Como se preparar para trabalhar com construção modular?
Startups, incorporadoras e fornecedores do setor têm investido em industrialização e construção off-site. Tendência é crescente e deve gerar oportunidades para técnicos e profissionais de engenharia civil e arquitetura
Na construção modular, há espaço para pessoas com diferentes perfis e formações. O que muda em relação aos sistemas tradicionais é a mentalidade, que deve incorporar trabalho colaborativo, maior precisão dimensional, planejamento e gestão apurada dos processos (Foto: Shutterstock)
Incorporadoras e construtoras de diferentes portes, fabricantes de materiais de construção e várias startups já perceberam, há tempos, o potencial de crescimento da construção modular ou off-site no Brasil. Sistemas construtivos baseados em módulos industrializados produzidos fora do canteiro prometem redução de prazos e desperdícios, previsibilidade de custos e menor geração de resíduos.
Dificuldades no incremento da produtividade, problemas de renovação da mão de obra, maiores demandas por sustentabilidade e segurança do trabalho, além do aumento dos custos fixos em obras de maior duração, têm colocado em xeque os pilares da construção tradicional.
Não é à toa, por exemplo, que entidades como o SindusCon-SP e a Asbea (Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura) lançaram em julho deste ano um manifesto em prol da industrialização na construção de edifícios residenciais.
No texto, assinado em conjunto, o sindicato dos construtores paulistas e a associação de arquitetos ressaltaram que o setor avançou nas últimas décadas na racionalização de custos e prazos, mas o “verdadeiro salto nesta evolução, para atingir um outro patamar, somente será possível repensando a construção como um processo de montagem.”
"Haverá demanda para todas as funções exercidas nas empresas que vão atuar nessa cadeia de valor. Engenheiros e arquitetos serão fundamentais, mas também bons técnicos. Todos trabalhando de forma integrada”Eng. Paulo Oliveira
POTENCIAL DE CRESCIMENTO
Quem atua na área já aponta a necessidade de formar profissionais em maior escala para trabalhar com a construção off-site. “Haverá demanda para todas as funções exercidas nas empresas que vão atuar nessa cadeia de valor”, afirma o Eng. Paulo Oliveira, CEO da ARATAU Construção Modular. “Engenheiros e arquitetos serão fundamentais, mas também bons técnicos. Todos trabalhando de forma integrada”, completa.
O Arq. Pedro Virmond Moreira, sócio-fundador e diretor de engenharia de produto da Tecverde, compartilha da mesma visão. “Companhias como Brasil ao Cubo, Tecverde, Tenda, MRV e várias incorporadoras que estão avançando na construção modular já constituem um mercado para esses profissionais, com forte tendência de crescimento para os próximos anos”, afirma o arquiteto.
CURSOS E REFERÊNCIAS
As faculdades de engenharia civil e arquitetura ainda não contemplam em suas disciplinas temas diretamente relacionados à construção modular. Por isso, a busca pela complementação da formação acadêmica é fundamental. E, a despeito de ser um assunto relativamente novo no mercado nacional, já existem alternativas de cursos e pós-graduações na área.
Algumas opções de cursos e pós-graduação em construção modular, off-site e sistemas construtivos industrializados: | ||
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NOME DO CURSO | CARGA HORÁRIA | ESCOLA |
Construção Off-Site – Arquitetura e Engenharia de Edificações Modulares | 420 horas | IMC² |
Projeto e Construção de Edificações nos Sistemas Construtivos Light Steel e Wood Framing | 420 horas | IMC² |
Construção 4.0 – Industrialização, Inovação e Tecnologia | 128 horas | AEA |
Construção Modular, Pré-Construção e Fast Construction | 12 horas | AEA |
A produção de conteúdo relacionado ao tema também tem sido intensa e muita coisa pode ser consultada pela internet, sem nenhum custo. Alguns relatórios das consultorias McKinsey e Deloitte, por exemplo, são interessantes e estão disponíveis em inglês. Confira abaixo.
Reinventing Construction: A Route to Higher Productivity |
The next normal in construction |
Digitalizing the construction industry |
Mas já existem muitos artigos, ebooks e textos em português. Confira, a seguir, links para alguns deles:
“Na construção off-site, não há trabalho isolado de nenhum dos projetistas. O desenvolvimento é complexo, com alto nível de detalhamento e exige que diferentes profissionais atuem de forma integrada”Arq. Pedro Virmond Moreira
RELEVÂNCIA DO BIM
Na visão de Oliveira, a construção modular se baseia em três pilares: pré-construção, fast construction e BIM. “O Building Information Modeling é essencial em todas as etapas, desde o projeto até a fabricação e a montagem dos módulos”, explica o CEO da Aratau. A necessidade de integração absoluta de todas as disciplinas na construção se encaixa perfeitamente com os princípios de trabalho colaborativo do BIM.
