretrizes, critérios e procedimentos para o gerenciamento adequado.
São dois caminhos que devemos procurar sempre: primeiro, a legislação local e as oportunidades de descarte, ou seja, cooperativas e indústrias que estão recolhendo material da construção civil para reciclagem. Segundo: é muito importante considerar a Resolução 307 do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente)Enga. Lilian Sarrouf, consultora técnica do SindusCon-SP e da Câmara Brasileira da Indústria da Construção
Em entrevista para o podcast AEC Responde, a Enga. Lilian Sarrouf, especialista no assunto e consultora técnica do SindusCon-SP e da Câmara Brasileira da Indústria da Construção, detalha os cuidados e procedimentos necessários para a gestão de resíduos e alerta para a gravidade das sanções e punições dos crimes ambientais. Confira a entrevista na íntegra.
AEC Responde – Como descartar o entulho de obra de forma adequada, em conformidade com a legislação?
Lilian Sarrouf – Bom, a primeira recomendação é procurar não gerar entulho ou resíduos da construção civil. Isso é muito importante não só por questões ambientais, mas também econômicas. Para tanto, é necessário cuidado, projeto racionalizado, gestão da obra, armazenamento adequado de materiais e aplicação correta. Ou seja, procurar não ter que refazer os serviços. Fazer uma vez só e reutilizar os resíduos que sobram de uma tarefa para outra na obra. Isso é bem importante. E aí, depois disso, vamos pensar no descarte. Hoje nós temos mais oportunidades na destinação do resíduo da construção civil, de forma que ele possa ser utilizado ou reciclado. Então, esse é o primeiro foco: como separar o resíduo? Como encaminhar os resíduos de forma que eles possam, de alguma forma, serem reutilizados e reciclados? E aí já começamos a falar da logística reversa. Agora, para descartar, procure saber no seu município, na sua localidade, sobre as legislações relacionadas. Cada cidade pode ter uma legislação diferente e, mais do que isso, oportunidades diferentes de locais de destinação. Então, a primeira a primeira providência está relacionada ao município. Feito isso, temos também – não sei se todos conhecem – a Resolução do Conama 307, que traz muitas informações sobre a gestão e a classificação dos resíduos da construção civil, além da melhor forma para o descarte de cada um deles. São dois caminhos que devemos procurar sempre: primeiro, a legislação local e as oportunidades de descarte, ou seja, cooperativas e indústrias que estão recolhendo material da construção civil para reciclagem. Segundo: é muito importante considerar a Resolução 307 do Conama.
O resíduo classe A pode ser destinado para a produção de agregado e repavimentação de vias. Estamos falando daquele resto de bloco de concreto, de cimento, de estrutura, bloco cerâmico. Esse tipo de material pode ser destinado às recicladoras que produzem os agregados ou a utilização como sub-bases e subleitos. Tudo isso está previsto em normas técnicas.Enga. Lilian Sarrouf, consultora técnica do SindusCon-SP e da Câmara Brasileira da Indústria da Construção
AEC Responde – Há descartes distintos para diferentes tipos de materiais? Como é que o construtor pode se orientar a respeito?
Lilian – Na Resolução 307, temos uma classificação com quatro tipos de resíduos. O primeiro nós chamamos de classe A, que pode ser destinado, por exemplo, para a produção de agregado e repavimentação de vias. Estamos falando daquele resto de bloco de concreto, de cimento, de estrutura, bloco cerâmico. Esse tipo material pode ser destinado às recicladoras que produzem os agregados ou a utilização como sub-bases e subleitos. Tudo isso está previsto em normas técnicas. Então, se você tiver oportunidade, encaminhe para um local de produção de agregado reciclado. Independentemente disso, verifique se a empresa está licenciada na prefeitura, se possui licença ambiental. Aí, sim, você estará contribuindo para a destinação correta. O resíduo classe B se refere a papel, papelão, plástico, esse tipo de material que já temos várias destinações. Há muitos recicladores que pegam esse tipo de material: catadores e cooperativas. Isso facilita muito a destinação. Isso sem falar nos ecopontos nas cidades. São aqueles lugares onde você, cidadão, pode encaminhar quantidades menores de resíduos, no caso de uma pequena obra, uma reforma. Para obras maiores, você tem que contratar um transportador cadastrado na prefeitura, que pode ser uma caçamba, um caminhão. E ele, sim, pode auxiliar informando quais locais estão licenciados próximos à sua obra ou ao seu município. A classe C reúne os resíduos para os quais ainda não temos uma solução econômica ou técnica, mas entendemos que possuem potencial de aproveitamento. Antigamente, se falava muito do gesso. Foi uma questão bastante tratada. Hoje é considerado um resíduo classe B, pois é reciclável. Então, na linha do C, caem aqueles que apostamos que terão soluções no futuro. Um exemplo disso, hoje, é o saco de cimento, para o qual está se buscando uma forma economicamente viável de promover a reciclagem. Os resíduos da classe D, apesar de serem classificados como perigosos pela resolução do Conama, na verdade, são resíduos que precisam de uma atenção especial. É preciso desmistificar um pouco. Nem tudo que é perigoso deve ser enviado para um aterro industrial. Os resíduos perigosos também podem ser utilizados e reciclados, desde que seja da forma correta, prestando sempre muita atenção. No SindusCon São Paulo, nós fizemos o Manual de Gestão Ambiental de Resíduos. Lá você pode ter informações sobre as legislações que comentei, sobre o que fazer com o resíduo na própria obra, o que você pode reciclar e reutilizar.
