Quais são as principais tendências e desafios da construção?
Diretor de pré-construção da Concremat, o Eng. Alexandre Dittert inicia atividades como membro do Conselho Consultivo da AEC Academy, área que reúne as iniciativas de educação do Portal AECweb
O Eng. Alexandre Dittert destaca que não é possível pensar em aumento de produtividade no setor sem levar em conta a necessidade de capacitação continuada de profissionais em diferentes níveis e áreas de atuação. “Vejo a educação e a formação contínua como investimentos estratégicos.” (Foto: Divulgação Concremat)
Sustentabilidade, transformação digital, industrialização, modularização e novas práticas de contratação e elaboração de projetos são algumas das principais tendências apontadas pelo diretor de pré-construção da Concremat, Eng. Alexandre Dittert, para o setor da construção civil nos próximos anos.
Na base de tudo, entretanto, estará sempre o ser humano. “A eficiência, a qualidade e a segurança de nossos projetos dependem significativamente das habilidades, conhecimentos e competências das pessoas envolvidas”, afirma o executivo. “Quando a nossa indústria avança, a força de trabalho também precisa evoluir.”
Alexandre Dittert é o mais novo membro do Conselho Consultivo da AEC Academy, área que reúne as iniciativas de educação do Portal AECweb. “Estou honrado pelo convite e muito animado para fazer parte desse Conselho”, revela o engenheiro. “Espero ver as empresas do setor divulgando a plataforma para qualificar seus funcionários e ficar a par das tendências e melhores práticas da construção.”
Nesta entrevista exclusiva, Dittert detalha as principais tendências e desafios do setor para os próximos anos. Confira a seguir:
“Acredito em uma demanda crescente por técnicas de modularização e pré-fabricação devido à capacidade de mitigar alguns dos pontos problemáticos tradicionais da construção”Eng. Alexandre Dittert
AECweb – Quais são as principais tendências do setor, ou seja, as vertentes estratégicas para a construção civil nos próximos anos?
Vejo algumas tendências significativas que, provavelmente, moldarão nossa abordagem estratégica nos próximos anos. Destaco a sustentabilidade. A crescente conscientização sobre o impacto ambiental das atividades de construção está levando o setor a explorar novos materiais e métodos sustentáveis. Isso inclui a diminuição das emissões de CO2 na produção de cimento. Na indústria siderúrgica, há o desenvolvimento de tecnologias que geram menos emissões e são eficientes energeticamente, como o aço verde. Destaque também para o aumento dos projetos de energia limpa e desenvolvimento de combustível proveniente do hidrogênio verde. Vejo o uso de materiais reciclados e o surgimento de uma economia circular, com projetos energeticamente eficientes e minimização de resíduos e desperdícios durante a obra. Enxergo também um aumento significativo na transformação digital, na conectividade e super automação integrada à inteligência artificial e aos dispositivos IoTs (Internet of Things ou internet das coisas). A indústria da construção civil está adotando cada vez mais as tecnologias digitais para otimizar a execução de seus projetos. Desde o BIM à realidade aumentada e o VDC (virtual design and construction). Tanto na engenharia quanto no planejamento, do monitoramento inteligente de canteiros de obras à digitalização da documentação e dos processos. Essas tecnologias estão transformando a maneira como trabalhamos e ajudando a aumentar a eficiência, reduzir custos e melhorar a qualidade das entregas. Ressalto também uma estratégia ágil de concepção e elaboração dos projetos de engenharia, uma contratação eficaz, em linha com as melhores práticas da AACE (Association for the Advancement of Cost Engineering) e do AWP (Advance Working Packing), adotando práticas de lean management e lean construction. Com isso, pode-se otimizar o tempo de entrega de um projeto em comparação a uma abordagem tradicional. Outra vertente importante: componentes modulares e pré-fabricados, quando associados a uma boa logística, podem aumentar consideravelmente a eficiência, reduzir o desperdício e os tempos de construção. Acredito em uma demanda crescente por técnicas de modularização e pré-fabricação devido à capacidade de mitigar alguns dos pontos problemáticos tradicionais da construção, como atrasos, altos custos de mão de obra e baixa produtividade.
AECweb – Com todos esses avanços, a necessidade de pessoal qualificado será maior...
