O que é taxa de armadura em estruturas de concreto armado?
Consumo de aço pode ser calculado em relação ao volume de concreto empregado ou à área construída do empreendimento. Número é relevante não apenas para o custo da obra, mas também para a segurança, qualidade e desempenho
Não dá para conceber um projeto estrutural baseado em uma taxa de armadura, que é consequência final do processo de elaboração e compatibilização. Projetista deve oferecer a melhor solução em termos de custos, o que não significa, necessariamente, a mais barata de imediato. Estimativa deve contemplar os gastos durante todo o ciclo de vida do empreendimento, incluindo a fase de manutenção (Imagem: Shutterstock)
A definição da taxa de armadura, ou seja, a área de aço dividida pela área de concreto, em lajes, vigas, pilares ou elementos de fundações, é um dos vários fatores a serem considerados para a segurança estrutural de um edifício. Mas, como equilibrar desempenho, qualidade e, ao mesmo tempo, otimização dos custos?
Há quem fale em números mágicos das estruturas de concreto, mencionando, por exemplo, entre 80 a 100 quilogramas por metro cúbico de concreto para lajes maciças, vigas e pilares. Será que tais referências fazem sentido?
Muitos preferem fazer a conta do consumo de aço em relação à área total construída em metros quadrados e não pelo volume de concreto, em metros cúbicos. O critério adotado costuma variar conforme a localidade ou região do País.
Para tirar dúvidas a respeito da taxa de armadura, nós convidamos para o podcast AEC Responde o engenheiro civil e projetista de estruturas, Francisco Paulo Graziano, sócio-diretor da Pasqua e Graziano Associados.
Em outubro, ele recebeu em Dallas, nos Estados Unidos, um prêmio do American Concrete Institute pelo projeto estrutural do Edifício Faria Lima Plaza, construído em São Paulo. Confira abaixo a entrevista.
AECweb Responde – O que é taxa de armadura em estruturas de concreto armado e como deve ser definida? Há números mágicos ou de referência?
Francisco Paulo Graziano – Costumo brincar dizendo que são números mágicos, porque não dá para conceber um projeto estrutural baseado em uma taxa de armadura, que é consequência final de todo o processo de elaboração e compatibilização. Ou seja, é resultado da coordenação do projeto como um todo, de todas as disciplinas envolvidas, para chegar ao final com uma obra adequada. Mas vamos lá. Eu acho interessante essa discussão porque é uma expectativa do mercado. É algo que os profissionais sempre têm em mente. Eu costumo lembrar que a taxa de armadura é a relação entre consumo de aço, em massa, por alguma outra grandeza que faça parte da realidade do que estamos para construir ou do que já executamos. Pode ser, portanto, um elemento de previsão ou algo constado depois, com a verificação final em relação ao consumo. Em geral, usamos a área a ser construída como o denominador dessa fração. Porque, no fundo, é aquilo que nós vamos realmente obter: a área a ser utilizável. Vamos chegar, então, em uma taxa que é medida em quilos por metro quadrado. É um número que eu considero mais lógico quando você está preocupado com o custo global da obra. Ou seja: quantos quilos de aço serão consumidos por metro quadrado construído.
“Com o controle das taxas por metro cúbico, você consegue detectar quais os elementos estruturais que estão consumindo mais aço. E poderá ir atrás dos motivos ou até dos desvios que podem acontecer em muitas obras”Engo Francisco Paulo Graziano
AECweb Responde – Nesse caso, a referência é a área construída como um todo e não apenas o volume de concreto.
