O sonho da casa própria é o maior anseio da maioria dos brasileiros, sonho este que vem se tornando realidade nos últimos anos. O aumento na venda de imóveis na planta foi de 16% no segundo semestre de 2019, conforme aponta pesquisa divulgada pelo CBIC. Ocorre que, muitas vezes, esse sonho vem se tornando um pesadelo, principalmente quando falamos sobre o atraso na entrega dos imóveis. Pesquisas apontam que 95% dos empreendimentos imobiliários foram entregues tardiamente. O que o consumidor pode fazer para garantir os seus direitos?
O atraso estará configurado quando findado o prazo estabelecido contratualmente para entrega do imóvel. Muitos contratos estipulam um prazo de carência, que nada mais é do que uma prorrogação do prazo de entrega e que nunca poderá ser superior a 180 dias corridos. Até pouco tempo, o entendimento jurisprudencial era que tal prazo somente poderia ser utilizado com a devida justificativa e comprovação. Contudo, com a inovação trazida pela Lei n. 13.786/18, o STJ vem mudando esse entendimento.
A Lei n. 13.786/2018 estipula que a entrega do imóvel em até 180 dias corridos não resultará no pagamento de qualquer penalidade pela incorporadora. Nesse sentido, o informativo n. 617 do STJ dispôs que não será abusiva a cláusula contratual que estipula o prazo de carência, desde que a prorrogação seja de até 180 dias.
Findado todos os prazos possíveis para a entrega do imóvel, o consumidor poderá requerer diversos tipos de indenização, de acordo com a análise do caso concreto. Conforme entendimento pacificado do STJ, é cabível o pedido de lucros cessantes, que são os danos causados ao consumidor por aquilo que este deixou de lucrar em razão do atraso na entrega do imóvel. Na maioria dos casos, estes lucros são arbitrados entre 0,5% e 1% sobre o valor do imóvel para cada mês de atraso.
Outro tipo de dano material que pode ser pleiteado são os danos emergentes. Configura-se naquilo que o consumidor teve que gastar por não poder usufruir do imóvel entregue com atraso, como por exemplo, os valores de aluguéis imputados desde o dia em que se iniciou o atraso por parte da incorporadora. Não é uma indenização presumida; precisa ser devidamente comprovada através de provas que demonstrem os gastos que o consumidor suportou e o nexo causal entre eles simultaneamente com a entrega tardia do imóvel.
De acordo com o precedente estabelecido pelo STJ, os danos morais não são presumíveis para os casos de atraso na entrega; somente estará configurado quando comprovada a ocorrência de uma significativa e anormal violação ao direito da personalidade do adquirente, gerando dor, angústia e revolta. Não pode ser fundamentado somente no mero inadimplemento contratual. Para sua configuração é necessário que ultrapasse a esfera do mero aborrecimento.
Outro pedido que pode ser pleiteado pelo consumidor lesado é o da aplicação da cláusula penal. Trata-se da cláusula que estipula multa para situações de inadimplência, normalmente imputada somente para o consumidor, mas que pode ser revertida contra a incorporadora nos casos de entrega tardia do imóvel. É importante destacar que não será possível cumular o pedido de lucros cessantes com a cláusula penal, visto que ambas apresentam a mesma finalidade, qual seja, a de indenizar o comprador pelos prejuízos decorrentes do atraso na entrega do bem – conforme pacificado pelo STJ no julgamento do tema 970.
Outra dúvida muito comum nesses casos é quem deverá ser responsabilizado pelo atraso. A jurisprudência já pacificou o entendimento que a responsabilidade é solidária entre incorporadora e financeira, posto que o contrato foi celebrado com ambas. O consumidor terá o prazo de 10 anos para ingressar com a ação decorrente da entrega tardia do imóvel, nos termos do artigo 205 do Código Civil, por se tratar de responsabilidade contratual.
Em síntese, a legislação brasileira é clara ao afirmar ser ilegal a prática das incorporadoras em entregar imóveis tardiamente, ensejando essa conduta a reparação por danos matérias e morais. O consumidor deve exigir os seus direitos. Procure sempre orientação jurídica para análise do caso concreto e definição da melhor estratégia e medidas cabíveis na defesa dos seus interesses.