Sem dúvida. Investir em treinamento e desenvolvimento de nossa força de trabalho é uma necessidade estratégica. Precisamos qualificá-los frente às demandas das novas tendências da indústria da construção.
“O capital humano, assim como a educação e a formação continuada de profissionais de todos os níveis, é fundamental para o aumento da produtividade no setor da construção”Eng. Alexandre Dittert
AECweb – É possível pensar em aumento de produtividade no setor sem levar em conta a necessidade de educação e capacitação continuada?
Absolutamente não. O capital humano, assim como a educação e a formação continuada de profissionais de todos os níveis, é fundamental para o aumento da produtividade no setor da construção. Especialmente nesta era de transformação digital, na qual rápidos avanços tecnológicos representam um novo desafio de aprendizado. Como qualquer outra, a indústria da construção é centrada no ser humano. A eficiência, a qualidade e a segurança de nossos projetos dependem significativamente das habilidades, conhecimentos e competências das pessoas envolvidas. Quando a indústria avança, nossa força de trabalho também precisa evoluir. É por isso que a educação e a formação contínua são tão cruciais. Companhias que prezam pela formação, treinamento, reciclagem e aperfeiçoamento de sua força de trabalho têm um ambiente mais propício para reter talentos. E, além das habilidades técnicas, é preciso lembrar do desenvolvimento de soft skills, tais como comunicação, resolução de conflitos, trabalho em equipe e liderança. Vejo a educação e a formação contínua como um investimento estratégico. É uma prioridade que deve ser integrada à visão estratégica de todas as construtoras.
“Espero aprender muito com meus novos colegas do Conselho, os educadores envolvidos na plataforma e os profissionais e empresas participantes. Esta é uma oportunidade única para causar um impacto positivo no setor. Estou ansioso para fazer parte dessa jornada”Eng. Alexandre Dittert
O senhor acaba de aceitar um convite do Portal AECweb para fazer parte do Conselho da AEC Academy, iniciativa na área de educação voltada para os profissionais e empresas de toda cadeia produtiva da construção civil. Qual é a sua expectativa a respeito?
Estou honrado pelo convite e muito animado para fazer parte desse Conselho. Como principal expectativa fica a de contribuir para fomentar uma cultura de aprendizado contínuo e adaptação dentro da indústria da construção. Ao compartilhar experiências, insights, melhores práticas e inovações, podemos ajudar o setor em seu desenvolvimento. E espero também ver as empresas divulgando a plataforma para qualificar seus funcionários e ficar a par das tendências e melhores práticas. Espero aprender muito com meus novos colegas do Conselho, os educadores envolvidos na plataforma e os profissionais e empresas participantes. Esta é uma oportunidade única para causar um impacto positivo no setor. Estou ansioso para fazer parte dessa jornada.
“Embora traga muitos benefícios, a construção offsite requer um planejamento logístico cuidadoso, tanto para seu próprio abastecimento quanto para transportar grandes módulos da fábrica para o canteiro de obras”Eng. Alexandre Dittert
AECweb – O senhor mencionou o avanço da construção modular e offsite no Brasil. Quais são as oportunidades e obstáculos para o avanço da industrialização nos canteiros de obras?
Percebo que a construção modular e offsite ganha força no Brasil, principalmente em grandes centros urbanos com condições logísticas e regulamentações adequadas. Esses métodos oferecem benefícios significativos na redução de custos e prazos de construção, com menor geração de resíduos e melhor controle sobre a qualidade. Como oportunidades vejo que, na medida em que a população urbana do Brasil cresce, aumenta também a demanda por moradia e infraestrutura. A construção modular e offsite pode atender a essa necessidade de forma rápida e eficiente, oferecendo opções acessíveis e de qualidade. Alguns estudos apontam para uma entrega 50% mais rápida e uma produtividade de até 4x em comparação ao modelo tradicional. E essas técnicas normalmente produzem até 4x menos resíduos e podem usar materiais mais sustentáveis ou reciclados. Os métodos tradicionais de construção são intensivos em mão de obra. Ao transferir mais atividades para um ambiente fabril, a indústria pode mitigar o impacto da escassez de mão de obra qualificada.
AECweb – Somente na área de edificações?