“Na construção off-site, não há trabalho isolado de nenhum dos projetistas”, afirma Moreira. “O desenvolvimento é complexo, com alto nível de detalhamento e exige que diferentes profissionais atuem de forma integrada”, complementa o diretor da Tecverde.
Considerando tais características, fica clara a importância de os interessados na área conhecerem, com profundidade, não apenas os softwares BIM, mas principalmente os processos derivados do uso da metodologia e os princípios do trabalho colaborativo.
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NORMAS TÉCNICAS RELACIONADAS
Todo sistema construtivo inovador, assim como qualquer outro, precisa atender às normas técnicas vigentes. Não é diferente com a construção off-site. O principal texto a ser observado – visto que não está focado nos materiais ou na forma como a edificação foi executada – é a NBR 15575, a Norma de Desempenho, cuja abordagem reside nos resultados que o edifício ou sistema deve atingir durante a fase de utilização, ou seja, no comportamento em uso. Mas há outras normas que os profissionais interessados na área devem conhecer. Confira a seguir.
NBR 15575 - Edificações Habitacionais – Desempenho
NBR 14037 - Diretrizes para elaboração de manuais de uso, operação e manutenção das edificações — Requisitos para elaboração e apresentação dos conteúdos
NBR 16747 - Inspeção predial – Diretrizes, conceitos, terminologia e procedimento
NBR 5674 - Manutenção de edificações — Requisitos para o sistema de gestão de manutenção
NBR 16936 - Edificações em light wood frame
NBR 16970-1 - Light Steel Framing - Sistemas construtivos estruturados em perfis leves de aço formados a frio, com fechamentos em chapas delgadas – Parte 1: Desempenho
NBR 9062 - Projeto e execução de estruturas de concreto pré-moldado
NBR 8800 - Projeto de estruturas de aço e de estruturas mistas de aço e concreto de edifícios
NBR 7190-1 - Projeto de estruturas de madeira – Parte 1: Critérios de dimensionamento
PERFIL DESEJADO PARA OS PROFISSIONAIS NA ÁREA
Mas, afinal, quais são as competências e habilidades valorizadas pelo mercado quando se fala de profissionais para atuar na área de construção modular?
1) Paixão por inovação e tecnologia: a mentalidade é diferente da aplicada na construção tradicional, com perfil mais artesanal. Sem gostar de inovação e técnicas avançadas, fica complicado trabalhar na área;
2) Não ter medo de errar: falhar é algo muito temido pelos profissionais da construção. Só que não existe inovação sem tentativa e erro. Faz parte do processo e é preciso se acostumar. Para isso, entretanto, existem prototipação e testes. Nada de deixar estourar nas mãos dos clientes;
3) Capacidade de atuar em equipes multidisciplinares: valor inegociável para as empresas que atuam nessa área. Simplesmente esqueça aquela história de ‘cada um no seu quadrado’. Aqui o ‘quadrado’ é um só e todos têm que tomar conta para que tudo dê certo;
4) Competência para desenhar e seguir os processos: a construção modular carrega no DNA princípios fundamentais da indústria de transformação. Saber desenhar bons processos e, em especial, cumpri-los sem improvisação ou jeitinho são aspectos indiscutíveis;
5) Foco em resultado: de nada adianta tecnologia, inovação e disrupção sem viabilidade técnica e econômica. O objetivo final é sempre o resultado.
Colaboração técnica
- Paulo Oliveira – Engenheiro civil, PMP, MBA pela FIA-USP e mestrando em inovação na construção pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, é CEO da ARATAU Construção Modular. Dirigiu indústrias de produtos para construção e foi diretor de engenharia, de unidades de negócios e CEO de empresas de engenharia, construção e incorporação.
- Pedro Virmond Moreira – Arquiteto, sócio-fundador e diretor de engenharia de produto da Tecverde Engenharia, possui vasta experiência no desenvolvimento e coordenação de projetos residenciais de diferentes escalas, com foco na produtividade e sustentabilidade. Recebeu treinamento na Alemanha e no Brasil, a partir de duas consultorias alemãs para projeto em wood-frame: a Baumeister e Sapper e a Sema-soft.