Graziano – Há também uma lógica associada à taxa por metro cúbico. Em algumas regiões do Brasil como, por exemplo, a cidade de São Paulo, é o mais comum. Talvez seja devido à forma como é contratado o empreiteiro de mão de obra para a execução de estruturas na capital paulista, que é por metro cúbico. Sabemos, ao estudar um pouco o assunto, que a razão de determinar a taxa por metro cúbico é a possibilidade de separar os consumos. Por exemplo, vamos pensar em estrutura convencional: laje, viga e pilar. As lajes costumam ter uma faixa de consumo que vai de 45 kg a 65 kg por metro cúbico. Lógico que isso varia, mas podemos considerar como a maioria dos casos. Falando de números nessas obras habituais, mais comuns: vigas entre 135 a 180 kg por metro cúbico e pilares entre 80 a 300 kg. Por que um intervalo tão grande no caso dos pilares? Porque temos peças pouquíssimo carregadas, por exemplo, nos andares mais altos e outros pilares supercarregados nos pavimentos inferiores. Há também taxas de consumo mínimo que são estabelecidas por norma. Você não pode armar com menos do que uma determinada quantidade de centímetros quadrados de armadura por seção. Com o controle das taxas por metro cúbico, você consegue detectar quais os elementos estruturais que estão consumindo mais aço. E poderá ir atrás dos motivos ou até dos eventuais desvios que podem acontecer em muitas obras. Mas, globalmente, quando você olha a estrutura como um todo, as taxas costumam ficar entre 80 e 110 quilos. Claro que, se for uma obra emblemática, complexa, essa taxa de armadura pode estourar para valores superiores a 110 kg. Mas seria algo fora do que estamos habituados a fazer no dia a dia.
“O interessante, portanto, é tentar manter a taxa média por metro quadrado estável e, ao mesmo tempo, otimizar o consumo de concreto, a partir de uma outra grandeza, que é a espessura média, ou seja, o volume de concreto consumido pela mesma área”Engo Francisco Paulo Graziano
AECweb Responde – O aço é um dos principais componentes do concreto armado e possui um impacto relevante no custo total da estrutura. Como otimizar esse gasto sem prejudicar o desempenho ou a segurança?
Graziano – A otimização é uma tarefa árdua e complexa. Envolve uma certa contrariedade. Por um lado, precisamos garantir segurança. Mas devemos atender também às necessidades de uso da arquitetura, do cliente e do produto. É uma pressão muito grande. Há também os prazos e a qualidade. E existe, claro, a necessidade do construtor em obter um custo adequado, capaz de garantir a viabilidade econômica do empreendimento. Então, é sempre um cabo de guerra, no qual se deve buscar o equilíbrio. E o número de soluções para uma mesma tipologia arquitetônica pode ser muito grande. Quando nós, projetistas, entramos no processo e propomos algumas soluções de partido estrutural, elas já têm um potencial, maior ou menor, de consumo de aço e de concreto. Estamos aqui abordando a questão da taxa de aço, mas devemos lembrar que ela está associada ao volume de concreto. Se aumentarmos muito o volume de concreto, normalmente, a taxa de armadura por metro cúbico tende a cair. Mas a taxa média por metro quadrado se mantém aproximadamente estável. Isso pode acontecer, de fato. O interessante, portanto, é tentar manter a taxa média por metro quadrado estável e, ao mesmo tempo, otimizar o consumo de concreto, a partir de uma outra grandeza, que é a espessura média, ou seja, o volume de concreto consumido pela mesma área. É uma luta diária para tentar manter as coisas dentro de um certo padrão. Depois desses estudos de viabilidade aprovados, o projeto vai evoluindo e as taxas de consumo de concreto ou de aço, normalmente, ficam relativamente estáveis, porque a própria arquitetura acaba definindo alguns limites. Todas as inserções que vierem no futuro, em geral, acabam levando a um aumento em relação àquela primeira estimativa estabelecida pelo projetista. Furações, por exemplo, costumam aumentar as taxas de armadura em vigas e lajes. Um número elevado de interferências durante o processo de coordenação do projeto acaba empurrando coisas novas que não estavam no radar do projetista estrutural, que levarão a maiores consumos.
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Quais são os cuidados na montagem das armaduras de concreto?
AECweb Responde – Então, como o projetista estrutural deve reagir a eventuais pressões, que são legítimas até certo ponto, da construtora ou da incorporadora, para a redução do consumo de aço na estrutura?
