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Quais são as dificuldades com orçamentos de obras?

Assertividade das estimativas orçamentárias constitui um desafio complexo e estratégico para as construtoras e incorporadoras. Confira recomendações de especialistas para preservar os resultados dos empreendimentos

Publicado em: 27/06/2024

Texto: Eric Cozza

Diagrama mostrando as dificuldades com orçamentos de obrasLigação direta com as etapas de análise de viabilidade do empreendimento, planejamento e controle de obra tornam a função do orçamentista estratégica para os resultados de construtoras e incorporadoras. Saiba quais são os maiores desafios encontrados por esses profissionais no cenário atual da construção civil (Imagens: Pixabay; montagem: Cozza Comunicação)


Exigências crescentes de assertividade, instabilidade dos preços de insumos, escassez e encarecimento da mão de obra, baixo detalhamento dos projetos e falta de profissionais habilitados para orçar com a metodologia BIM (Building Information Modeling). Esses são alguns dos novos desafios encarados pelos orçamentistas na construção civil.

Ficou no passado a ideia equivocada de colocar qualquer profissional para operar um software que multiplica quantidades, levantadas a partir de projetos 2D, com preços, consumos e índices de produtividade extraídos de uma tabela padrão de mercado.

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Não há mais espaço para o que mercado costuma chamar de planilheiros, ou seja, leigos que, sem conhecimento técnico ou vivência de obra, se limitam a operar sistemas disponíveis no mercado. A realidade, hoje, é bem mais complexa e exige profissionais habilitados em engenharia de custos.

A forte ligação do orçamento com as etapas de análise de viabilidade de empreendimentos, planejamento e controle de obras tornam a função ainda mais estratégica. Mais quais são, hoje, as maiores dificuldades desses profissionais no dia a dia das construtoras e incorporadoras?

1) FALTA DE DETALHAMENTO DOS PROJETOS

Obras que são iniciadas com projeto executivo detalhado, infelizmente, são exceção no Brasil. Enquanto em países desenvolvidos a praxe é entrar no canteiro com tudo previsto e planejado, apenas para executar, por aqui, não é incomum ver obras começarem com projeto básico.

Este é um dos principais desafios enfrentados pelos orçamentistas de incorporadoras e construtoras. “Um bom projeto é a base de um orçamento assertivo”, afirma o engenheiro civil Vilberty Vasconcelos, consultor, professor e especialista em orçamentos de obras. “A margem de erro está vinculada ao nível de detalhamento do projeto elaborado. Se for um anteprojeto, sem muitos detalhes, o orçamentista terá que fazer simplificações que, certamente, trarão distorções”, completa.

Em resumo, quando se dispõe de um projeto com nível executivo, as dúvidas são minimizadas e o profissional consegue definir os serviços, materiais e custos mais próximos da realidade da obra.

“As etapas anteriores ao projeto acabam ocupando um espaço muito grande no ciclo do empreendimento”, explica Chrys Barros, gerente da área técnica da Trisul e responsável pelos orçamentos, planejamento, custos, logística e mão de obra própria da construtora e incorporadora. “Se conseguirmos enxugar um pouco e definir o produto mais rápido, é possível detalhar mais os projetos e os orçamentistas vão entregar algo com maior assertividade”.

2) DIFICULDADES PARA ORÇAR COM BIM

A metodologia BIM avança em todos os segmentos e disciplinas na construção civil. E, junto com as inegáveis vantagens, avanços e facilidades proporcionadas para as empresas e os profissionais, surgem também novos desafios. “A possibilidade de realizar diversas simulações, trabalhar com projetos compatibilizados e quantitativos mais próximos da exatidão permitem reduzir os custos de obra, minimizar incertezas e desperdícios”, afirma Vasconcelos.

O problema é que muitos profissionais ainda não tiveram a oportunidade ou a possibilidade de se capacitarem para o uso da metodologia. “As novas gerações, que já tiveram a chance de entrar em contato com os sistemas BIM na faculdade, estão mais preparadas”, revela Chrys, da Trisul. “Alguns profissionais experientes ainda não se deram conta da importância de se habilitar para compreender a modelagem, saber extrair quantidades em 3D e aprender a fazer simulações que já são fundamentais em nosso trabalho”, complementa.

O recado, portanto, é claro: profissionais com experiência em engenharia de custos e capacitação em BIM serão cada vez mais valorizados no mercado.

3) ESCASSEZ E MÃO DE OBRA MAIS CARA

A falta de operários e profissionais de campo em diferentes especialidades tem sido uma das principais dores da construção civil, com perspectivas de agravamento se o volume de obras permanecer no mesmo patamar atual. E a nova realidade já está expressa nas estimativas orçamentárias das empresas.