A modularização offsite não está presente somente em projetos de edificações. Vejo oportunidades de expansão na área de infraestrutura. Já é uma realidade, por exemplo, em obras de saneamento. Projetos industriais de pequeno e médio porte também. Um dos principais obstáculos é a logística de suporte aos centros de construção. Embora traga muitos benefícios, a construção offsite requer um planejamento logístico cuidadoso, tanto para seu próprio abastecimento quanto para transportar grandes módulos da fábrica para o canteiro de obras. O tamanho e a diversidade do Brasil podem representar desafios nesse sentido.
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AECweb – A pré-construção é uma prática comum em empreendimentos complexos. Essa metodologia de trabalho poderia servir de modelo para empreendimentos mais simples ou padronizados?
Com certeza. A pré-construção pode ser um processo valioso para projetos de todas as complexidades e tamanhos. Um ponto chave é realizar a integração da engenharia, dos suprimentos e da obra. Embora isso possa parecer mais relevante para projetos complexos, adotar uma metodologia de pré-construção para empreendimentos mais simples ou padronizados também pode trazer benefícios significativos. Facilita a detecção precoce e a mitigação de riscos, assim como a identificação de oportunidades. Encontrar uma solução construtiva alternativa, capaz de reduzir o prazo da obra, ou uma otimização do projeto em função de uma alternativa identificada pelos suprimentos, são temas comuns em nosso dia a dia. Por meio de estimativas precisas de recursos e planejamento antecipado de compras, a pré-construção pode levar a um melhor controle orçamentário. Ao planejar os processos de construção e o plano de ataque da obra em detalhes, com antecedência, fica mais fácil criar um cronograma de construção eficiente e aderente à realidade do projeto. A maior previsibilidade e o planejamento podem levar a melhores resultados para qualquer projeto de construção.
“Um dos usos mais promissores dos gêmeos digitais na construção civil é no monitoramento em tempo real das estruturas. Com a incorporação de sensores IoT, os digital twins podem fornecer feedback instantâneo sobre vários parâmetros, como cargas estruturais, temperatura e umidade”Eng. Alexandre Dittert
AECweb – O senhor mencionou a transformação digital como uma das tendências da construção. Qual a sua visão sobre esse processo no setor, incluindo o BIM e os aplicativos que surgem todos os dias no mercado para auxiliar na gestão das obras?
Na minha visão, a digitalização não é mais uma tendência emergente. É um componente central da transformação do setor da construção. Ferramentas digitais, softwares e aplicativos permeiam todas as etapas da construção, do projeto à execução e manutenção. Estamos no meio de uma ampla adoção do BIM e de outras plataformas digitais. Embora os avanços tenham sido significativos, ainda há um longo caminho a percorrer. A digitalização no setor ainda enfrenta desafios, como a falta de habilidades e competências entre a força de trabalho e a resistência às mudanças. O desenvolvimento contínuo da transformação digital é crucial para a competitividade e a sustentabilidade da indústria da construção.
AECweb – Qual a sua visão sobre a aplicação dos gêmeos digitais na construção civil? Fala-se, por exemplo, do uso de sensores para monitoramento, em tempo real, de obras de arte especiais. Isso é viável no curto prazo?
Um dos usos mais promissores dos gêmeos digitais na construção civil é no monitoramento em tempo real das estruturas. Com a incorporação de sensores IoT, os digital twins podem fornecer feedback instantâneo sobre vários parâmetros, como cargas estruturais, temperatura e umidade. Isso pode ser particularmente valioso para obras-de-arte especiais ou estruturas de valor ou riscos significativos. A Concremat desenvolveu sensores de temperatura de concreto com dispositivos IoT, o que levou a companhia a conquistar o Prêmio InovaInfra 2023. No curto prazo, acredito que veremos o crescimento dessa aplicação, particularmente em projetos mais complexos e de alto valor, como na área de infraestrutura, onde os benefícios do monitoramento em tempo real e da manutenção preditiva podem ser significativos. Já existem exemplos dessa tecnologia sendo usada para monitorar infraestruturas críticas, como pontes e barragens. Há, no entanto, desafios a serem superados. Um deles é o alto custo inicial de implementação de um gêmeo digital, com instalação de sensores, o monitoramento no modelo digital e a análise das grandes quantidades de dados gerados por esses sistemas. Deve ser feito um plano completo dos benefícios que se deseja obter, assim como os meios para se chegar lá.
