Como tratar trincas e fissuras em paredes?
Falhas de projeto, de materiais ou de execução podem causar fissuras ou trincas em alvenarias. Diagnóstico correto determina o tratamento adequado e impede o retorno do problema após a correção
Fissuras possuem deformação de abertura superior a 0,05mm e inferior ou igual a 0,5mm. São pouco profundas, com desenvolvimento horizontal, vertical ou inclinado. (Foto: Shutterstock)
Não encontrar nenhuma fissura em edifícios projetados e construídos com base em materiais cimentícios é algo raro. Em muitos casos, entretanto, há pouco ou nenhum prejuízo técnico ou estético. Se forem visíveis a olho nu, a uma distância aproximada de 1 metro e ocorrerem em número superior a dois ou três por metro quadrado, é melhor se preocupar.
Se já estão provocando outros problemas, como a penetração de umidade, então, é hora de entender a origem das falhas e planejar o tratamento adequado. A atenção com as fissuras é importante porque constituem sinais de alerta para possíveis movimentações ou deformações estruturais, para problemas com umidade, com a durabilidade das vedações e o isolamento térmico ou acústico. Lembrando também que as fissuras podem evoluir para as trincas, cuja deformação de abertura é superior a 0,5mm.
Para orientar os profissionais a respeito, o engenheiro civil com mestrado em Tecnologia de Construção de Edifícios pelo IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo), Renato Sahade é o convidado do podcast “AEC Responde.” Consultor em patologia de concreto e revestimentos, ele é professor de cursos de pós-graduação em diversas instituições de ensino.
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AEC Responde – Depois de constatado o problema, como é que se faz o tratamento corretivo de trincas e fissuras em paredes?
Renato Sahade – As trincas e fissuras podem ter várias causas. Precisamos, primeiro, identificar a situação de movimentação delas, se ainda estão ativas, ou seja, ainda estão vivas, trabalhando, ou se são passivas, já se estabilizaram. Eu costumo dizer para os meus alunos que devemos começar pelo pior cenário que, no caso, seria um problema de fundação, uma movimentação ou deformação estrutural. Aí você vai precisar de reforços para tratar essas trincas e, obviamente, terá de contatar um engenheiro estrutural ou um engenheiro de fundações. Se são trincas ativas, mas de movimentações termohigroscópicas, entre a estrutura e a alvenaria, ou uma trinca ativa que se formou ali no revestimento por uma situação de retração da argamassa, então, dizemos que são ativas, mas não são estruturais. Não possuem ligação com a deformação do edifício em si. São mais simples de serem tratadas. Bastaria ir na movimentação entre estrutura e alvenaria, aquele tipo de trinca que vem da base. Aí precisamos de uma tela metálica ou uma junta. O professor Ercio Thomaz fala muito disso: a trinca ou você libera através de uma junta, deixando-a se movimentar ou você trava o momento dela com um reforço. Para esse reforço, existem as telas e vários elementos e materiais disponíveis no mercado. Além das metálicas, temos as telas de fibra de vidro, emulsões acrílicas, membranas acrílicas que, incorporadas às telas, criam a capacidade elastomérica de tratar essas trincas.
Se eu não diagnostiquei corretamente, posso dar uma terapia inadequada. Por exemplo, não identifiquei uma movimentação estrutural e achei que era, simplesmente, uma dilatação térmica entre materiais. Aí faço um reforço localizado ou abro uma junta, mas aquela deformação é tão intensa que rompe a tela ou a juntaEng. Renato Sahade, professor e consultor em patologia de concreto e revestimentos
AEC Responde – Esse tratamento deve ser feito por empresas especializadas ou pode ser realizado, por exemplo, pela própria equipe da construtora?
Sahade – Em alguns casos específicos, nós treinamos equipes da construtora mas, na maioria das vezes, preferimos trabalhar com mão de obra especializada.
AEC Responde – E como evitar que ocorram as fissuras e as trincas? Quais são os principais cuidados de projeto e execução?
