Como proteger estruturas metálicas contra incêndios?
Proteções existem para facilitar e permitir a fuga dos moradores ou usuários da edificação. A ideia é reduzir a propagação do incêndio e retardar a chegada ao fogo na estrutura, para evitar o colapso
NBR 14.323 estabelece os requisitos de resistência ao fogo para projetos de estruturas metálicas. Pintura intumescente, argamassa projetada, placas de gesso e mantas pré-fabricadas estão entre os principais tipos de revestimentos empregados na proteção passiva. (Imagem: Shutterstock)
As estruturas apresentam alterações em suas propriedades quando sujeitas às altas temperaturas provocadas por incêndios. O aço, por exemplo, perde cerca de 40% da sua resistência acima dos 550ºC.
As medidas de proteção contra o fogo têm como objetivo evitar o colapso estrutural e aumentar o tempo para a evacuação da edificação. A Norma ABNT NBR 14.323 estabelece os requisitos de resistência aos incêndios para projetos de estruturas de aço.
As proteções são divididas entre passivas e ativas. Alternativas devem ser previstas em projeto e analisadas por profissional capacitado e habilitado. Para nos ajudar a compreender melhor o tema, convidamos para o podcast AEC Responde o engenheiro de estruturas Jary de Xerez Neto, autor do livro “Estruturas Metálicas: Manual Prático para Projetos, Dimensionamento e Laudos Técnicos”. Confira abaixo a entrevista.
AEC Responde – Como proteger estruturas metálicas contra incêndios? Qual é a diferença entre proteção passiva e ativa?
Neto – Começando pela segunda pergunta, as proteções ativas e passivas existem, principalmente, para facilitar e permitir a fuga dos ocupantes por um determinado tempo. Ou seja, a retardar a chegada ao fogo na estrutura para que não haja colapso e reduzir a propagação do incêndio. Entre os dois tipos de proteção, há uma pequena diferença conceitual: a ativa tem como objetivo principal reduzir os danos na estrutura com a utilização de mecanismos como extintores, hidrantes, sprinklers e detectores de fumaça. Já a proteção passiva se aplica aos mecanismos construtivos para retardar a propagação de incêndio e permitir a fuga dos ocupantes. Com relação à estrutura metálica propriamente dita, podemos utilizar, por exemplo, a placa de gesso tipo X, mais resistente ao fogo. No Brasil, tal resistência se mede pelo TRRF ou tempo requerido de resistência ao fogo. Eu gosto de me basear no TRRF de cada material, que já estão tabelados em vários conteúdos didáticos e acadêmicos. Por exemplo, uma placa de areia e gesso sobre ripas de metal, com 19 mm de espessura, aguenta 30 minutos. Quanto maior a espessura, mais elevado é o tempo de resistência ao fogo. A finalidade também interfere. Uma placa de gesso para o teto possui uma resistência diferente daquela empregada para proteger paredes. Esse tipo de material pode vir com areia, pirita – um mineral muito resistente ao fogo – ou vermiculita e com cimento e areia também. Uma outra opção é a lã de rocha, que resiste a temperaturas acima de 1000oC. Suporta de 1 a 2 horas de incêndio. A fibra cerâmica é um outro material, que pode vir aluminizada ou sem revestimento. Aguenta temperaturas acima de 1200°C e resiste por 2 horas. O vidro também é utilizado.
“Com relação à fachada, existem dois mecanismos simples que retardam a chegada do fogo do pavimento de baixo para o de cima: estender o balanço na fachada em 90 cm, no mínimo, como recomendam os bombeiros. E prever um parapeito com, pelo menos, 1,20 m.”Eng. Jary de Xerez Neto
AEC Responde – O que é mandatório ou recomendável fazer em termos de compartimentação vertical ou horizontal, rotas de fuga, escadas de segurança e materiais para revestimentos de parede, piso e teto?