Graziano – O cobertor é curto. Você precisa oferecer a melhor solução de custo para o seu cliente. Isso não quer dizer que ela seja a mais barata de imediato. A visão de custos não pode ser imediata. É importante saber quanto vai se gastar ao longo dos próximos anos por conta de uma decisão que estou tomando hoje. Ou seja, avaliar os gastos tanto durante o processo construtivo quanto depois da entrega, na fase de manutenção. O custo tem que ser encarado de uma maneira mais ampla. Evidente que isso depende muito da cabeça do empresário que está contratando o projeto. Alguém com mais experiência possui a consciência de que o ciclo do negócio é mais...como diria...
“Como profissionais, devemos ponderar todas as necessidades que estão em jogo, mas preservando sempre a boa técnica e o respeito às normas vigentes. Porque isso acaba tendo força de lei no julgamento de uma não conformidade e aí os prejuízos podem ser imensos”Engo Francisco Paulo Graziano
AECweb Responde – ... longo e não se limita à entrega da obra.
Graziano – Exato. Infelizmente, às vezes, existem empresários oportunistas, que não são do ramo. Eles costumam exercer uma pressão muito forte sobre o projetista em relação ao custo. Porque, no fundo, eles não estão pensando em se perpetuar naquela área. É alguém que vai entrar e sair rápido. Mas, para nós que somos do setor, é importante pensar em termos mais perenes, ou seja, em produzir obras que permaneçam por um bom período em uso, sem grandes índices de manutenção, com um custo adequado para o cliente final – lembrando que é ele quem vai arcar com tudo isso. As garantias terminam, mas a obra permanece na cidade, sendo utilizada. Precisamos ter essa visão do conjunto. Como profissionais, devemos ponderar todas as necessidades que estão em jogo, mas preservando sempre a boa técnica e o respeito às normas vigentes. Porque isso acaba tendo força de lei no julgamento de uma não conformidade e aí os prejuízos podem ser imensos. Em um empreendimento muito grande, uma ocorrência grave pode ser catastrófica para a empresa. Imagine uma obra com problema de colapso. Para a sociedade, é algo simplesmente absurdo. Envolve vidas humanas e destrói empresas. É um assunto complexo, que deve ser tratado sempre com muito cuidado.
AECweb Responde – Há diferentes sistemas construtivos que empregam concreto, desde a estrutura convencional, passando pela alvenaria estrutural, paredes de concreto até os pré-fabricados. Há variações relevantes em relação à taxa de armadura para essas tecnologias?
Graziano – Há, sim. No caso do pré-fabricado ou pré-moldado, dependendo das condições de montagem, transporte e do próprio dimensionamento, é necessário trabalhar com mais aço, para poder fazer frente a esses momentos. Imagine uma peça sendo transportada da fábrica em um caminhão ou, ainda, ela própria sendo articulada, com pneus. Pense na estrutura da viga ou do pilar funcionando como chassi e imagine os esforços que vão ocorrer até a peça chegar ao destino. Há também o içamento, no qual ela pode ser solicitada de uma maneira extremamente desfavorável. Então, em geral, as estruturas pré-fabricadas consomem mais aço do que as convencionais, que são todas concretadas sobre um escoramento, sobre fôrmas – estão, portanto, apoiadas completamente, sob zero esforço durante esse processo. Essa é uma grande diferença que eu posso citar mas, desde o sistema convencional, passando pela laje plana e a parede de concreto – uma tecnologia que está andando muito bem – você vai ter diferentes consumos de aço e de concreto.
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Colaboração técnica
- Francisco Paulo Graziano – Sócio-diretor da Pasqua e Graziano Associados, onde realizou e coordenou mais de 4 mil projetos estruturais. Engenheiro civil formado pelo Instituto Mauá de Tecnologia e mestre em engenharia de estruturas pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Foi professor do Departamento de Estruturas da Poli-USP (1979 a 2015) e relator da Comissão de Revisão da Norma de Projeto de Estruturas de Concreto – Procedimento publicado em 2003 – NBR 6118. Autor do livro “Projeto e Execução de Estruturas de Concreto Armado”.