Sahade – Evitar em projeto seria o ideal, pois teríamos custo zero. Se deixamos para depois, os valores aumentam muito. Em projeto, devemos pensar que as estruturas estão mais esbeltas, deformáveis, pensar que podemos ter um problema de fundação. Temos que evitar, acompanhar a estrutura para evitar essas variações e deformações. Com relação às alvenarias e às estruturas, sempre as alvenarias terão menos capacidade para absorver essas movimentações e deformações e, com isso, você tem que prever juntas, telas metálicas, reforços localizados, o que vai depender muito do projeto, da deformação da sua estrutura, depende da alvenaria e sua dimensão, a inércia dela, as dimensões dos blocos, encunhamentos. São cuidados que devemos ter: coberturas, dilatações térmicas e higroscópicas ali em cima. E com relação ao revestimento em si, os cuidados com o emboço, o preparo da base, o chapisco, argamassas mais flexíveis, com módulos de deformação menores, que absorvam as tensões aí e criem menos condições de se retraírem. A cura da argamassa e a cura do chapisco também são importantes. Ou seja, boas práticas, aqueles cuidados básicos que aprendemos no início de nossas carreiras. Lógico que nenhuma edificação está livre de uma fissura. Os materiais cimentícios, por si só, são rígidos e possuem uma tendência à fissuração. Existem estudos que mostram: toda edificação tem fissuras. Mas podemos diminuir tais ocorrências com boas práticas, treinamento da mão de obra, controle de qualidade de materiais, projetos adequados e projetos de revestimentos, que hoje são uma tendência.
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AEC Responde – Notamos em algumas obras o reaparecimento de trincas e fissuras, após as correções. Por que isso acontece?
Normalmente, está ligado à falha do diagnóstico. A fissura pode aparecer tanto no material em si quanto na interface entre os materiais. Se eu não diagnostiquei corretamente, posso dar uma terapia inadequada para aquilo. Por exemplo, não identifiquei uma movimentação estrutural e achei que era, simplesmente, uma dilatação térmica entre materiais. Aí faço um reforço localizado ou abro uma junta, mas aquela deformação é tão intensa que rompe a tela ou a junta. Devo, portanto, voltar à causa do problema, procurar detectar exatamente a causa. Então, você pode ter falha da identificação ou você pode ter um problema do material. Já tivemos alguns casos de materiais contaminados. Você pode ter sal, a presença de areia de praia, por exemplo, que é expansiva em uma argamassa – a ação do cloreto de sódio. São muitos itens que podem ocasionar esse retorno dos problemas. Você trata uma trinca localizada como uma simples retração, mas não é. Trata-se de uma reação álcali-agregado nas estruturas de concreto. Nós estamos vivendo uma transformação climática intensa, então, nas alvenarias estruturais, por exemplo, estamos verificando a formação de fissuras nos últimos pavimentos. Isso mesmo fazendo proteção térmica, mesmo fazendo um colchão de cinasita (argila expandida), mesmo desvinculando a alvenaria da laje. Vamos ter que pensar em alguma forma de melhorar essa desconexão entre alvenaria e estrutura. Há construtoras que usam mantas ali... já não dá mais. Você tem que usar amortecedores adequados, neoprenes, borrachas, ou melhor, tudo tem que ser projetado para evitar essa trinca de cobertura. Temos que voltar e tentar entender a origem do problema para poder, então, determinar a melhor terapia. O diagnóstico vai identificar a melhor terapia.
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Colaboração técnica
- Renato Sahade – Engenheiro civil com mestrado em Tecnologia de Construção de Edifícios pelo IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo), atua como consultor em patologia de concreto e revestimentos. É professor de pós-graduação pelo INBEC/UNIP, Universidade Presbiteriana Mackenzie e Educ.Eng/CREA-ES nas cadeiras de Vedações, Revestimentos e Sistemas de Recuperação. É membro da Comissão de Estudos de Argamassas de Assentamento e Revestimento da ABNT/CB-002 e também do Comitê de Avaliadores da Revista Ambiente Construído da ANTAC (Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído).