Quem não ouviu falar de Jatobá, o cego de bem com a vida, que surfava e praticava esportes, interpretado pelo ator global Marcos Frota, que juntamente com o cão Quartz, desvendou na novela América para o país o universo dos deficientes visuais. Na verdade Jatobá representava, uma parcela da população brasileira, que apresenta algum tipo de deficiência (mental, múltipla, visual, física, auditiva), ou apresenta algum tipo de mobilidade reduzida (idosos, pessoas obesas ou com próteses, aparelhos de apoio, cadeiras de rodas, bengalas, muletas e andadores). Esta parcela da população representa mais de 25 milhões de brasileiros que deixam de exercer sua cidadania e seu direito de ir e vir para trabalhar, estudar, passear, obter moradia acessível e etc. Tudo isto, decorrente de preconceitos por parte da população, que muitas vezes, trata o deficiente como um incapacitado, e principalmente, por decorrência de barreiras urbanas, ambientais, arquitetônicas, nos transportes coletivos e nos sistemas de comunicações, que impedem a acessibilidade.
A acessibilidade deve ser levada a todos os cidadãos Brasileiros, independente de sua estatura, idade ou tipo de deficiência, de forma adequada, segura e autônoma. Muita coisa tem sido feita pelo Governo Federal para difundir e aplicar a acessibilidade plena em vias, espaços públicos, mobiliário urbano, na construção, ampliação e reforma de edifícios, nos meios de transporte e de comunicação. O Brasil dispõe atualmente de avançada legislação a respeito do tema, possuindo inclusive uma Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência - CORDE, responsável pela gestão de políticas voltadas para integração da pessoa portadora de deficiência no país. O Senado Federal, sobre a tutela de nosso nobre Senador Renan Calheiros, dispõe de uma subcomissão de acessibilidade. As principais legislações em vigor são: Decreto 5.296/12/2004 que estabelece as normas gerais de acessibilidade no país; a norma NBR 9050/2004, que rege a acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos, assim como, a lei NBR 15.250/04/05 que regulamenta a acessibilidade em caixa de auto atendimento bancário, e recentemente, a lei 11.126/06/0, que dispõe sobre o direito do portador de deficiência visual de ingressar e permanecer em ambientes de uso coletivo acompanhado de cão-guia, entre outras leis importantes, que não caberia aqui nestas linhas. Outros avanços são visíveis no campo da acessibilidade como a utilização de Portais na “Web” que já dispõem de recursos audiovisuais para deficientes visuais e auditivos. O sistema “Close Caption” utilizado por algumas emissoras de TV, também é por assim dizer um avanço, levando informação a todos os brasileiros independente de sua deficiência, assim como, o uso da linguagem Braille em livros de grandes obras nacionais e mundiais, em bulas de remédios, produtos alimentícios e etc. Outra novidade é o uso da linguagem de sinais, em seminários de instituições e empresas públicas e privadas do País. O Governo Federal já estuda a confecção de um selo de acessibilidade, para empresas que difundam tecnologias acessíveis a todos os cidadãos.
Segundo o decreto 5.296/12/2004, toda edificação deve e tem que ser baseada nos princípios de desenho universal, ou seja, acessível a todo e qualquer cidadão independente do tipo de deficiência que o mesmo apresenta.Observa-se que todos os planos diretores e de transporte elaborados ou atualizados, a partir data de publicação deste decreto, devem se adequar ao desenho universal. No entanto, mais especificamente, o que se tem feito no ramo do mercado imobiliário Brasileiro, e o que será necessário para que as empresas deste setor de atendam plenamente a legislação vigente no país?. No âmbito local observa-se que, pouco se investe neste sentido. Acredito que por falta de desconhecimento de alguns projetistas, ou por falta de visão das empresas do ramo, que desconsideram estes condicionantes em seus empreendimentos. É necessário alertarmos para as construtoras de loteamentos e edificações, que projetar e construir com acessibilidade, além de ser atualmente uma lei que deve ser cumprida, é uma questão de inclusão social, com irrisório custo de implantação e grandes benefícios sociais.
No âmbito dos loteamentos, observa-se que as calçadas devem ser projetadas com rampas e piso tátil de alerta para obstáculos como telefones públicos, postes, bancos e lixeiras, para que o deficiente visual não venha a sofrer seqüelas decorrente de choques com estes equipamentos urbanos. Além destas, outras medidas previstas na norma NBR 9050/2004 devem ser seguidas. No que tange a edificação, sejam públicas ou não, todas as áreas de uso coletivo devem ser acessíveis. Infelizmente, esta não é a realidade encontrada na no mercado imobiliário. Acessibilidade não é apenas incluir uma rampa de cadeirante (na maioria fora de norma) na calçada, como se tem visto, em todos os lugares. Faz-se necessário que as edificações dimensionem suas calçadas e rampas adequadamente dentro e fora do prédio para receber o seu cliente e futuro proprietário. Internamente todos os corredores, elevadores e portas devem ser dimensionados para atender esta parcela da população. No caso dos elevadores, além da botoeira em Braille, deve ser previsto sinal sonoro e identificação visual de cada andar. Todos os ambientes do edifício como portarias, salões, hall de acesso, salão de festas e reuniões, salas de recreação, saunas e banheiros, área para churrasqueira, piscinas, quadras esportivas, elevadores, salas de ginástica, sala de meditação, sala do condomínio, pracinhas, escadas, e outras partes de uso coletivo, devem ser adaptadas para acessibilidade ao portador de deficiência. No caso das garagens e estacionamentos, as construtoras devem prever percentuais pré-estabelecidos na norma vigente para quantidade de vagas adaptadas.
E não pensem que a acessibilidade na construção civil, atinge apenas a especialidade de arquitetura, mais praticamente todas as outras disciplinas que envolvem o projeto (civil, elétrica, eletrônica, mecânica, hidráulica). Na medida em que, interruptores, campainhas, interfone e telefones, quadros, registros, válvulas de descarga, lavatórios e pias, comando de janelas, maçanetas de portas, torneiras e etc, devem ter suas alturas e mecanismos de acionamento adaptados para atender além do usuário comum o portador de deficiência. Outro ponto importante diz respeito as mobiliários que também devem ser acessíveis (balcões, cadeiras, bancos, mesa e etc...), e que são pouco explorados por nossos decoradores e arquitetos.
Em fim, a acessibilidade com o Decreto 5.296/12/2004, deixa de ser uma exceção e passa a ser uma regra para edificações que apresentam áreas coletivas. Segundo este decreto as edificações já construídas têm de 30 a 40 meses, a partir de sua publicação, para adaptarem as condições de acessibilidade do desenho universal, previsto na NBR 9050/2204. Este prazo já está expirando daqui a pouco. Já as futuras devem ser projetadas dentro deste conceito. No âmbito local, se as nossas construtoras adotassem o mais rápido possível, todos os princípios da acessibilidade a seus projetos. E não apenas o mínimo. São Paulo mais uma vez seria vanguarda na construção civil do país, haja vista nossas construtoras já serem bastante reconhecidas nacionalmente, pela qualidade dos produtos que oferecem ao mercado local e nacional. Além disto, mais do que um exemplo de diferencial de mercado, será um belo exemplo de como as empresas do setor podem contribuir para a inclusão social de milhões de pessoas que assim como Jatobá da novela da Globo, necessitava de acessibilidade plena, para viver dignamente com cidadania.