O papel da iluminação nas cidades
A opinião de Paulo Candura, diretor do Departamento de Iluminação da Prefeitura de São Paulo.
Entrevista: Paulo Candura
Redação AECweb
O conceito de iluminação pública, antes vinculado a serviço e segurança nas cidades, se ampliou para abranger o embelezamento e a valorização dos aspectos urbanos. Nesse sentido, a realização dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro deverá ser um marco para o segmento em todo país. “Haverá uma transformação urbanística nas cidades e, aí, se verá o papel fundamental da iluminação. Talvez seja o menor investimento, mas é o que mais aparece”, afirma em entrevista ao AECweb o engenheiro Paulo Candura, diretor do Departamento de Iluminação da Prefeitura de São Paulo. Segundo ele, até 2012 o plano de metas para a cidade é o de, com recursos próprios ou do Programa Reluz do governo federal, atualizar 260 mil pontos de luz na cidade.
AECweb - Qual o papel é o papel da iluminação pública nas grandes cidades?
Paulo Candura - A definição de iluminação pública está ligada a prover de luz os logradouros públicos ao escurecer. O conceito nasceu da simples observação de objetos e se ampliou para uma questão mais ampla, a da cor, e incluiu não só a questão de se observar, de identificar pessoas, mas o embelezamento, o trato visual de fachadas à noite, incluindo a valorização histórica. Ela tem o seu papel de incrementar o turismo, uma vez que com o emprego da luz artificial se estimula o uso das vias públicas em horas mais avançadas - e por isso é um serviço diretamente ligado à questão da segurança. Não vou dizer que a iluminação reduz os índices de criminalidade, mas é um instrumento muito importante para coibi-la.
AECweb - Em São Paulo, a iluminação pública cumpre com esse papel?
Paulo Candura - Aqui, por conta do tamanho da cidade a iluminação pública consiste basicamente na questão da iluminação de vias. Só recentemente se começou a usá-la para destacar obras - não só escultura, mas a arte da construção civil, as fachadas, os monumentos. Sendo uma cidade muito grande, São Paulo privilegiou a questão da funcionalidade em detrimento do aspecto estético. A lei da Cidade Limpa revelou uma nova metrópole atrás dos letreiros. A imagem que se tem de São Paulo é que é cinza, mas sem a poluição visual a cidade se mostrou com prédios muito bonitos, com valor histórico e arquitetônico consideráveis. Com isso, o aspecto turístico começa a ser valorizado. Recentemente, no Centro, isso já começou com a iluminação no Prédio das Arcadas, histórico, cujo nome advém da ligação com a Faculdade de Direito e a fachada do Tribunal de Justiça. Isso já permitiu destacar a diferença da antiga poluição visual para a cidade que tem cor e que mostra a sua cor.
AECweb – Qual o ponto de partida para a iluminação de uma cidade?
Paulo Candura - A iluminação de destaque não pode ser feita aleatoriamente, exige um plano de metas para que seja formado um conjunto. Também não se pode tentar mudar muito o que o autor da fachada quis destacar. É preciso valorizar. Em São Paulo, ações isoladas estão sendo feitas e existe a intenção de se mexer na iluminação do Centro, mais isso tem que ser feito de forma planejada. É preciso caminhar passo a passo, atendendo a uma demanda da população que pleiteia segurança. É preciso ver, antes, o que a população precisa.
Obelisco do Ibirapuera
AECweb - A cidade de São Paulo está 100% iluminada?
Paulo Candura - Não diria 100%, faltam alguns pequenos ajustes e complementos na oferta do serviço. Em termos de quantidade, a iluminação é boa. Mas, se considerarmos a qualidade, em torno de 60% das lâmpadas da cidade precisariam ser substituídas.
AECweb - Por quê?
Paulo Candura - Na cidade São Paulo, o maior problema é a sua dimensão - praticamente duas Nova Yorks. Foi só por volta de 2002 que uma emenda constitucional criou a contribuição para custeio de iluminação pública, que permitiu aos municípios cobrarem – e, hoje, você e eu pagamos isso na conta de luz. Só assim se passou a ter a disponibilidade recursos. Mas, pela falta de dinheiro, a iluminação dos parques, cuja média é de 35 anos de vida, está ultrapassada. Ela começou a ser substituída parcialmente através do Programa Nacional de Iluminação Pública e Sinalização Semafórica Eficientes – Reluz, da Eletrobrás que tem apoio do Ministério de Minas e Energia. Há, também, recursos próprios da Prefeitura.