“Os requisitos ESG estão impulsionando a inovação no setor. As empresas estão explorando novas tecnologias de construção verde, metodologias e ferramentas digitais para transparência e eficiência, além de abordagens mais colaborativas para a entrega de projetos”Eng. Alexandre Dittert
AECweb – E quanto ao uso de drones e processamento de imagens para auxiliar na gestão de obras, acompanhamento de execução e identificação de patologias? Qual o potencial dessa tecnologia?
Estão revolucionando a indústria da construção. Oferecem uma série de benefícios que podem agilizar as operações, melhorar a segurança e aumentar a precisão do monitoramento e das inspeções. Todos esses benefícios devem ser acompanhados de investimentos, treinamentos e adaptações dos processos tradicionais de monitoramento. Os drones podem fornecer desde uma visão panorâmica de um canteiro de obras até a captação de imagens 3D para modelagem digital. Podem embarcar equipamentos com diferentes tipos de câmeras, sensores ultrassom e de temperatura. Todo esse aparato pode ser particularmente útil em projetos grandes ou complexos, de difícil acesso, onde o monitoramento manual costuma ser desafiador e demorado. Drones podem auxiliar nas inspeções visuais de edifícios e estruturas, identificando precocemente possíveis patologias, tais como eflorescências, trincas e fissuras, destacamentos, manchas e gretamentos. Por meio de sensores de temperatura, também podem detectar possíveis infiltrações ou outras ameaças à estrutura. Também podem realizar levantamentos topográficos de forma rápida e cada vez mais precisa. Eles também são capazes de ajudar a monitorar as condições do local durante o processo de construção, oferecendo às partes interessadas uma compreensão visual clara e atual do status do projeto.
AECweb – Qual tem sido o impacto das exigências ESG (ambiental, social e de governança corporativa) no setor da construção?
Têm se tornado cada vez mais importantes em todos os setores e a construção civil não é exceção. Os requisitos ESG estão impulsionando a inovação no setor. As empresas estão explorando novas tecnologias de construção verde, metodologias e ferramentas digitais para transparência e eficiência, além de abordagens mais colaborativas para a entrega de projetos. O setor da construção contribui significativamente para as emissões globais de gases de efeito estufa e geração de resíduos. Por isso, torna-se imperativo para o negócio adotar práticas mais sustentáveis, como o uso de materiais renováveis ou reciclados, a redução de desperdícios e a otimização da eficiência energética. Considerações sociais, como a implantação de melhores práticas sociais e trabalhistas, saúde e segurança e impacto positivo na comunidade se tornaram o foco. O setor tem sido chamado a tratar de seus impactos, o que inclui a geração de ruído, interrupção do tráfego e qualidade do ar, se envolvendo de forma mais transparente e colaborativa com as partes interessadas. Boas práticas de governança, conduta ética nos negócios, transparência e gestão robusta de riscos estão se tornando cada vez mais importantes. Embora desafiadora, especialmente no curto prazo, a conformidade ESG deve ser encarada com uma questão de sobrevivência das organizações. Principalmente para quem busca excelência e oportunidades de diferenciação e perpetuidade.
Carreira: qual é a sua sugestão de tema para o nosso espaço dedicado aos profissionais de Engenharia Civil, Arquitetura e Construção?
Colaboração técnica
- Alexandre Dittert - Diretor executivo de pré-construção da Concremat. Formado em engenharia civil, com ênfase em cálculo estrutural e fundações, pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Especializações em finanças e estratégia, pela Wharton School; estratégia e negociação, pela ISE Business School; gerenciamento de projetos, pela Top Study e MBA em gerenciamento empresarial pela FVG/RJ. Na Concremat desde 2004, já exerceu diversos cargos, atuando principalmente em projetos nos segmentos de infraestrutura, petróleo e gás e industrial. Atualmente, se dedica aos contratos de EPC da Concremat, aplicando sua experiência na fase de pré-construção, incluindo o desenvolvimento de modelos contratuais como a abordagem de design-build e modelos de contrato turnkey lumpsum e FIDIC, com orientação a padrões das metodologias AACEi e FEL.