“Não importa se tenho um preço fechado com o subempreiteiro e previsto no orçamento. Muitas vezes, pouco antes de iniciar, eles pressionam para aumentar os valores, com acréscimos que chegam a 30%”, revela Chrys. “Isso quando não abandonam a obra no meio”. A situação tem sido tão crítica que muitas construtoras estão revendo a política de terceirização.

A Trisul, por exemplo, decidiu ‘internalizar’ equipes de execução de estrutura, fachada e instalações, contratando diretamente os trabalhadores. “A mão-de-obra própria pode até custar um pouco mais caro por conta dos encargos trabalhistas, mas evitamos os problemas de abandono e conseguimos uma produtividade maior, com a garantia de entrega dos serviços”, justifica Chrys.

4) INSTABILIDADE DOS PREÇOS

A forte pressão nos preços dos insumos da construção, registrada principalmente entre 2020 e 2022 – período da pandemia da Covid-19 – arrefeceu em 2023 e alguns custos refluíram, mas sem retornar aos patamares anteriores. “A regressão foi muito tímida, se compararmos com os aumentos ocorridos”, afirma Vasconcelos.

O ciclo de inflação setorial deixou marcas em muitas empresas, em alguns casos, irreversíveis. “Observamos naquela época quebras de orçamento da ordem de 15%. Algumas empresas não resistiram e acabaram simplesmente fechando”, revela a gerente da Trisul. Na visão da engenheira, já se observa um novo movimento de alta em alguns materiais. “Há um boom de obras e já recebemos alguns comunicados de mudanças de preços em insumos relevantes”.

Como o ciclo dos empreendimentos é longo, o intervalo de tempo entre a preparação do orçamento e o efetivo desembolso da construtora pode ser de alguns anos. Por isso, variações inesperadas ou momentos de instabilidade são desafiadores para os profissionais da engenharia de custos.

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5) USO INDISCRIMINADO DE BASE DE DADOS DE MERCADO

Bases de dados como o TCPO (Tabela de Composições e Preços para Orçamentos), o Sinapi (Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil), ou o Sicro (Sistema de Custos Referenciais de Obras) são ferramentas úteis para os orçamentistas. Devem, entretanto, ser usadas como referência e não de maneira indiscriminada. Caso contrário, podem gerar distorções relevantes.

“É um dos piores erros que se pode cometer em orçamentação. É o tipo de situação que separa os orçamentistas dos planilheiros”, dispara Vasconcelos. “Nunca se deve utilizar uma composição de tabela sem antes averiguar a aplicabilidade com a obra e a cultura da empresa”, recomenda o especialista.

A elaboração de um orçamento sem aderência com as práticas construtivas da companhia resulta em valores meramente teóricos, sem nexo com a realidade. “As bases são importantes, principalmente quem está aprendendo o ofício, para não esquecer nenhum detalhe”, observa Chrys. “Mas os índices de produtividade, perdas e consumos têm que ser apurados e devem refletir a prática da construtora”, ressalva a engenheira.

6) FALTA DE VIVÊNCIA DE OBRA E CONHECIMENTO TÉCNICO

Este item está intimamente ligado ao anterior. Sem experiência de canteiro e formação técnica, o risco de o orçamentista se descolar da realidade na preparação de uma estimativa é muito grande.

“Iniciei minha carreira em suprimentos, fiquei um tempo em obras e depois fui para a área de orçamento. Essa bagagem foi muito importante para mim”, afirma Chrys. “Também tive, em algumas empresas, a oportunidade de preparar o orçamento e depois, junto com o gerente da obra, acompanhar contratação dos itens da Curva A. Isso me retroalimentava para os empreendimentos seguintes”.

Ficar preso dentro do escritório, portanto, limita o potencial do orçamentista. “Viver uma obra na prática ajuda o profissional que atua com orçamentação a enxergar tudo aquilo que não está no projeto, mas que gera custo para a construtora e precisa ser orçado”, afirma Vasconcelos. “Também recomendo capacitação e treinamento, não apenas sobre orçamentação, mas também sobre boas práticas construtivas e BIM”, conclui o engenheiro.

Colaboração técnica

Vilberty Vasconcelos – Engenheiro civil, mestre em engenharia ambiental e pós-graduado em metodologia do ensino na educação superior, gestão financeira no setor público e energias renováveis. Fundador da Brain Builder Engenharia Consultiva, é especialista em orçamento de obras de edificações, infraestruturas, saneamento, área energética e de transportes. Atua como consultor em implantação de BIM 5D e é professor em pós-graduação nas disciplinas de orçamento convencional e orçamento BIM 5D.

Chrys Barros – Especialista em propostas, orçamentos, custos e planejamento, atuou em todos os segmentos de obra. Experiência em construtoras importantes no mercado, tais como Fonseca & Mercadante, Yuni Incorporadora, Método Potencial Engenharia, Hochtief do Brasil (atual HTB) e Bueno Netto. Hoje é gerente da área técnica (orçamentos, planejamento, custos, logística e mão de obra própria) da Trisul.