AECweb – Então, há recursos?
Paulo Candura - O Reluz foi suspenso entre o governo municipal e o governo federal, por uma questão técnica. Hoje, em praticamente metade da cidade os equipamentos foram substituídos de vapor de mercúrio por vapor de sódio. Mas, faltam pelo menos outros 50%. Teoricamente as lâmpadas de sódio são mais eficientes. Até 2012, o plano de metas para a cidade é o de, com recursos próprios ou do Reluz, eficientizar 260 mil pontos de luz, de um total de 590 mil. Para isso são necessários R$ 286 milhões.
AECweb - Há dados que mostram a redução da criminalidade em bairros iluminados?
Paulo Candura - Existe uma discussão sobre promover a iluminação e reduzir a criminalidade. Na verdade, aumentar ou não a iluminação não diminui a criminalidade. Se fosse assim, durante o dia não teríamos assalto. Alguns estudos concluem que num primeiro momento em que se implementa a iluminação, há redução significativa. Concordo que aumenta a sensação de segurança, é um facilitador até para se ter uma visualização maior, uma atividade fiscalizadora por conta da polícia. Mas que iniba, não tenho nenhum dado que comprove efetivamente isso.
AECweb - O que há de novo em tecnologia para a iluminação pública eficiente?
Paulo Candura - Saímos de um período da predominância da iluminação de mercúrio, que está defasada, e passamos para a de sódio, mais eficiente, que gera mais lumens por watt. E, hoje, a tecnologia leva para o uso do LED - Lightning Emissor Diod - um diodo emissor de luz, um componente eletrônico semicondutor. O funcionamento do LED é relativamente simples: ao receber energia, ele emite luz. Diferentemente da maioria dos componentes eletrônicos que liberam energia através do calor, o LED consegue liberar a energia excedente na forma de luz. Não é barato, até porque tecnologia nova não é barata. Mas é algo muito eficiente, que proporciona muita luz com pouca potência. É a coqueluche hoje. Em São Paulo já está sendo testada no Centro. Há algumas unidades em ruas como a da Quitanda, Barão de Itapetininga, Rua Boa Vista, e na avenida Pedro Álvares Cabral, em frente à Assembléia Legislativa. Sem dúvida nenhuma é o futuro.
AECweb – E quanto ao aspecto da luz emitida?
Paulo Candura - A lâmpada de mercúrio é problema na questão da reprodução de cor. Praticamente monocromática, ela faz com que o verde fique marrom. Há alguns anos, estamos numa fase de emprego de lâmpadas de vapor metálico, que também é luz branca e bastante utilizada. Sou muito crítico dentro dessa questão de ser ou não ser eficiente. Existe a discussão sobre ser ou não sustentável. De certa maneira, o LED tende a se tornar muito mais eficiente do que a lâmpada de descarga convencional, de sódio ou a lâmpada metálica. Ela pode ser usada na temperatura de cor que se quer – entre as lâmpadas fluorescentes, algumas são mais azuladas, outras são mais brancas, outras mais amareladas. O LED permite essa facilidade. A gama de variação é maior.
Tribunal de Justiça
AECweb - E quanto à questão do mercúrio na natureza?
Paulo Candura - A lâmpada de mercúrio tem mercúrio. Mas a lâmpada de sódio tem tanto ou mais mercúrio que a própria lâmpada de mercúrio. E o LED, se não possui metal pesado como as lâmpadas de descarga, ele também gera o lixo tecnológico. O problema é: como reciclar? A questão de ser eficiente, ou não, só é analisada quanto a partir do momento em que ela é posta na rua. Mas quanto é gasto de energia para produzi-la, isso é levado em conta? Na fabricação da plaquinha do LED, há um processo 100% energético. E quanto é gasto de energia em todo o processo produtivo? Isso ainda não foi posto na ponta do lápis. É sustentável ou não? Para nós, é considerado o uso na rua, ou seja, estou trocando uma tecnologia por outra mais eficiente, que ilumina mais e pela qual se paga menos pela energia. Esse é o conceito que nós adotamos de iluminação e é o conceito adotado em todo mundo.
