Muro significa estrutura sólida, utilizada para delimitar ou proteger os recintos. Inicialmente foram criados para servir de arrimo ou contenção de estruturas de solo expostas ou frágeis de uma habitação. Na Europa da Idade Média, muralhas protegiam as cidades do “estrangeiro”, enquanto hoje, em países emergentes, tentam proteger a população que sofre com um serviço deficitário de segurança. Se antes ficavam as sentinelas, hoje os muros recebem cercas eletrificadas, câmeras e sensores óticos.
Questionar a fundo sobre muros e assemelhados, especialmente nas grandes cidades brasileiras, parece até um tema fora de moda. Casas sem muro são relegadas aos filmes, mas é realidade em muitos lugares do mundo. No aspecto cultural a cidade segue um modelo estético de segurança, que retrata o medo da criminalidade e que, na medida da implantação de equipamentos, confere prestígio e status às propriedades. Tem-se relativizado a liberdade em troca de um sentimento de segurança, porém a um preço – isolamento: isola quem está dentro e quem está fora.
Enquanto os condomínios até a década de 70 eram projetados abertos para as ruas, a partir dos anos 80, até hoje, passaram a nascer fechados.
Essa transformação repercute no cotidiano urbano, qualifica os vínculos das relações cidadãs e oferece a visibilidade e a permeabilidade da diversidade dos elementos físicos e relacionais, arquitetônicos e pessoais nas concentrações humanas.
Pensando nos transeuntes, é também nas entradas/saídas pelos muros onde se instalam os equipamentos de iluminação e identificação numérica das edificações nas ruas e avenidas. Este cuidado impacta diretamente na mobilidade urbana e deve ser pensado tanto para pedestres como embarcados em veículos automotores, especialmente agora por bicicletas.
A legislação civil brasileira, quando fala nos direitos de vizinhança, do direito do proprietário cobrir o que está descoberto, cercar e murar, prevê ao vizinho o direito de reclamar se o muro apresentar inconvenientes: tapar o sol, inutilizar uma janela ou facilitar a entrada de invasores. A este direito estende-se o de aeração, ao livre fluxo das águas e dos ventos e à climatização entre as propriedades - uma questão de sustentabilidade na qualidade da construção do meio ambiente artificial – cidades.
São Paulo possui algumas legislações que tratam do assunto e no Código de Obra traz regras acerca de muros e assemelhados em terrenos edificados.
A segurança nas ruas não depende exclusivamente do policiamento ou mesmo da punição que a sociedade impinge à criminalidade; ela é mantida especialmente pelo comportamento da população. Muros são o retrato da cultura do risco e do medo, são informadores da ausência de segurança.
É com muro que se desenha as paisagens limitadoras dos horizontes, do privado ao público e vice-versa. Em cidades como São Paulo, caracterizadas pela fragmentação territorial e por “enclaves fortificados”, as praças e parques e mesmo shoppings centers e hipermecados, é difícil manter padrões bons de livre circulação, que é uma das características de sadia qualidade de vida das zonas urbanizadas. Aqui até a cidade universitária é murada.
Muro também reflete mobilidade e acesso urbano, indicadores de sustentabilidade. É estética e transparência. O direito à paisagem e ao "horizonte", e mesmo ao “belo e bem cuidado”, bem pintado e até artístico pode ser resgatado.
O exercício de direitos fundamentais como o de ir e vir da Constituição Federal, combinado com a concepção de desenvolvimento sustentável e a construção das cidades previstas em seu Estatuto, (Lei 10.257/01), resulta no termômetro indicador da sadia qualidade de vida e da própria qualidade no exercício da função social das cidades. Na estética, vão dos tijolos sobrepostos com acabamentos diversos, como por grades e, mais recentemente, por vidros transparentes, talvez esta a tendência que permite “vigiar” as ruas mais amplamente e apreciar as edificações e seus jardins. Esta ampliação de visão talvez seja uma forma mais eficaz a ser testada do que o modelo visualmente quase impermeável.
Os arquitetos, desenhistas das cidades, devem, mais que bem projetar, garantir o cuidado pelos futuros usuários, inclusive as possibilidades de alteração, de forma eficiente, eficaz e funcional.
Finalmente, é importante lembrar que se o conjunto de fachadas da cidade é propriedade de todos – tanto dos donos das edificações como da sociedade –, trata-se de um direito cidadão por excelência, além de individual, difuso e coletivo.