Neto – Sobre as compartimentações, o objetivo é impedir a propagação do incêndio nos planos verticais e horizontais. Há mecanismos construtivos, como a porta corta-fogo, chamada de PCF, de 30, 60 e 90 minutos, correspondentes ao tempo requerido de resistência ao fogo (TRRF). Há também os dampers, que são registros corta-fogo em tubulações com TRRF de 30 minutos; paredes de tijolo ou concreto com resistência ao fogo e selos corta-fogo, que revestem cabos elétricos. Essas são compartimentações horizontais. As verticais eu considero mais complexas. Aí entra, por exemplo, a vedação da caixa da escada, que é desafiadora do ponto de vista arquitetônico e da engenharia propriamente dita. Há várias nuances e detalhes que devem ser observados. Não é difícil ter um projeto reprovado por uma falha na escada. O projetista tem que estar muito atento. Importante mencionar também os revestimentos de teto e piso, assim como a selagem de todo o perímetro – isso é fundamental. Na intercomunicação entre um pavimento e outro, devemos selar todas as saídas de tubulação. Em relação à fachada, existem dois mecanismos simples que retardam a chegada do fogo do pavimento de baixo para o de cima: estender o balanço na fachada em 90 cm, no mínimo, como recomendam os bombeiros. E prever um parapeito com 1,20 m, pelo menos. Isso vai retardar a chegada do incêndio no compartimento de cima, no andar superior. Com relação às rotas de fuga, devemos prever as portas corta-fogo, que devem abrir no sentido da saída. Não devem, nunca, ser trancadas. Isso é motivo de multas pesadas para a edificação. E há também a distância máxima a ser percorrida para as saídas do edifício, que está prevista nas normas brasileiras e canadenses: 30 metros. De qualquer ponto na edificação, a saída mais próxima deve estar, no máximo, a 30 metros.
“Como qualquer aplicação de pintura, a superfície metálica deve ser limpa e isenta de gorduras, graxas e óleos. Deve receber uma aplicação de prime de 50 micrômetros de espessura e, aí sim, você aplica a pintura intumescente”Eng. Jary de Xerez Neto
AEC Responde – Os principais tipos de revestimentos para as estruturas seriam a pintura intumescente, argamassa projetada ou placas e mantas pré-fabricadas? Quais são as principais diferenças entre eles?
Neto – Vou começar pela argamassa projetada. Posso garantir que, entre os três tipos de revestimentos mencionados, ela é uma das mais práticas. E, em comparação com a pintura intumescente, possui um custo mais baixo. O único inconveniente que vejo na argamassa projetada se refere à sua aspereza. O aspecto rugoso não é tão estético e isso pode não agradar o cliente. Nesse caso, ela pode ser revestida por um forro. De modo geral, é prática de ser aplicada, mas tem um tempo de cura um pouco prolongado, porque é cimento e areia natural. E não é tão prática em relação à limpeza. Nesse aspecto, teríamos a placa de gesso, que já vem pronta. Lembrando que ela não pode ter emendas e não deve haver brecha entre as placas, para proteger a estrutura. A pintura intumescente seria a terceira opção. Como qualquer aplicação de pintura, a superfície metálica deve ser limpa e isenta de gorduras, graxas e óleos. Deve receber uma aplicação de prime de 50 micrômetros de espessura e, aí sim, você aplica a pintura intumescente. O gesso – já falei anteriormente e repito agora – é prático, simples e tem um custo-benefício bacana. Basicamente, são essas três opções.
As pessoas também perguntam:
O que é curto-circuito e quais são as suas causas?
AEC Responde – Como definir a espessura correta para os materiais de proteção?
Neto – Bem, existem equações complexas previstas pela Norma 14.323 – Projeto de estruturas de aço e de estruturas mistas de aço e concreto de edifícios em situação de incêndio. Lá você encontra o cálculo, passo a passo, do cobrimento do concreto, a distância do centro de gravidade da barra de aço com a face do concreto para uma viga, uma laje ou uma coluna de concreto. Há um outro método, que é o de tempo equivalente, que pode ser encontrado na Instrução Técnica nº 08, do Corpo de Bombeiros de São Paulo, com acesso gratuito pela internet. Lá consta a fórmula direitinho. São vários coeficientes que levam em conta a ventilação, altura do compartimento e assim por diante. Mas antes de chegar em um desses métodos, o profissional deve consultar a tabela A.1 da norma 14.432 – Exigências de resistência ao fogo de elementos construtivos de edificações. Pegue, como exemplo, um edifício residencial de 6 pavimentos, com 3 m de pé-direito em cada andar, ou seja, 18 m de altura, considerando o pé direito estrutural. Estará enquadrado na classe P3. Aí, a tabela vai te informar o TRRF (tempo requerido de resistência ao fogo) que, nesse caso, deve ter 60 minutos. Uma hora é o tempo básico para qualquer construção interna, para qualquer compartimento e paredes entre dormitórios. Duas horas ou 120 minutos são indicados mais para os compartimentos externos, entre edificações. Então, nessa tabelinha A.1 da norma 14.432, é possível encontrar o TRF de cada compartimento. Depois, você segue pelo método de tempo equivalente ou qualquer outro que desejar.
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Colaboração técnica
- Jary de Xerez Neto – Graduado em engenharia civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), é especialista em estruturas e possui um acervo técnico com mais de 450 projetos já executados. É um dos autores do livro “Estruturas Metálicas – Manual Prático para Projetos, Dimensionamento e Laudos Técnicos”. Finalista do Prêmio Talento Estrutural de 2018, atuou em diversas obras e projetos da Petrobras.