AECweb – É a mesma conduta do consumidor?
Paulo Candura - Sim, ele tira a lâmpada incandescente e põe uma fluorescente compacta. Qual o raciocínio? Ele gastou um pouco mais de dinheiro, mas a lâmpada vai reduzir a sua conta de energia em 20% ou 30%. O investimento é pago em alguns meses e ele passa a gastar menos na conta de energia. Mas, o processo em si não é totalmente isento. O consumidor faz a conta a partir do seu ponto de vista. Também é dessa maneira que é feito o cálculo na iluminação pública.
AECweb - Como equacionar o problema?
Paulo Candura - Atualmente, a lei de crimes ambientais obriga a fazer o descarte técnico de todo o material. Hoje, a Prefeitura paga para fazer o descarte. Compramos a lâmpada e pagamos para fazer o descarte. O entendimento que se tem da lei - não sei é correto ou não - é que o gerador do resíduo tem que se responsabilizar pelo descarte. O que se está tentando hoje é que não se faça como antigamente, em que se varria a calçada e jogava sujeira para o vizinho. Jogava-se o material de um Estado para outro. Mas o CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente - está para aprovar uma legislação federal, em que o ônus deverá ser dos fabricantes.
AECweb – O custo de operação também é considerado?
Paulo Candura - Para medir a eficiência também são considerados aspectos como custo de operação e implantação. Ao se colocar uma luminária nova, de última geração e que tem mais rendimento, e se agrega uma lâmpada de alta eficiência, tem-se um sistema eficiente. Como medir isso? Em dois aspectos: na redução da conta de energia e na melhoria da qualidade em si. A questão da operação não é medida e deveria ser. A operação consiste em manutenção do sistema, basicamente fazer funcionar e trabalhar os ligamentos e desligamentos. Monitorar a rede e aumentar a eficiência lumínica é iluminar mais e melhor. Eficiência é mais rendimento.
AECweb – As lâmpadas Cosmópolis, usadas na Ponte Estaiada, são uma boa opção para a cidade?
Paulo Candura - Essa é uma lâmpada de alta eficiência, custo operacional baixo e vida média elevada. Produz uma luz branca, próxima da aparência da incandescente. Não acho que as marginais Tietê ou Pinheiros devam utilizar a luz branca, até porque teoricamente, se usa a luz branca quando se quer privilegiar a estética. Essas são vias de caráter eminentemente funcional. Por exemplo, nas ruas João Cachoeira ou Oscar Freire, deve-se usar luz branca porque se tem um entorno a agregar, algo a mostrar, assim como o Centro de São Paulo e a Avenida Paulista. O grande apelo da luz branca é ter reprodução de cor: vermelho é vermelho, verde é verde.
AECweb - O selo Procel chegou à iluminação?
Paulo Candura - O selo é uma atitude louvável, correta e espera-se que ele traga melhoria por elevar o patamar de qualidade dos produtos. Todos os equipamentos elétricos, linhas de ar-condicionado e linha branca têm o selo Procel, o que assegurou um índice de confiabilidade que elevou o patamar de qualidade dos produtos. Infelizmente na questão das luminárias para iluminação pública, não temos ainda essa etiqueta, concedida somente para lâmpadas e reatores. Está em estudo essa abrangência, e acredito que no ano que vem deve estar formatada.
AECweb – Os Jogos Olímpicos devem promover a iluminação do Rio?
Paulo Candura - O efeito de uma Olimpíada transcende o assunto iluminação. Mas ela tem papel de destaque e o de destacar. Para realização dos jogos, será necessária uma transformação urbanística na cidade, um projeto de obras de infraestrutura muito grande. Talvez o menor investimento seja em iluminação, mas é aquilo que mais aparece. No Rio, há edificações da época da Monarquia e da República, do tempo que foi capital do País e que merecem um tratamento de luz para serem valorizadas. E, lembrando, que em 1998, o Rio definiu o primeiro plano urbanístico em que a iluminação pública foi inserida como mobiliário urbano, o que foi um avanço.
Redação AECweb