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AEC Responde – Existem plataformas digitais ou aplicativos disponíveis para facilitar a gestão de resíduos?
Lilian – Aqui, no município de São Paulo, por exemplo, há o CTR (Controle de Transporte de Resíduos) eletrônico. Se você tem uma obra, é obrigado a estar cadastrado nessa plataforma. Lá você vai encontrar os transportadores que podem ser utilizados e também os destinos que podemos usar dentro da cidade. Essa plataforma é para qualquer obra. Vou tirar apenas uma caçamba? Já preciso utilizá-la. É importante também fazer os planos de gerenciamento de resíduos que – independentemente de serem exigidos pela política nacional de resíduos – são instrumentos de gestão. Quando estivermos elaborando o plano, é lá que estaremos pensando na estratégia que vamos adotar. Naquela linha que já comentei: primeiro, não gerar, depois reutilizar, reciclar e, por fim, destinar de forma adequada. Aqui no Estado de São Paulo, nós temos um outro sistema estadual chamado Sigor, módulo construção civil. Esse sistema é gerenciado pela Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) e, para as cidades paulistas que já fizeram parceria, é obrigatório. Esse sistema traz muita orientação e explicações de tudo que eu estou falando. É uma boa fonte de consulta. E temos agora o MTR (Controle de Manifesto de Transporte de Resíduos), que é um sistema nacional mais aplicado aos resíduos perigosos e industriais. Por enquanto, para os resíduos da construção civil, a participação na plataforma MTR é voluntária. Mas, se você tiver algum resíduo perigoso na sua obra, sim, você tem que usar essa plataforma também. E como ainda está em uma fase de transição, algumas cidades e estados estão fazendo convênios com o governo federal para que possamos utilizar um único sistema. Na cidade de São Paulo, por exemplo, se você já utiliza o CTR eletrônico, automaticamente já está atendendo também o MTR federal.
As sanções vão desde multas, passando pelo embargo da obra até a prisão do responsável. Isso depende do risco e do tamanho do problema ambiental que foi causado, além das legislações locaisEnga. Lilian Sarrouf, consultora técnica do SindusCon-SP e da Câmara Brasileira da Indústria da Construção
AEC Responde – Quais são as sanções ou punições para deposições irregulares de resíduos de obras?
Lilian – Isso vai depender do volume e do tipo de entulho. O fato é que tudo será tratado como uma questão ambiental. Então, sempre o gerador do entulho é o responsável pelo resíduo. Não adianta dizer que a caçamba contratada virou na estrada e caiu no córrego. O gerador sempre vai ser chamado para responder por aquilo. Então, é muito importante ter noção dessa responsabilidade, essa consciência. O gerador não é o arquiteto contratado para fazer uma residência, mas sim o dono da casa que o contratou. O gerador é a grande incorporadora que contratou uma construtora para executar a obra. Na lei de crimes ambientais, sempre será acionada primeiro. Quais cuidados devemos ter para evitar as sanções? A correta destinação. Você deve ter a documentação e a comprovação de que tudo foi feito corretamente. Você deve sempre elaborar contratos prevendo esse tipo de situação. No caso de uma incorporadora que contrata a execução de uma obra, precisa ficar claro que a construtora é responsável pelo gerenciamento dos resíduos. No caso de uma construtora, precisa ficar claro que o transportador é responsável pelo transporte e destinação final dos resíduos. As sanções vão desde multas, passando pelo embargo da obra até a prisão do responsável. Isso depende do risco e do tamanho do problema ambiental que foi causado, além das legislações locais. Crimes ambientais permitem que você seja preso por isso.
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Colaboração técnica
- Lilian Sarrouf – Engenheira civil pela Escola de Engenharia Mauá e administradora de empresas pelo Mackenzie, é mestre em gestão integrada de meio ambiente e segurança e saúde pelo SENAC-SP. Consultora técnica da CBIC e do SindusCon-SP, coordena o Comitê do Meio Ambiente, Segurança e Produtividade e o grupo de trabalho de Pós Obra da entidade paulista. Também é gestora do ABNT CB002 – Comitê Brasileiro da Construção Civil da ABNT.